segunda-feira, fevereiro 10, 2014

Perseguição do governo chinês aos seguidores de Falun Gong


Ontem vi um documentário na Sic Noticias, no programa Toda a Verdade que me deixou particularmente chocada e sensibilizada. Estive o resto da tarde (ou mesmo dia) a tentar descobrir na net informações adicionais sobre a questão e a informar-me sobre a corrente filosófica/religiosa que deu origem a tamanha perseguição iniciada em 1999 e que se prolonga até à actualidade.

Segundo consegui perceber os adeptos e praticantes de uma disciplina mental que corresponde a uma filosofia de vida e à pratica de uma sequência de exercícios, do género do Tai Chi Chuan ou Chi Cung, denominada pelo seu criador Mestre Li Hongzhi de Falun Cong. Esta prática, considerada como uma prática avançada de cultivo da mente e do corpo, teve inicio em 1992 e em 1999 já tinha ganho 100 milhões de adeptos na China. Espalhou-se muito rapidamente e foi muito facilmente absorvida pela população chinesa. Segunda alguns estudiosos e divulgadores das atrocidades praticadas pelo governo chinês sobre os seus praticamente, foi esta rápida expansão que gerou no governo uma sensação de ameaça e a necessidade da sua extinção. Em 1999 por decreto a prática do Falun Cong foi considerada ilegal e os seus praticantes e adeptos perseguidos, presos e torturados. Milhares de pessoas foram presas, o governo constitui campos de prisioneiros específicos, semelhantes a campos de concentração para alojar estas pessoas, submetendo-as a torturas arrepiantes e a trabalhos forçados. Sob tortura os praticantes são (o verbo está propositadamente no presente porque é algo que continua a acontecer) obrigados (a única saída possível) a renunciarem à pratica do Falun Cong e são sujeitos a uma lavagem cerebral para se tornarem opositores do Falun Cong.

Em 1994, 5 anos antes do inicio da perseguição dos adeptos do Falun Cong (pratica inicialmente estimulada pelo próprio governo) o Mestre Li Hongzhi resolveu divulgar a pratica pelo mundo e acabou por ficar a residir nos Estados Unidos (onde vive atualmente), tendo adquirido direitos de cidadão americano. Enquanto cidadão americano ficou protegido e não foi sujeito a extradição como exigia o governo chinês. Desde o inicio da perseguição que a actividade do Mestre é muito discreta aparecendo apenas algumas comunicações deles no site americano da prática Falun Cong - http://en.minghui.org/.

Os praticantes de Falun Gong prisioneiros para além de serem sujeitos às praticas habituais de tortura - espancamento e privação de sono, são sujeitos a mutilações várias e a serem preservados como dadores de orgãos vivos. Existem relatos tenebrosos só inimagináveis em filmes de terror ou associados à segunda guerra mundial e aos nazis. Há relatos de mulheres gravidas de 8 meses obrigadas a abortar após ambos (feto e mãe) terem sido sujeitos às mais diversas torturas. Relato de uma mulher cujo o coração foi retirado do corpo sem anestesia e ainda em vida (segundo o medico testemunha morreu quando lhe cortaram a artéria ou a veia do coração, directamente no coração), relato da mulher de um medico que dizia ter retirado mais de 2 mil córneas para transplante. O comercio de transplante de órgãos vitais e não só tem subido muito rapidamente nos últimos anos graças a estes prisioneiros que são mortos nas salas de operações por remoção de todos os seus órgãos passiveis de serem vendidos e transplantados para os europeus e americanos sedentos de transplantes fáceis, rápidos e de doadores saudáveis. A pratica do Falun Cong parece deixar os seus praticantes particularmente saudáveis e que, por isso mesmo, são excelentes "dadores compelidos" de órgãos.

Isto passa-se agora! Na Actualidade!

O grupo de praticantes perseguido de forma selvagem e sujeitos a tratamentos totalmente desumanos tem como lema: Verdade, Tolerância e Benevolência.

O Mestre Li Hongzhi  já foi proposto várias vezes para prémio Nobel da Paz

domingo, fevereiro 09, 2014

O trauma, o medo e a ansiedade. Parte 1.

(Charcot a trabalhar, ilustração da época)

 

Estou a escrever uma comunicação para apresentar num congresso international e, por essa razão, tive de reler uma série de obras que dizem respeito ao trauma.

