sábado, agosto 15, 2009

ACERCA DO LIBERALISMO E DA FALTA DE ESPÍRITO CRÍTICO


Leio sempre com gosto os artigos de João Carlos Espada, que agora escreve ao sábado no i. É o nosso liberal de serviço, e ainda bem que o temos,porque a espécie não abunda em Portugal. Porquê? Bem, parece uma tautologia, mas uma das explicações reside no facto de não termos uma tradução liberal de pensamento. Os ingleses têm-na e souberam travar as tendências absolutistas dos seus governantes há séculos. A gente ainda anda a aprender, mas sem muita vontade.
É verdade que os "anos de chumbo" da ditadura salazarista também não ajudaram nada. Gerações e gerações amordaçadas e sem capacidade crítica (e de auto-crítica). Só isto pode explicar as tentativas patéticas da ERC para proibir comentadores/candidadatos, com o pretexto da igualdade de acesso. Como se não bastasse já a reduzida participação cívica das pessoas, a ausência de discussão de ideias e a aberração de não sabermos em quem votamos (as famosas listas de candidatos), ou seja, de pensarmos que votamos num conjunto de pessoas e saem-nos outras na rifa. Os programas eleitorais parecem feitos para gozar com a gente. Nem eles acreditam naquilo, nem nós, que já sabemos que é para não cumprir, mas todos jogamos ao faz-de-conta.
Tudo isto vem a propósito do tal espírito liberal que nos passou ao lado na roda da história. Uma coisa completamente diferente é o relativismo cultural e moral, que tanto está na moda e que, associado ao politicamente correcto, e à omnipresença tentacular do Estado e das suas clientelas, cria monstros por toda a parte. As criaturas fogem ao controlo do criador, como o monstro de Frankestein, e estão por aí à vista. Na melhor das hipóteses, dão pelo nome de ASAE, ERC, etc. Na melhor das hipóteses.

3 comentários:

commonsense disse...

Palmas, Clara. Que texto sensacional. Era tão difícil dizer tão bem tudo aquilo. Eu queria, mas não consegui. Mas não tenho inveja, juro.

Clara Pracana disse...

Por acaso fiquei a pensar se os leitores não poderiam confundir o liberalismo que refiro no post com o liberalismo económico, que já é outra questão. Acho que há que repensar, e urgentemente, a questão do papel do estado nas sociedades modernas. Um estado fraco dá lugar às máfias, um estado tentacular e clientelista, também. Curioso, não é?
Precisa-se estado forte mas respeitoso das liberdades dos cidadãos e que não nos trate como atrasados mentais - dava para pôr um anúncio.
O que é que isto ver a ver com a psicanálise? Tudo. A forma como vemos o mundo e "estamos" nele depende dessa interacção misteriosa entre o nosso mundo interno e a realidade externa.Coisa que o Freud lembrou toda a vida.

commonsense disse...

Pois é. Era preciso um Estado que estivesse legitimado como sério e capaz, que tivesse firmeza, agisse no interesse das pessoas, mas fosse pequeno e não absorvesse metade da riqueza nacional. Tinha de ser implacável com a corrupção.

E para isso era também preciso que os portugueses tivessem abertura de espírito e mais tolerância com os outros do que consigo mesmos, tivessem sentido da dignidade própria e da dos outros.

E não digo mais, tantas são as faltas e tão difíceis de colmatar.

No entanto, Clara, e não sei se isto tem a ver com a psicanálise, é preciso não perder a esperança, não desistir e, em vez de disparar contra tudo e todos ou de se fechar na casca ensimesmada do eu, é preciso que cada uma vá fazendo o que acha e como acha que deve ser feito.

Não sei se tenho autoridade pessoal para dizer isto.