quinta-feira, dezembro 28, 2006
8 Factores de burnout no casamento.
Segundo Pines (1996) existem oito factores chave para o desenvolver do burnout conjugal. Passarei a enumera-los:
1- As pessoas que acreditam no amor romântico esperam do compromisso da sua vida, um sentido muito significativo.
2- Há uma relação directa entre o amor romântico e o burnout. Estar apaixonado é o estado inicial e o pré-requisito para o processo de burnout.
3- Apesar da singularidade da experiência de estar apaixonado, o “como” e o “porquê” da experiência são universais.
4- Existe uma interacção entre os parceiros e o ambiente. Não é a maneira de ser do parceiro que causa o burnout, mas antes a destruição de um ideal romântico frente a stressores situacionais que são erradamente atribuídos ao companheiro.
5- O ambiente não é a totalidade da realidade objectiva externa. Cada um de nós experiência uma percepção subjectiva representativa do mundo.
6- A esperança que o amor romântico resulte, é marcada pelos valores culturais, vem das expectativas pessoais e faz parte do sistema de crenças. As expectativas são activadas quando as pessoas se apaixonam e assumem a sua maior expressão quando é assumido um compromisso. Esta esperança exerce um efeito poderoso na relação, particularmente quando inconsciente e não abertamente verbalizado. A força deste efeito é sobretudo, pela sua forte associação à essência da vida.
7- A frustração das expectativas românticas causa amargura, desapontamento e com isso a erosão no amor e no casamento. De qualquer maneira, a realização de expectativas não é por si só uma garantia contra o burnout. As ideias românticas podem ser frustradas com a pessoa, no entanto, podendo ainda manter um sentido à essência da vida.
8- A interacção entre o casal e o ambiente percebido, pode ser positiva ou negativa, para a relação amorosa. No melhor dos casos, existe um equilíbrio entre segurança e desenvolvimento, traduzindo-se numa relação amorosa em crescimento, daí provem vida com sentido e significado. Na pior das circunstâncias advém a morte do amor, o burnout conjugal.
Este post já vai extenso e como tal comentarei apenas o primeiro ponto.
A expectativa criada à volta de um relacionamento pode ser a corda que o vai estrangular a longo prazo. Ou seja, se não estivermos cientes que o nosso bem-estar psicológico depende unicamente de nós, estamos a atribuir ao outro a responsabilidade mágica da nossa felicidade.
E isso é uma responsabilidade do tamanho do mundo!
Portanto, a vida não é apenas a relação conjugal… é muito mais que isso. E pode nem ter uma relação conjugal, que continua a ser uma vida com alegria e significado para o sujeito.
terça-feira, dezembro 26, 2006
"Silentiu"
Ao pensar no valor do silêncio, no lugar que o silêncio ocupa na relação terapêutica, o que surge de imediato à memória?
Se para uns, tal é sentido como um desconforto, para outros, certamente que não o é.
Será que o silêncio ocupa o lugar da palavra ou sobrepõem-se ao lugar do próprio silêncio?
Parece-nos que existem muitos "silêncios". O silêncio daquele que pensa falar mas não fala por opção, daquele que não consegue falar e daquele que simplesmente não quer falar. Também poderá haver o silêncio daquele que não lembra "a palavra". E ainda, aquele silêncio que surge nas reticências das palavras ditas.
Actualmente, no contexto e ritmo das ditas sociedades ocidentais, "civilizadas", urbanas, etc e tais, onde se encontra o silêncio? Que significado se atribui?
Deixemos as palavras de quem escreve sobre o silêncio:
"...o silêncio deixa de afirmar, escuta, demora-se npos objectos insignificantes, não em arcas e armários, em bibelots, cofrezinhos, não somos a gente a ouvi-lo, é ele a ouvir-nos a nós, esconde-se na mão que se fecha, numa dobra d etecido, na gaveta onde nada cabe salvo alfinetes, botões, pensamos ' vou tirar o silêncio dali'...
António Lobo Antunes
"Ontem não te vi em Babilónia"
sexta-feira, dezembro 22, 2006
O MICROCRÉDITO E O CRÉDITO QUE DAMOS A NÓS PRÓPRIOS
Alguém sabe o que é o microcrédito? Eu tinha lido umas (poucas) coisas sobre isso há uns meses atrás quando o prémio Nobel da Paz foi atribuído a um economista, o Prof. Yunus. Como me apeteceu saber mais, fui assistir há alguns dias a uma conferência, aberta a qualquer pessoa, sobre o assunto.