Ao fazer este trabalho de revisão e de investigação, ocorreu-me que talvez fosse útil tentar escrever um pequeno texto que, de forma simplificada mas sem deixar de ser rigorosa, pudesse informar os nossos leitores em que consiste o trauma.

A palavra caíu há muito na linguagem comum e não é raro ouvir dizer algo como "fiquei traumatizada com o que me aconteceu quando...". É um uso pouco rigoroso da palavra, porque uma das características do trauma é não nos lembrarmos dele, ou pelo menos de tudo o que aconteceu quando o trauma teve lugar.

A palavra, que vem do grego ferida, passou a significar algo que nos marcou. Existe também na linguagem médica, como por exemplo na expressão traumatismo craniano. Como já fui vítima de um, sei bem o que quer dizer, e a verdade é que não me lembro nada do que aconteceu nos momentos a seguir à ocorrência do acidente. Foi como se tudo se me tivesse apagado da memória. Mas apagou-se, realmente? É possível que, dada a violência do embate sobre o lado direito do meu corpo, com inúmeras fracturas, eu não me recorde sequer da dor? Para onde foram essas memórias, se é que existem?

Foram perguntas um pouco semelhantes a estas que Freud colocou quando começou a estudar o problema do trauma, agora já não físico mas psíquico. Freud, que esteve a estudar com Charcot (médico e o grande hipnotizador da época) em Paris entre 1875 e 1876, começou por ligar os traumas às manifestações histéricas. Observava nas pacientes histéricas sujeitas a hipnose que o trauma andava a par com o medo, medo sentido pela criança em determinadas situações de que já não se lembrava (parece que a hipnose conseguia, em certos casos, fazer reviver esse medo e ligá-lo a memórias). O medo é, como se sabe, uma das emoções mais básicas do ser humano, mas também uma das mais frequentes. O medo, em excesso, pode ser inibidor, pode mesmo impedir um desenvolvimento saudável e uma vida vivida plenamente. Este medos, escreveu Freud, poderiam durar décadas, repetir-se um determinadas circunstâncias, sem que a pessoa conseguisse estabelecer a ligação com o primeiro acontecimento.

Dado que se trata de um assunto complexo e mesmo pesado, vou ficar por aqui hoje. Quem quiser saber mais sobre trauma, é favor acompanhar o Salpicos.

Encontramos-nos na parte 2!

 

sexta-feira, fevereiro 07, 2014

Mais tarde ou mais cedo ...

vai encontrar ...







A capacidade de estar só








Winnicott, no artigo intitulado A capacidade de estar só (1958), demonstra a importância da criança ser capaz de estar só, mesmo na presença da mãe. Esta conceptualização paradoxal, mostra-nos o quão importante é para a criança estar consigo mesma e desenvolver as suas actividades – enquanto a mãe desempenha outras funções, não focadas na criança. Isto acontece porque ambas – criança e mãe – estão unidas por uma confiança básica recíproca.

Segundo este autor, a capacidade de estar só traduz um grau de maturidade para o qual se tende.

Porém, antes de atingir esta capacidade, dá-se o tumultuoso percurso da própria existência – uma evolução que se expressa pela angústia de estar só, pela solidão do desencanto amoroso ou pelo medo da morte.

A solidão significa a presença omnipotente e ameaçadora de um objecto interno maligno, que contamina o espaço interno do sujeito.


A capacidade de estar só permite admitir dentro de cada um, um espaço interno, no qual somos, simultaneamente, espectadores e agentes, porque conservamos um bom objecto interno – ultrapassadas que foram as angústias primordiais. 

quarta-feira, fevereiro 05, 2014

Descargas Emocionais em EMDR

Uma das coisas que pode correr menos bem do ponto de vista do terapeuta, quando está a trabalhar com EMDR, são as ab-reacções. Ou seja, quando a resposta emocional ou fisiológica do paciente é tão activada que a vivência de um qualquer evento traumático surge quase "aqui e agora". Por isso é fundamental que quem aplica EMDR seja terapeuta de formação. Caso contrário, existem sérios riscos de "a cura ser pior que a doença" e tornar uma dessensibilização terapêutica numa nova experiência traumática para o paciente. Conhecer métodos de contenção e intervenção na crise são imperativos quando se trabalha com uma ferramenta tão poderosa.


Quando consultar um terapeuta EMDR certifique-seque a formação base é também em psicoterapia (psicanalítica, cognitivo-comportamental, etc.) e que o terapeuta em causa é membro da Associação Portuguesa de EMDR (que valida o nível de formação). Pela sua saúde!



