sexta-feira, julho 06, 2012

Escala e escalada - lutando para manter os pés assentes na terra


Os avanços tecnológicos estão a criar autênticas revoluções a nível da relação espaço-tempo nas nossas sociedades ocidentais globalizadas (ver post sobre artigo de Michel Serres para mais informação sobre o tema). Parece que quase tudo na vida se tem vindo a tornar fácil e imediato: o adiamento da frustração, assim como, os limites à gratificação associados ao modo ”ter” (por contraste ao “ser”), tendem a esbater-se. A nível da vivência subjetiva do tempo passamos a ter tendência a viver desfazados do “tempo da realidade” – o tempo presente, onde o principal e o verdadeiro acontece. Passa-se pois a viver no passado, por exemplo, na busca contínua e repetitiva do experienciado gratificante e seguro, mas também num futuro, promessa megalómana da realização dos nossos sonhos (os Bancos são os nossos gurus a esse nível!).

E com tudo isto o presente estreita-se e fica vazio, cada vez mais vazio. É preciso preenchê-lo com sensações e experiências excitantes e alienantes (das realidades virtuais, dos reality shows, da vida dos heróis e ídolos da nação...): é a substituição do espaço-tempo da realidade próxima que nos cerca, por várias outras que, quando acabam, saem de cena abruptamente deixando um vácuo no seu lugar. 

O “ter” é cada vez mais possível e, por isso mesmo, tem tomado cada vez mais o lugar compensatório do “ser”, em défice – é que a facilidade e conforto de vida não podem nem compensam nunca a experiência irredutível da relação humana e dos vínculos humanizantes que a caracteriza no seu melhor. A este nível são os por-menores que alimentam o “ser”, momento a momento; é a entoação ternurenta e altruista de uma palavra banal, um gesto atento mas totalmente gratuito ou um cliché pronunciado com todo o coração. É pois numa relação sanígena, de dádiva, reconhecimento e valorização que o vazio pode ser preenchido com vitalidade, entusiasmo e amor, dispensadores da busca angustiada de um sentido da vida. 

É também esta a lógica da relação terapêutica: a atenção aos detalhes e aos processos emocionais, que muitas vezes passam despercebidos, por serem automáticos, ficando ofuscados pelos “por-maiores” sensacionalistas das nossas vidas...

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