Então, o que fez este professor de economia para merecer o Nobel da Paz? Tudo começou há cerca de trinta anos, no Bangladesh. Impressionado com a pobreza à volta da universidade onde dava aulas (não era preciso ir mais longe), ele inventou formas de dar às pessoas possibilidade de se organizarem e conseguirem montar os seus próprios pequenos negócios, saindo de uma situação de pobreza extrema. Um dos problemas dos pobres, raciocinou o Prof. Yunus, é não conseguirem obter empréstimos bancários dos bancos tradicionais. Porque, como se sabe, esses bancos só emprestam a quem pode dar “garantias” (se for uma hipoteca, ainda melhor). O Banco Gremeen, criado por Yunus, concede hoje empréstimos a 7 milhões de pobres ou ex-pobres, muitos dos quais são seus mutuários. De forma acumulada, o Banco Gremeen já concedeu até hoje empréstimos no total de 6 biliões de dólares e tem uma taxa de reembolso de 99%! (Isto é, 99% dos empréstimos são pagos. É uma taxa muito boa). É financeiramente auto-suficiente – não recebe donativos desde 1995. E atribui 30.000 bolsas de estudo por ano.
E que têm o Prof. Yunus, o microcrédito e os pobres do Bangladesh a ver com psicologia, perguntar-se-á. Têm tudo.
O Professor Yunus não se pôs a pensar em termos de caridade ou de subsídios do estado como resposta para a pobreza (embora também não se fizesse rogado a ajudas e subsídios). É um bocado como aquela história da diferença entre dar o peixe ou ensinar a pescar o peixe. O Prof. Yunus tinha, e tem, a convicção de que as próprias pessoas se tinham de organizar para desenvolverem uma actividade ou um pequeno negócio. E isso às vezes é mais complicado do que se pode pensar. Tem a ver com a vontade de prosseguir um objectivo, de trabalhar para isso, de assumir as responsabilidades pelas decisões tomadas, de conseguir ultrapassar as inevitáveis frustrações, de ter a humildade de reconhecer um problema e corrigir o rumo, de saber aceitar a ajuda de quem eventualmente saiba mais. Em termos de psicologia de organizações, chamamos também a isto “empowerment”. Não é só ter poder. É mais do que isso. É saber usar o poder, principalmente o poder sobre si próprio. O poder de sermos nós próprios, com as nossa fraquezas e as nossas forças. O poder de criar alguma coisa, de fazer aquilo que sonhámos. O poder de se ser capaz de pagar o preço por uma decisão errada e recomeçar tudo de novo. Ninguém disse que era fácil. Mas o exemplo das pessoas que trabalham neste projecto mostra que é possível.
Conhecem o poema do W. E. Henley com o título “Invictus”? Para a semana reproduzi-lo-ei, porque agora este post já vai longo. E, entretanto, se quiserem saber mais sobre o “milagre” do microcrédito, que não é milagre nenhum – ou talvez sim, talvez seja um milagre de criatividade do Prof. Yunus e dos 7 milhões de mutuários– vão ao site da Planet http://www.planetfinance-portugal.org ou ao da Associação Nacional de Direito ao Crédito, www.microcredito.com.pt.
Também há microcrédito em Portugal. Para quem tiver um projecto…
Então, o que fez este professor de economia para merecer o Nobel da Paz? Tudo começou há cerca de trinta anos, no Bangladesh. Impressionado com a pobreza à volta da universidade onde dava aulas (não era preciso ir mais longe), ele inventou formas de dar às pessoas possibilidade de se organizarem e conseguirem montar os seus próprios pequenos negócios, saindo de uma situação de pobreza extrema. Um dos problemas dos pobres, raciocinou o Prof. Yunus, é não conseguirem obter empréstimos bancários dos bancos tradicionais. Porque, como se sabe, esses bancos só emprestam a quem pode dar “garantias” (se for uma hipoteca, ainda melhor). O Banco Gremeen, criado por Yunus, concede hoje empréstimos a 7 milhões de pobres ou ex-pobres, muitos dos quais são seus mutuários. De forma acumulada, o Banco Gremeen já concedeu até hoje empréstimos no total de 6 biliões de dólares e tem uma taxa de reembolso de 99%! (Isto é, 99% dos empréstimos são pagos. É uma taxa muito boa). É financeiramente auto-suficiente – não recebe donativos desde 1995. E atribui 30.000 bolsas de estudo por ano.