Carla Ricardo
Psicóloga e Psicoterapeuta
Psicronos Setúbal

terça-feira, fevereiro 04, 2014

O Homem dos ratos - Video de um caso de Freud

O Homem dos ratos é um dos casos clínicos mais famosos e interessantes de Freud.
Neste documentário, falado em brasileiro, é apresentado o caso de Ernest Lanzer num documentário realizado pela BCC e exibido na televisão a 21 de Junho de 1973. 


Direção e produção – Bruce Norman
Edição – David Elliot e Peter Goodchild
Dr. Freud – Bernard Archard
Patient/Ernest Lanzer/The Rat Man – Edward Fox
Gisela – Mary Ashton
Captain Novak – Michael Brennan
Girl with beautiful eyes – Charles Kinross
Governess – Ruth Madoc
Commentary (voice) – Richard Bebb

segunda-feira, fevereiro 03, 2014

Os filhos que saem aos pais...


Os filhos que saem aos pais...
A construção da identidade nas crianças
           
Não é preciso trabalhar com crianças e com pais para reflectir sobre a construção da identidade, basta lembrarmo-nos da nossa infância ou adolescência e com facilidade encontraremos expressões que, inevitavelmente, influenciaram a construção da nossa identidade.
Desde já faço a ressalva que não discutirei aqui a inegável importância da genética na construção da identidade, uma identidade biológica. Defendo, por outro lado, que restringir a identidade a este aspecto, não só conduziria a uma leitura pobre e limitada, como implicaria não reconhecer a importância fundamental das experiências emocionais vividas e da própria criatividade individual.
Para melhor compreender o processo da construção da identidade sugiro partir do modelo proposto pelo professor António Coimbra de Matos. Este modelo sustenta que a construção de identidade dá-se a três níveis de relação com o outro. O primeiro nível de identificação, imagóico-imagético, é aquele que se constrói através das atribuições da mãe/pai ou do mundo, isto é, a forma como o bebé se vê a si próprio é resultado das expectativas do outro, em particular, da mãe. O bebé assimila a imago e a imagem que a mãe atribui, sendo que imago é aquilo que é menos consciente e imagem é aquilo que é mais consciente. Este nível pode prolongar-se pela vida, existindo mesmo indivíduos cuja identidade é quase só construída através deste processo. Ora a frase que dá título a este artigo pode ser um excelente exemplo como esta assimilação acontece. Note-se que o desejo da mãe ou do pai pode ser tão categórico, ou ainda o desejo de suprimir os desejos do filho tão determinante, que o filho, tenha, ou não, determinadas aptidões ou características, está destinado ao fracasso ou à glória, resultado de ditaduras sentenciais que podem apenas corresponder ao desejo materno ou paterno. Veja-se então, um pai ao dizer repetidamente a um filho “o meu filho é igualzinho ao pai, não tem jeito nenhum para isto ou para aquilo”, mesmo que, neste filho, a falta de aptidão não fosse assim tão evidente, a partir do momento de assunção do pai há uma atribuição à criança que pode ser assimilada, impedindo-a de outras explorações e descobertas.
Outro processo de identificação, o mais comum classicamente na psicologia, será o de identificação de modelos (xenomórfica), a criança identifica-se com os modelos; com o pai; com a mãe; com a tia; com o avô, com os professores... Constrói a identidade através dessa identificação: os filhos que querem ser médicos como os pais; ou outro exemplo mais ilustrativo: as crianças que querem jogar futebol como o Cristiano Ronaldo. Quantas e quantas vezes já vimos entrevistas a crianças com estas representações presentes
Por último, o processo de identificação mais importante e consistente é a identificação ideomórfica. A criança identifica-se com o que é, com o que sente e com o que deseja ser, através dos próprios atributos morfológicos e do seu sentir. Esta última identificação acontece mais tarde nas crianças, é preciso passar pelos outros dois níveis de identificação. A criança aqui tem espaço para a criatividade, para a descoberta, para a exploração e parece ser o processo mais completo, que causa maior satisfação.
Pensar a construção de identidade ajuda os pais a facilitarem este último nível, em que a criança deseja ser diferente dos pais, a criança descobre novas respostas e retira satisfação desses encontros. Um papel importante dos pais neste processo será ajudar os filhos a desvendar os seus próprios desejos. Diria ainda, que essa também é uma função importante do psicoterapeuta.
É também importante compreender que estes processos não são estáticos e desenvolvem-se ao longo da vida, sendo por vezes uns mais relevantes do que outros em alguns momentos.