E que têm o Prof. Yunus, o microcrédito e os pobres do Bangladesh a ver com psicologia, perguntar-se-á. Têm tudo.
O Professor Yunus não se pôs a pensar em termos de caridade ou de subsídios do estado como resposta para a pobreza (embora também não se fizesse rogado a ajudas e subsídios). É um bocado como aquela história da diferença entre dar o peixe ou ensinar a pescar o peixe. O Prof. Yunus tinha, e tem, a convicção de que as próprias pessoas se tinham de organizar para desenvolverem uma actividade ou um pequeno negócio. E isso às vezes é mais complicado do que se pode pensar. Tem a ver com a vontade de prosseguir um objectivo, de trabalhar para isso, de assumir as responsabilidades pelas decisões tomadas, de conseguir ultrapassar as inevitáveis frustrações, de ter a humildade de reconhecer um problema e corrigir o rumo, de saber aceitar a ajuda de quem eventualmente saiba mais. Em termos de psicologia de organizações, chamamos também a isto “empowerment”. Não é só ter poder. É mais do que isso. É saber usar o poder, principalmente o poder sobre si próprio. O poder de sermos nós próprios, com as nossa fraquezas e as nossas forças. O poder de criar alguma coisa, de fazer aquilo que sonhámos. O poder de se ser capaz de pagar o preço por uma decisão errada e recomeçar tudo de novo. Ninguém disse que era fácil. Mas o exemplo das pessoas que trabalham neste projecto mostra que é possível.
Conhecem o poema do W. E. Henley com o título “Invictus”? Para a semana reproduzi-lo-ei, porque agora este post já vai longo. E, entretanto, se quiserem saber mais sobre o “milagre” do microcrédito, que não é milagre nenhum – ou talvez sim, talvez seja um milagre de criatividade do Prof. Yunus e dos 7 milhões de mutuários– vão ao site da Planet http://www.planetfinance-portugal.org ou ao da Associação Nacional de Direito ao Crédito, www.microcredito.com.pt.
Também há microcrédito em Portugal. Para quem tiver um projecto…
domingo, dezembro 17, 2006
Burnout no Casamento.
È interessante verificar que as questões do Amor e dos relacionamentos estão cada vez mais a ser objecto de estudo. Está a tornar-se cada vez mais raro serem os poetas e os filósofos a debater e escrever acerca deste tema apaixonante que são as relações a dois!
Assim cabe-me comentar um texto de um investigador, em vez de me deleitar com a beleza das descrições românticas de um poeta.
Para Pines (1996) o “burnout conjugal apresenta-se em três componentes: exaustão física, exaustão emocional e exaustão mental.
A exaustão física caracteriza-se por um cansaço crónico cuja reposição fisiológica pelo sono não é suficiente. Tipicamente as pessoas vitimas de burnout acordam exaustas à segunda-feira, muitas vezes de pois de passar o final de semana quase na totalidade na cama.
O sono é perturbado por pesadelos e por dificuldades em adormecer. O cansaço físico é acompanhado de alguma irrequietude e agitação. Algumas pessoas chegam a ficar violentamente agitadas e quando se lembram das palavras grosseiras ou de actos irreflectidos proferidos pelo parceiro.
Alguns tem que tomar medicação para dormir, outros optam pelo consumo de bebidas alcoólicas, o que se traduz em muitas circunstâncias de soluções parciais visto que na manhã seguinte vão acordar ressacados, ainda mais cansados e com cefaleias!”
Não me irei alargar agora para as outras componentes do burnout conjugal, visto que esta pequena descrição nos serve reflectir acerca da escolha e manutenção dos parceiros de relação.
Ainda segundo Pines, o amor romântico tem uma probabilidade maior de sofrer de burnout conjugal, que aqueles que se juntam de um modo mais racional.
Animador não é?
Ou seja, por um lado temos uma sociedade de consumo em o amor romântico é vendido como objectivo ultimo a atingir, baseado na compra dos últimos acessórios de moda claro! Por outro lado temos a investigação a salientar que quem vai para uma relação à espera de encontrar sempre o parceiro impecável, bem disposto, e a corresponder ás nossas expectativas vai passar um mau bocado!
Por isso neste natal temos que pensar qual é a prenda que vamos pedir ao senhor das barbas brancas. “O par ideal… ou um companheiro real!”
Eu por mim peço sempre alguém realmente ideal!
sexta-feira, dezembro 15, 2006
OS BONS E OS MAUS ALUNOS
Li há dias num jornal diário uma notícia a propósito de uma jovem de 18 anos, do norte do país, que tinha tido média de 20 valores no secundário e de 19,4 no acesso ao ensino superior. Chamou-me a atenção o facto de o artigo referir que a Ana Catarina (assim se chama esta brilhante aluna) era “insatisfeita por natureza”e “perfeccionista”. E mais adiante a Ana Catarina diz: “gosto de aprender e pouco de marrar”. E tanto deve gostar que, além de estudante de medicina, é membro da tuna da universidade, frequenta um curso livre de piano, estuda canto, pratica natação, não passa um dia sem ir à internet ainda tem tempo para ir ao cinema e sair com os amigos. Não vê televisão. “É um tempo que não gasto”, explica.
Fiquei a pensar nisto. Porque é que há pessoas que parecem ter tempo para tudo, até para aprender coisas novas, e outras que se queixam (como frequentemente ouço) de que não conseguem fazer nada? Será de facto uma questão de tempo? Não estou a pensar obviamente numa mãe assoberbada com filhos pequenos e que gasta horas na camionete par ir e vir do trabalho. Estava a pensar nas raparigas e nos rapazes com mais ou menos a idade da Ana Catarina que, como eles próprios confessam, passam horas a olhar apaticamente para a televisão ou a fazer zapping. E depois sentem que não conseguiram fazer nada todo o dia, sentem-se culpabilizados com isso e deprimidos com o que consideram ser uma incapacidade. Julgo que a principal razão para este tipo de queixa pode ter a ver com a desmotivação. Mas o que é a desmotivação?
A desmotivação tem a ver com a falta de interesse pelo mundo (tanto interior como exterior), com uma falta de curiosidade e de vontade de querer saber mais, que muitas vezes surge ligada a uma condição depressiva ou mesmo a uma depressão. Nestas situações, a criatividade fica também empobrecida, não apetece fazer nada, não há gosto por nada.
Trata-se de uma condição bastante frequente no final da adolescência e no início da idade adulta, embora possa aparecer em qualquer altura. As causas podem ser variadas, sendo necessário por vezes algum tempo até o terapeuta e a própria pessoa perceberem a que poderá estar ligada. É bom que haja a coragem, em qualquer idade, para reconhecer e enfrentar esta situação e tentar recorrer a uma ajuda profissional. É que às vezes o estado depressivo é tão avassalador que nem permite à pessoa interrogar-se e tentar descobrir o que poderá fazer por si própria.
Fiquei a pensar nisto. Porque é que há pessoas que parecem ter tempo para tudo, até para aprender coisas novas, e outras que se queixam (como frequentemente ouço) de que não conseguem fazer nada? Será de facto uma questão de tempo? Não estou a pensar obviamente numa mãe assoberbada com filhos pequenos e que gasta horas na camionete par ir e vir do trabalho. Estava a pensar nas raparigas e nos rapazes com mais ou menos a idade da Ana Catarina que, como eles próprios confessam, passam horas a olhar apaticamente para a televisão ou a fazer zapping. E depois sentem que não conseguiram fazer nada todo o dia, sentem-se culpabilizados com isso e deprimidos com o que consideram ser uma incapacidade. Julgo que a principal razão para este tipo de queixa pode ter a ver com a desmotivação. Mas o que é a desmotivação?
A desmotivação tem a ver com a falta de interesse pelo mundo (tanto interior como exterior), com uma falta de curiosidade e de vontade de querer saber mais, que muitas vezes surge ligada a uma condição depressiva ou mesmo a uma depressão. Nestas situações, a criatividade fica também empobrecida, não apetece fazer nada, não há gosto por nada.
Trata-se de uma condição bastante frequente no final da adolescência e no início da idade adulta, embora possa aparecer em qualquer altura. As causas podem ser variadas, sendo necessário por vezes algum tempo até o terapeuta e a própria pessoa perceberem a que poderá estar ligada. É bom que haja a coragem, em qualquer idade, para reconhecer e enfrentar esta situação e tentar recorrer a uma ajuda profissional. É que às vezes o estado depressivo é tão avassalador que nem permite à pessoa interrogar-se e tentar descobrir o que poderá fazer por si própria.