Madalena Motta Veiga 
Psicoterapeuta Psicanalítica Psicóloga Clínica no Departamento de Infância 

sexta-feira, janeiro 31, 2014

Dia Escolar da Não-Violência e da Paz

  Ontem comemorou-se o dia Dia Escolar da Não-Violência e Paz, dia em que decorreu o assassinato do maior defensor da Paz - Mahatma Gandhi.

Este dia é celebrado desde 1964 e tem como objetivo chamar a atenção para uma educação para a não-violência.

Estes são valores que se devem assumir desde cedo na educação das crianças, mas vale sempre recordar e realizar trabalhos com os mais pequenos para que estes sejam sensibilizados para questões como racismo, discriminação, violência física, verbal, e se apele a uma convivência salutar com consciência cívica.
Devemos recordar que na educação das crianças e jovens os adultos necessitam de transformar os comportamentos mais agidos em capacidade de reflexão.

EMDR e Avaliação Escolar: Como vencer o monstro dos testes?

Dores de barriga, suores, mãos trémulas, “brancas”… são os sintomas mais frequentemente descritos no que respeita à ansiedade associada aos momentos de avaliação. Se bem que talvez todos nós já possamos ter experienciado estas sensações, para algumas pessoas este é um pesadelo recorrente e incapacitante.

A ansiedade dos testes caracteriza-se por pensamentos ruminativos assentes na apreensão e na auto-desvalorização, com ideias de catástrofe iminente (não vou ser capaz, vou chumbar…), que levam a uma forte ativação fisiológica e emocional. Esta rápida erupção de pensamentos negativos perturba a atenção do aluno e prejudica a execução das tarefas. O pavor de não ser capaz transforma-se muitas vezes numa profecia auto-realizável, ou seja, tanto se convence que não é capaz, que acaba mesmo por não o ser. Esta ansiedade dos testes pode assumir uma tal proporção que se alarga ao período de preparação e estudo, sendo o aluno dominado pela apreensão e pela expetativa de fracasso. Os pensamentos de inadequação e incompetência dominam a mente, enviando mensagens permanentes de um desempenho pobre e de consequências catastróficas do fracasso. Deste modo, o aluno pode começar a ter um comportamento evitante relativamente a tudo o que antecede a avaliação.

Esta ansiedade de desempenho ou de avaliação muitas vezes não se restringe aos resultados nem à idade escolar, podendo também verificar-se no teste para tirar a carta e condução, em exames médicos, em atuações em atividades extra-curriculares, falar em público, ou seja, sempre que as competências vão ser apreciadas (examinadas por outro e, de certa forma, pelo próprio).

A maior parte dos alunos reconhece estar preparado e saber a matéria, mas depois têm “uma branca” ou um “ataque de ansiedade” que os impede de realizar a avaliação. Este problema é muitas vezes desvalorizado ou encarado como uma “frescura”, mas pode de facto condicionar significativamente o desempenho da criança, do adolescente ou do adulto, prejudicando o seu futuro. As crianças são confrontadas, cada vez mais cedo, com a pressão das avaliações, do desempenho, das médias, numa fase em que a aprendizagem devia ser divertida. A falta de recursos emocionais para lidar com estas exigências pode aumentar a probabilidade de sofrerem desta ansiedade de desempenho de forma prolongada se não receberem ajuda.

O EMDR parece ser uma ferramenta terapêutica bastante eficaz na diminuição dos sintomas de ansiedade associada aos testes. Estudos indicam que em apenas uma ou duas sessões, existe uma diminuição sintomática de cerca de 50% no que respeita à componente emocional e fisiológica. No entanto, as crenças irracionais (sou incapaz, não sei nada, não valho nada, sou burro…) parecem ser um pouco mais resistentes, necessitando de mais sessões, embora a intervenção seja frequentemente mais curta do que em outro tipo de modalidades terapêuticas.


Tendo em conta que se trata de uma problemática que requer uma resolução rápida de modo a aumentar a funcionalidade do aluno, o EMDR parece ser de facto a modalidade mais indicada. Não deve, no entanto, ficar-se pela diminuição sintomática, sendo necessário dar continuidade à intervenção de modo a que as crenças negativas que permanecem não deem lugar a outro tipo de sintomatologia em situações análogas. De recordar, que o EMDR é uma abordagem terapêutica que assenta em vários canais: imagético, emocional, cognitivo, sensorial, não devendo nenhum ser descurado.

Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta EMDR/Psicanalítica
Departamento da Infância (Lisboa)


Como é que se esquece alguém que se ama?


"Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está? 

As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar. 

É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução. 

Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha. 

Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado. 

O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar."

quarta-feira, janeiro 29, 2014

A Psicanálise é apenas uma das inúmeras riscas na pelagem do Tigre

Bion desenvolveu e concebeu uma visão muito particular da psicanálise. De uma forma ainda mais radical do que outros psicanalistas, a meu ver, Bion construiu aquilo a que eu designaria por uma nova psicanálise. Com rigor não se pode afirmar de forma categórica que a Psicanálise de Bion e a Psicanálise de Freud sejam uma e a mesma coisa. Bion apoiou-se, como todos sabemos, imenso em Freud, mas, a certa altura aquilo que saiu da pena de Bion ganhou vida própria, estou convencida que isso aconteceu até contra a sua própria vontade, mas aconteceu. 

psicanálise desenvolvida por Bion deixou de se poder identificar totalmente com a psicanálise Freudiana. Na minha opinião passou a ser uma outra psicanálise, ainda hoje difícil de diferenciar e definir. As ideais inovadoras de Bion e as suas repercussões ainda são difíceis de medir e avaliar.


O aparelho mental que Bion e Freud nos apresentam não é o mesmo. As regras e as leis que o gerem também não são exactamente as mesmas. Bion cria um outro mundo. Uma outra realidade. Uma perspectiva única e inovadora sobre a realidade psíquica.

Acompanhe o Salpicos e a nossa pagina do facebook e descubra com os meus posts esta nova psicanálise.


sábado, janeiro 25, 2014

Emigrar e depois?



Atualmente emigrar é uma escolha que se faz, mais ou menos pressionado pela escassez de oportunidades nacionais, em busca de melhores condições de empregabilidade. Apesar de uma escolha, muitas vezes, difícil, a mão de obra que sai do país não é a mesma que saía no último grande período de emigração (nas décadas de 60 e 70, sobretudo). Hoje em dia, mais e mais pessoas emigram em busca de empregos especializados, estando cada vez mais habilitadas a expressarem-se na língua do país de acolhimento. Este fato permite uma integração e aculturação mais facilitada e harmoniosa.

No entanto, emigrar implica sempre um corte, uma mudança abrupta (na maior parte dos casos) de contexto de vivência: existe um corte relacional significativo, as referências culturais são outras, a língua muda, o estilo de vida muda... Sobretudo, os laços de amizade são aqueles que mais se lamentam pela mudança radical de poiso. Os recursos para manter uma ligação consoladora com os que ficaram e os recursos para criar e desenvolver novas relações vão ser dimensões fundamentais para uma boa adequação à mudança de país.  

Estes primeiros períodos podem ser muito custosos e a solidão, ainda que hajam novos suportes relacionais, pode irromper inconformada. Não é de desprezar esta situação muito difícil de isolamento e adaptação que pode dar origem a sintomatologia depressiva de cariz reativo. Nestas alturas, um apoio psicológico (nomeadamente online - no contexto cultural e linguístico português) pode fazer toda a diferença.

Deixo aqui um texto sobre o que pode ser a vivência penosa da solidão.


O inferno é a solidão

Era uma vez um homem que a dada altura da sua vida se descobriu sozinho. Sem compreender, sentiu-se num lugar remoto, onde não há estradas, onde ninguém mais está... nem vai chegar...

Ao início tomou esta angústia como algo passageiro que se desapareceria da mesma forma como tinha aparecido, mas, depois, sentiu que o desespero se estava a instalar de forma decidida e definitiva, que se alimentava das raízes do que nele havia de bom... e que, se nada fosse feito, em breve, nada restaria do que era.

... até que chegou a um ponto onde a cada noite se confrontava com o abandono absoluto. Deitado na cama, sentia o corpo carente de um calor qualquer... mas nada... temia e tremia... e era assim que, de espírito quase esgotado, se entregava ao sono.

Cada acordar era um despertar para o pesadelo... um nascer cru e cruel num mundo feito de brumas e cinzas... como se uma espécie de injustiça bruta o obrigasse a erguer-se para cima de uns carris que lhe predestinavam tempos, lugares e gestos... e se repetiam até à náusea. O corpo cedo nos trai. É o primeiro que cede aos ataques do inimigo.