segunda-feira, dezembro 11, 2006
O Lugar da Psicologia
A amostra não é seguramente representativa daquilo que é o entendimento da maioria dos “académicos da filosofia”, mas talvez não se tratasse de uma coincidência... Estou a referir-me à mesma opinião que retive de dois (respeitáveis) catedráticos daquela área num intervalo de tempo relativamente curto. Irados, referiam-se à psicologia como uma disciplina pouco ou nada científica, e ao carácter pernicioso da uniformização de comportamentos pela distrinça entre o “normal” e o “patológico”, só para dar alguns exemplos…
Duas vetustas individualidades da filosofia (que aqui compreensivelmente não identificarei), de duas faculdades de filosofia e uma só opinião. As questões levantadas não são nada em que alguns autores da psicologia não se tenham já detido, mas onde radica esta aversão quase visceral? Enquanto pensava nisto ocorreu-me a parábola do filho pródigo. Porquê? Concorde-se ou não, apesar da sua curta história, a psicologia foi “pródiga” em valer-se de um vasto património herdado do saber filosófico, mas ao contrário do que acontece com a conhecida parábola, esta parece ser uma ciência, heterogénea é certo, mas muito determinada nos objectivos que persegue. Terá a psicologia operacionalizado (melhor ou pior) conceitos milenarmente associados à filosofia ou, como a opinião dos ilustres investigadores nos leva a crer, tê-los-á delapidado? Está aberta a discussão!
Duas vetustas individualidades da filosofia (que aqui compreensivelmente não identificarei), de duas faculdades de filosofia e uma só opinião. As questões levantadas não são nada em que alguns autores da psicologia não se tenham já detido, mas onde radica esta aversão quase visceral? Enquanto pensava nisto ocorreu-me a parábola do filho pródigo. Porquê? Concorde-se ou não, apesar da sua curta história, a psicologia foi “pródiga” em valer-se de um vasto património herdado do saber filosófico, mas ao contrário do que acontece com a conhecida parábola, esta parece ser uma ciência, heterogénea é certo, mas muito determinada nos objectivos que persegue. Terá a psicologia operacionalizado (melhor ou pior) conceitos milenarmente associados à filosofia ou, como a opinião dos ilustres investigadores nos leva a crer, tê-los-á delapidado? Está aberta a discussão!
domingo, dezembro 10, 2006
Bion diz "Sem memória" e não "Sem recordação"
Recomendo vivamente a leitura do livro Bion e o futuro da psicanálise de Antonio Muniz de Rezende (Papirus Editora).
No capítulo 9 intitulado sem memória e sem desejo, o autor faz uma abordagem minunciosa e explicativa de uma entre tantas outras "verdades" de Bion.
A etimologia da palavra re-cor-dar é "Re", que significa repetição; "Cor" é coração; e dar. Assim, a recordação é uma memória muito especial, que "dá de novo ao coração" ou que "torna presente o que esteve guardado no coração".
A recordação não é um simples armazenamento de dados sensoriais, mas caracteriza-se pela permanência do vínculo afectivo; sendo que, a grande mudança que ocorre durante uma psicoterapia, é a transformação-por meio do processo de simbolização- da memória de dados sensoriais em "recordação" (na medida em que passa pelo coração) .
Vejam como Rubem Alves, nos diz isto de forma poética...
Os meus desejos, não é preciso que ninguém me lembre deles. Não precisam ser escritos. Sei-os (isto mesmo, SEIOS!) de cor. De cor, quer dizer no "coração". Aquilo que está escrito no coração não necessita de agendas porque a gente não esquece. O que a memória ama fica eterno.
No capítulo 9 intitulado sem memória e sem desejo, o autor faz uma abordagem minunciosa e explicativa de uma entre tantas outras "verdades" de Bion.
A etimologia da palavra re-cor-dar é "Re", que significa repetição; "Cor" é coração; e dar. Assim, a recordação é uma memória muito especial, que "dá de novo ao coração" ou que "torna presente o que esteve guardado no coração".
A recordação não é um simples armazenamento de dados sensoriais, mas caracteriza-se pela permanência do vínculo afectivo; sendo que, a grande mudança que ocorre durante uma psicoterapia, é a transformação-por meio do processo de simbolização- da memória de dados sensoriais em "recordação" (na medida em que passa pelo coração) .
Vejam como Rubem Alves, nos diz isto de forma poética...
Os meus desejos, não é preciso que ninguém me lembre deles. Não precisam ser escritos. Sei-os (isto mesmo, SEIOS!) de cor. De cor, quer dizer no "coração". Aquilo que está escrito no coração não necessita de agendas porque a gente não esquece. O que a memória ama fica eterno.
sexta-feira, dezembro 08, 2006
A mudança, essa grande desconhecida
Se há palavras que todos nós, independentemente da profissão, ouvimos todos os dias são estas duas: stress e mudança. É o escritório que vai mudar de instalações para um local mais barato fora de Lisboa (e agora que vou ter de levar o carro, onde é que arranjo lugar quando voltar ao fim do dia? Vão ser as intermináveis voltas ao quarteirão…). É a empresa que foi comprada pelos espanhóis (e consta que vão despedir pessoas, porque alguns serviços continuam em Madrid). É a filha que não acerta no curso (agora quer ir estudar cinema! E onde é que ela depois vai arranjar emprego?). É o marido a quem fizeram uma proposta de rescisão de contrato de trabalho (tem 48 anos, o que ele é ele vai fazer em casa?). É a mulher que sente chegar a menopausa e os horríveis afrontamentos (o meu corpo está a mudar, já não o entendo. E estou a engordar. Tenho de ir para o ginásio). É o homem na casa dos cinquenta que se inquieta com algumas dificuldades na erecção (e agora? E eu que estava a pensar fazer uma aproximação aquela rapariga das relações públicas, que é gira que se farta. E se depois não me aguento? Já me falaram no Viagra…). É a mulher a quem o marido subitamente anuncia a decisão de se divorciar (depois de vinte anos de casados, assim de repente? Agora que já estou a ficar velha para arranjar outro… Ele diz que temos feitios incompatíveis, interesses diferentes, mas só agora é que descobriu? Já me disseram que há outra, embora ele negue, claro). É o executivo bem sucedido que de repente se vê confrontado com a “escolha” – que não pode recusar – de ter de ir trabalhar para um país estrangeiro (e que faço eu aos miúdos? E a Luísa? Agora que foi promovida, não vai com certeza querer ir). É o engenheiro que marca passo na empresa (dizem que eu sou conflituoso e que não me quero adaptar às novas tecnologias. Mas onde é que eu vou arranjar tempo para estudar se passo a minha vida a evitar que me façam a cama lá no emprego? E também já não tenho cabeça para aprender coisas novas. Ainda por cima está sempre tudo a mudar…). É a mulher cuja mãe, viúva e com oitenta anos, começa a ter dificuldades de locomoção (e agora? Como é que a levo lá para casa? O Rui nunca se deu bem com ela. Ia ser um inferno. Mas não posso deixá-la morrer sozinha. Ainda acabo divorciada à pala disto). É a mulher de cinquenta anos, com sucessivas depressões, que vê os filhos saírem de casa (e agora, que faço eu? O Manel diz que eu devia trabalhar, para me entreter. Mas fazer o quê? Nunca trabalhei, a não ser durante uns meses como secretária antes de me casar. Ele nunca quis que eu trabalhasse. Que vou eu fazer da minha vida? Ninguém quer saber de mim. Muito menos o Manel, que só pensa no trabalho).
Estes são apenas exemplos das nossas perplexidades como homens e mulheres. No fundo, tudo gira à volta da incerteza e da dificuldade que temos em lidar com ela. A incerteza é sempre geradora de ansiedade, quando não mesmo de dor psíquica. O ser humano prefere em geral o familiar, o conhecido, mesmo que não se sinta satisfeito com a vida que leva. Até há quem diga que o stress mata. Ou que engorda. Ou que emagrece. Ou que envelhece, faz rugas, dá um ar pesado. Centenas, milhares de artigos se escrevem todas as semanas sobre o assunto, por esse mundo fora.
No fundo, todos nós gostaríamos de ter mais controlo sobre as nossas vidas. Mas como consegui-lo se, precisamente, as coisas surgem quando menos esperamos?
A psicoterapia não é uma panaceia para os males da alma, ansiedade incluída. Mas que ajuda, ajuda. Pode, se for bem sucedida, tornar o sofrimento mais tolerável, permitir encontrar pequenos (ou grandes) prazeres, ajudar a percebermos melhor a nós próprios e aos outros, aumentar a nossa iniciativa e autonomia e a nossa capacidade de tomar um pouco mais a nossa vida nas nossas mãos.