Assim que o sol se punha e se confirmava que mais um dia havia passado sem que nenhuma esperança tivesse chegado perto... entristecia-se mais. Com cada noite chegava-lhe mais fome e mais frio...

O pior de tudo era não conseguir compreender a razão de tanto absurdo. A desproporção de tanta dor.

Chegou a pensar a própria fé como uma maldição, algo que lhe prendia o espírito a um estado de coma qualquer... e o mantinha em sofrimento. Uma esperança má que apenas serve para fazer sofrer quem nela se ilude...

Sentia-se só. Precisava de alguém... mas nunca quis ser um peso a quem lhe podia dar a mão, estragar a vida a quem podia, talvez longe dos olhares do mundo, estar também a lutar contra a angústia.

Sentia-se metade de qualquer coisa... do amor só tinha a saudade... que apenas punha a nu a tremenda carência... em que se estava a tornar... um buraco negro...
Numa noite muito fria compreendeu que, mais do que viver com os outros, o inferno é um deserto infinito onde não há nada, onde todos os medos se resumem apenas a um: ficar para sempre só.
Mas quem tem por quem chorar, vive com sentido. Apesar de todo o sofrimento.

Havia que travar uma luta pela vontade de acreditar no bem, uma guerra íntima, ali onde cada homem apenas se tem a si mesmo... é que a grandeza de cada um se pode avaliar também pela profundidade e paciência com que luta contra o mal.
As dores mais profundas resultam, não dos golpes feitos de súbito mas dos que, numa interminável persistência, se cravam de forma lenta e decidida na carne, uma tortura silenciosa, um trabalho persistente. Do mal no bem e do bem no mal...

Chamava-se João.

Quando a morte lhe chegou, apresentou-se a ela com o mesmo medo com que todas as noites enfrentou o nada... talvez com mais fome e frio que nunca...
Acordou numa manhã quente, tranquila e familiar... sorriu, mesmo sem compreender...

Nunca mais ia ficar sozinho.
(http://www.ionline.pt/iopiniao/inferno-solidao/pag/-1)


http://www.psicronos.pt/consultas/atendimento-a-distancia-onlinetelefone_7.html

sexta-feira, janeiro 24, 2014

Quando o Passado Inconsciente Dita a Escolha do Parceiro


Há quem diga que no momento em que escolhemos o nosso companheiro ou a nossa companheira, já sabemos, ainda que inconscientemente, como irá ser ou como irá terminar essa relação.

De facto, a psicanálise e a experiência clínica mostram-nos como isto é particularmente verdadeiro quando existe psicopatologia das relações de objeto internalizadas. Isto é, a interiorização profunda (e não voluntária ou consciente) de relações e padrões relacionais disfuncionais ou desadaptativos com os nossos cuidadores principais durante os primeiros anos de vida. Falamos aqui da forma como sentimos que fomos cuidados (sobretudo durante um período no qual ainda não conseguíamos formar memórias, portanto não há memória senão emocional desse período) e das identificações que fizemos com esses cuidadores e com todo o ambiente envolvente.

Essa experiencia relacional precoce e os respetivos papéis e padrões relacionais interiorizados durante a infância exercem tanto mais força na escolha do companheiro e no curso das nossas relações quanto menos conscientes e elaborados todos estes conteúdos se encontrarem dentro de nós. Nestes casos, o parceiro é frequentemente escolhido de forma inconsciente, apresentando características (atitudes, comportamentos) semelhantes a uma qualquer personagem do nosso passado que nos marcou significativamente, ou então por apresentar uma história de problemas relacionais semelhantes ou muito próximos dos nossos - existe uma identificação com o outro, na medida em que nele nos vemos a nós próprios, sem que muitas vezes consigamos reconhecer esses aspetos identificados no outro enquanto aspetos nossos.

Por exemplo, uma mulher que se queixa insistentemente que os seus companheiros tendem a “transforma-la” numa mãe, apercebe-se gradualmente e durante a sua psicoterapia da sua dificuldade em entrar em contacto com as suas próprias partes carentes, feridas e vulneráveis; da sua tendência na seleção de companheiros com histórias de problemas relacionais e feridas emocionais enquanto uma “expressão” da sua necessidade de contacto (a uma distância segura) com as suas próprias partes carentes e feridas, projetando e identificando essa sua parte emocional vulnerável no outro; de uma dimensão da relação com os companheiros enquanto tentativa de auto-reparação emocional pela reencenação de algo próximo de uma relação mãe-bebé – assumindo ela o papel da mãe que gostaria de ter tido ou que ainda sente precisar; e do facto de tudo isto não só não ter qualquer efeito reparador, como causar vários outros problemas nas suas relações.

Os papéis e padrões relacionais desadaptativos internalizados são inconscientemente ativados nas relações com os nossos companheiros. Esta ativação é ao mesmo tempo acompanhada da indução mútua de papéis complementares a essas relações do passado. Como consequência pode formar-se uma conspiração inconsciente que interprende o casal, configurando uma espécie de “união na loucura” que surge tanto mais poderosa e inescapável quanto a perturbação do casal.

È frequente a experiência de um dos parceiros sentir o outro enquanto um perseguidor implacável, uma autoridade moral que sente prazer cruel em fazer com que o outro se sinta culpado e esmagado; enquanto que o segundo parceiro sente o primeiro como pouco confiável, enganador, irresponsável e traidor, tentando “safar-se com a dele”. Estes papéis são frequentemente permutáveis.

Os parceiros podem ser altamente eficazes em reforçar ou mesmo induzir aquelas mesmas características que mais temem no outro, o que tende a configurar relações sadomasoquistas persistentes. As encenações podem tornar-se altamente destrutivas, por vezes simplesmente porque elas despoletam reações circulares que engolfam a vida amorosa do casal para além das intenções do casal e da sua capacidade de conte-las.

Caso os conflitos precoces em torno da agressão tenham sido severos, surge a possibilidade de reencenar imagens de mãe-pai primitivas/precoces (imagens construídas pelo funcionamento próprio da mente de uma criança de poucos anos de idade) e combinadas em fantasia que comportam pouca semelhança às características reais dos cuidadores do passado.

Transformação e libertação do padrão de escolha inconsciente

No polo da saúde mental prevalece a interdependência livre e flexível, própria de pessoas que experienciam o outro e são experienciadas por esse outro enquanto “pessoas separadas”, ou seja, pessoas não confundidas com figuras e vivências relacionais internalizadas patológicas de um passado longínquo do parceiro.

A exploração, compreensão e dissolução gradual de identificações problemáticas com figuras do passado e de padrões relacionais desadaptativos internalizados no passado é uma das características exclusivas da psicanálise e da psicoterapia psicanalítica. A relação com o terapeuta permite e estimula a reativação de toda a problemática internalizada, agora encenada pelo paciente na relação com o psicoterapeuta. Este, por sua vez, deverá manter a sua atitude empática, serena e compreensiva, ajudando a pessoa a ir tomando consciência do que está a acontecer naquele momento na relação entre os dois, e eventuais ligações que isso possa ter com figuras e padrões relacionais do passado. A identificação das vivências internas da pessoa, lado a lado com a atitude receptiva, empática e compreensiva do psicoterapeuta, conduz à internalização gradual desta nova experiência relacional e simultaneamente à dissolução gradual das experiências relacionais patológicas.

A transferência contínua para as relações do presente dos papéis complementares e padrões relacionais patológicos internalizados do passado interfere seriamente com os objetivos da própria de conseguir uma vida amorosa ou conjugal satisfatória. O desejo inconsciente de reparar as relações patogénicas dominantes do passado e a tentação de as repetir nos termos de necessidades agressivas e vingativas não gratificadas resultam na sua reencenação contínua com o parceiro amado.

Por Diogo Gonçalves
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta

terça-feira, janeiro 21, 2014

Psicanálise e Estimulação Bilateral

A psicanálise e a psicoterapia psicanalítica são abordagens terapêuticas e de acompanhamento psicológico que denomino de percurso.

Durante um período relativamente longo o terapeuta mantém-se lado a lado com o paciente acompanhando-o no seu percurso de vida. Para além de acompanhar, interpreta, analisa, acolhe e transforma os conteúdos que dia-a-dia, sessão após sessão emergem e dão conta da vida mental consciente e inconsciente do seu paciente.