(Nota: qualquer semelhança entre os exemplos descritos e a realidade é pura coincidência)
Estes são apenas exemplos das nossas perplexidades como homens e mulheres. No fundo, tudo gira à volta da incerteza e da dificuldade que temos em lidar com ela. A incerteza é sempre geradora de ansiedade, quando não mesmo de dor psíquica. O ser humano prefere em geral o familiar, o conhecido, mesmo que não se sinta satisfeito com a vida que leva. Até há quem diga que o stress mata. Ou que engorda. Ou que emagrece. Ou que envelhece, faz rugas, dá um ar pesado. Centenas, milhares de artigos se escrevem todas as semanas sobre o assunto, por esse mundo fora.
No fundo, todos nós gostaríamos de ter mais controlo sobre as nossas vidas. Mas como consegui-lo se, precisamente, as coisas surgem quando menos esperamos?
A psicoterapia não é uma panaceia para os males da alma, ansiedade incluída. Mas que ajuda, ajuda. Pode, se for bem sucedida, tornar o sofrimento mais tolerável, permitir encontrar pequenos (ou grandes) prazeres, ajudar a percebermos melhor a nós próprios e aos outros, aumentar a nossa iniciativa e autonomia e a nossa capacidade de tomar um pouco mais a nossa vida nas nossas mãos.
(Nota: qualquer semelhança entre os exemplos descritos e a realidade é pura coincidência)
domingo, dezembro 03, 2006
Relação Conjugal e Intimidade
“É das nossas experiências relacionais que aprendemos sobre nós próprios e sobre o mundo, e é à luz destas experiências que podemos rever o nosso mundo interior.
Cada elemento tem um padrão de intimidade e de vinculação desenvolvido ao longo da sua vida que vai actualizar, consolidar e, simultaneamente co-construir. Por sua vez, esta co-construção depende da forma como cada um consegue ser e estar na relação, e como a dinâmica entre o ser e o estar acontecem na relação” (Costa, 2005).
A intimidade tem o seu início na infância. A criança, no seio da sua família e, mais tarde, noutros elementos de referência, vai construindo uma imagem de casal, tal como uma imagem de si própria e de si na relação com os outros, que vai reformulando ao longo do seu desenvolvimento.
São várias as investigações nesta área cujos resultados sugerem que a imagem que a criança tem das relações dos pais quer como casal, quer como pais, parece ter uma função preditiva das relações futuras com os outros e consigo própria. Parece ainda existir uma associação significativa e positiva entre a percepção de satisfação conjugal dos pais e a qualidade do laço emocional, e negativa com a inibição da exploração (Oliveira & Costa, 2002).
Sabemos que amar e ser amado parece ser condição indispensável para a construção do self ao longo do ciclo de vida e para a capacidade de estabelecer relações de intimidade.
Quando diferentes circunstâncias impedem este processo, o indivíduo responde com mecanismos de auto-protecção que representam em cada momento as respostas possíveis, que, contudo, podem interferir no processo de construção do self e na capacidade de ver os outros como fontes de apoio, segurança e auto-regulação. Se estiver carregado de experiências negativas, serão estas que tenderão a ocorrer, consciente ou inconscientemente, na forma como o indivíduo se situa perante a intimidade. Neste sentido, as relações de intimidade ocorrem em sistemas existentes, que realçam, contrapõem ou chocam com outros pré-existentes.
Os problemas relacionais ocorrem, frequentemente, quando em momentos de crise, o casal tende a utilizar padrões de funcionamento interiorizados de que não está consciente e que colidem com os do outro. Isto é, o sistema de vinculação é activado e a resposta da figura de vinculação não satisfaz as necessidades (Costa, 2005).
Parafraseando Virgílio Ferreira, o importante não é o que acontece, mas o que acontece em nós desse acontecer. Trabalhar a relação de casal envolve procurar entender o que acontece em cada elemento do casal, de todo o acontecer de uma vivência de relações significativas ao longo do processo de desenvolvimento, permitindo-nos aceder aos meta-significados. Facilitando, assim, o auto-conhecimento individual e relacional criando condições para que cada elemento do casal possa desempenhar um papel mais activo na construção de mudanças para o desenvolvimento da intimidade, e na reconstrução dos modelos do self e do outro, e do self com o outro.
A intimidade tem o seu início na infância. A criança, no seio da sua família e, mais tarde, noutros elementos de referência, vai construindo uma imagem de casal, tal como uma imagem de si própria e de si na relação com os outros, que vai reformulando ao longo do seu desenvolvimento.
São várias as investigações nesta área cujos resultados sugerem que a imagem que a criança tem das relações dos pais quer como casal, quer como pais, parece ter uma função preditiva das relações futuras com os outros e consigo própria. Parece ainda existir uma associação significativa e positiva entre a percepção de satisfação conjugal dos pais e a qualidade do laço emocional, e negativa com a inibição da exploração (Oliveira & Costa, 2002).