Este percurso, naturalmente longo, quando acompanhado e intercalado com estimulação bilateral permite optimizar o crescimento mental. A estimulação bilateral parece ter efeitos semelhantes à activação e fortalecimento da função-alfa (conceito caro na psicanálise bioniana). As aquisições obtidas pelos insigths encontrados pela via da psicanálise são mais facilmente assimilados pela personalidade e a potenciação da associação livre, em plena expressão da posição PS, percorre caminhos associativos mais rápidos e profundos até se gerar um D significativo e transmutador.


domingo, janeiro 19, 2014

Disfunção Eretil



A Disfunção Eréctil é a incapacidade persistente ou recorrente do homem obter e/ou manter uma ereção suficientemente rígida para uma relação sexual satisfatória. Esta dificuldade sexual pode atingir os homens de qualquer idade, tornando-se mais frequente com o avançar da idade.

As principais causas para a Disfunção Erétil devem-se a problemas físicos, psicológicos ou mistos (com ambos).

Os principais fatores orgânicos (físicos) são:
  • Cirurgias pélvicas;
  • Lesões ao nível da espinal medula;
  • Insuficiência arterial;
  • Doenças crónicas - hipertensão; aterosclerose; diabetes; alcoolismo; tabagismo;
  • Efeitos secundários de alguma medicação (por exemplo: antidepressivos);
Os principais fatores psicológicos são:
  • Stress;
  • Depressão;
  • Baixa autoestima;
  • Sentimento de culpa;
  • Medo de falhar;
  • Conflitos na relação amorosa;
  • Cansaço;
  • Receio de provocar uma gravidez à parceira;
  • Medo de contrair uma Infeção Sexualmente Transmissível;
  • Ansiedade;
Independentemente da causa da Disfunção Erétil, ser psicológica ou física, é sempre importante que o homem, ou o casal, procure apoio psicológico, de forma a saber lidar melhor com as dificuldades e angústias que o problema poderá dar origem (por exemplo: diminuição da autoestima, dificuldades relacionais no casal).

Fernando Eduardo Mesquita
Psicólogo Clínico/Terapeuta Sexual/Terapeuta EMDR

sábado, janeiro 18, 2014

Vídeos online sobre temas de filosofia e justiça

http://youtu.be/aXr1rNTgWT4

O filósofo e professor em Harvard, Michael Sandel, há mais de trinta anos que ensina ética e justiça. Tem aulas e seminários na internet, que qualquer um pode ver (o link acima é para um programa brasileiro da Globo News).

Ele explica em linguagem clara mas sem perder profundidade e alcance as dúvidas que, acho eu, atormentam qualquer ser humano desde pequeno. O que devo ou não fazer? É certo ou errado? É justo? Como fazer? Como viver? Etc etc.

Mas vejam os vídeos porque vale realmente a pena. Sempre achei que entre a filosofia e a psicologia há uma trança que as liga. Pessoalmente, acho que a filosofia ajuda também a viver melhor - e não é isso que todos nós queremos, afinal?



 

sexta-feira, janeiro 17, 2014

Nascimento natural no meio da selva

A psicologia e a Psicanálise há muito que se interessam pelo nascimento e os efeitos psicológicos do mesmo para a mãe e para o bebé.

Otto rank, por exemplo, desenvolveu uma tese importante sobre o trauma do nascimento. Este pequeno video, não chega a 2 minutos, é muito elucidativo sobre o nascimento em meio natural no meio da selva e o quanto, a meu ver, o processo de nascimento, o parto, pode ser algo simples e talvez não tão traumático assim.


quinta-feira, janeiro 16, 2014

BULLYING: A palavra é "Prevenção", agora passemos à ação

Nos últimos dias temos recebido inúmeros contactos de jornalistas, a propósito dos trágicos acontecimentos recentes relacionados com o Bullying. 

Infelizmente, não há muito mais a dizer-se sobre o Bullying. O que falta, sim, é fazer. E fazer desde cedo. Em casa, na escola, na comunidade. Fazer e refazer. Educação para a cidadania e para os afetos. Promoção de competências sociais e emocionais. Atenção, deteção e intervenção imediatas. Ações concertadas na escola e na comunidade, com a participação da família.

Enquanto se continuar fingir que não acontece, que é uma brincadeira ou uma divergência de colegas e enquanto se continuar a remediar e a dizer às vítimas que têm de se defender, tragédias destas e outros casos menos mediáticos ou extremos, continuarão a acontecer todos os dias.


Assim, hoje não tenho muito mais a dizer. E partilho apenas esta animação, excluindo a campanha política no final. Seria bom que estes projetos saíssem do formato “animação” e passassem à ação em Portugal.


Alexandra Barros
Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta
Diretora do Departamento da Infância


segunda-feira, janeiro 13, 2014