Sabemos que amar e ser amado parece ser condição indispensável para a construção do self ao longo do ciclo de vida e para a capacidade de estabelecer relações de intimidade.
Quando diferentes circunstâncias impedem este processo, o indivíduo responde com mecanismos de auto-protecção que representam em cada momento as respostas possíveis, que, contudo, podem interferir no processo de construção do self e na capacidade de ver os outros como fontes de apoio, segurança e auto-regulação. Se estiver carregado de experiências negativas, serão estas que tenderão a ocorrer, consciente ou inconscientemente, na forma como o indivíduo se situa perante a intimidade. Neste sentido, as relações de intimidade ocorrem em sistemas existentes, que realçam, contrapõem ou chocam com outros pré-existentes.
Os problemas relacionais ocorrem, frequentemente, quando em momentos de crise, o casal tende a utilizar padrões de funcionamento interiorizados de que não está consciente e que colidem com os do outro. Isto é, o sistema de vinculação é activado e a resposta da figura de vinculação não satisfaz as necessidades (Costa, 2005).
Parafraseando Virgílio Ferreira, o importante não é o que acontece, mas o que acontece em nós desse acontecer. Trabalhar a relação de casal envolve procurar entender o que acontece em cada elemento do casal, de todo o acontecer de uma vivência de relações significativas ao longo do processo de desenvolvimento, permitindo-nos aceder aos meta-significados. Facilitando, assim, o auto-conhecimento individual e relacional criando condições para que cada elemento do casal possa desempenhar um papel mais activo na construção de mudanças para o desenvolvimento da intimidade, e na reconstrução dos modelos do self e do outro, e do self com o outro.
Idiossincrasia? Narcisismo? Egoísmo? ou simplesmente Ódio Necessário?
"Estavam alguns homens debaixo de uma grande árvore. E um dos homens tinha olhos para ver. E ele viu: no cimo da árvore havia um pássaro, magnífico na sua beleza essencial. Os outros não o viam. mas o homem foi assaltado por um violento desejo de conseguir chegar até junto do pássaro para o apanhar; não conseguia ir-se embora dali sem o pássaro. Todavia, como a árvore era alta, ele não podia lá chegar, e não tinha escada. mas sendo tão poderoso o seu desejo, a sua alma encontrou uma maneira. Ele puxou os homens que ali se encontravam e pô-los uns sobre os outros, cada um deles sobre os ombros de um companheiro. Ele pôs-se lá no alto, por cima deles todos, de tal modo que conseguiu chegar até junto do pássaro e o agarrou. Os outros, tendo embora ajudado aquele homem, não sabiam nada acerca do pássaro e não o viam. Mas ele, que sabia que o pássaro estava ali, e que o via, não teria podido chegar até ele sem os outros. Se aquele que estava na base da torre tivesse abandonado o seu lugar, o que se encontrava lá em cima teria necessáriamente caído."
Ódio Necessário de Nicole Jeammet
"(...) aquele que ama, não começa por amar ocupando-se dos outros, mas sim ao realizar ele próprio a obra para o qual se descobriu destinado, numa aparente indiferença para com aqueles que o rodeiam. Ocupar-se dos outros serve demasiadas vezes para escondermos a nós mesmos que não nos amamos, e que nos recusamos a ocupar o lugar que é o nosso; é precisamente nisto que consiste o princípio de todas as manipulações. O essencial que acontece entre os seres acontece, não pelo contacto entre eles, mas pela acção que cada um realiza isoladamente.."
Ibidem
"Poderá o amor apagar o sofrimento, o masoquismo e o egocentrismo inscritos na pessoa?"
Ódio Necessário de Nicole Jeammet
"(...) aquele que ama, não começa por amar ocupando-se dos outros, mas sim ao realizar ele próprio a obra para o qual se descobriu destinado, numa aparente indiferença para com aqueles que o rodeiam. Ocupar-se dos outros serve demasiadas vezes para escondermos a nós mesmos que não nos amamos, e que nos recusamos a ocupar o lugar que é o nosso; é precisamente nisto que consiste o princípio de todas as manipulações. O essencial que acontece entre os seres acontece, não pelo contacto entre eles, mas pela acção que cada um realiza isoladamente.."
Ibidem
"Poderá o amor apagar o sofrimento, o masoquismo e o egocentrismo inscritos na pessoa?"
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