domingo, agosto 13, 2006

Teoria da dissociação do ego

“Modelo V – Teoria da dissociação do ego

Nos últimos anos da sua obra, Freud escreveu importantes trabalhos em que concebeu que o psiquismo não funcionava unicamente pela interacção e conflitos entre sistemas, como as pulsões do id contra as proibições do superego, etc. Assim, a essa teoria “intersistemica” ele acrescentou que também há conflitos “intra-sistemicos”, isto é, dentro de uma mesma instância psíquica podem existir conflitos, como é o exemplo de, dentro do ego, um mecanismo de defesa que pode se opor ao outro, etc. Dessa forma, Freud lançou as primeiras sementes que possibilitaram aos pósteros autores desenvolverem uma concepção inovadora dos conflitos intrapsíquicos, o que pode ser exemplificado com os trabalhos de Bion – notável psicanalista britânico – que descreveu a existência concomitante em qualquer pessoa da “parte psicótica e da parte não psicótica da personalidade”, bem como da parte infantil agindo simultaneamente com a parte adulta do sujeito, etc. Creio que duas metáforas podem ilustrar melhor esse conceito de alta relevância na prática analítica contemporânea. 1. Podemos comparar o mundo do psiquismo interior com o mapa geográfico do mundo, em que as regiões são completamente distintas (zonas geladas dos pólos junto com zonas tórridas do Equador, ou temperadas de outros continentes, etc.), cada região com a sua característica especificas. Assim, quem conhece unicamente o pólo Norte, certamente terá uma ideia equivocada do que, de facto, é o globo terrestre. De forma análoga, qualquer sujeito não pode ser julgado por um único aspecto da sua personalidade; pelo contrário, na situação analítica, é indispensável que o analista propicie ao paciente a visualização de todas as suas distintas partes e de como elas interagem entre si. 2. Uma segunda metáfora consiste no modelo do “arco-irirs”, ou seja, no entendimento de que a cor branca (por exemplo, a luz do sol) quando sofre o fenómeno físico da refarão (quando a luz branca do sol atravessa uma nuvem carregada com água da chuva), ela se decompõe nas sete cores típicas do arco-íris. Do mesmo modo, cada pessoa pode ser decomposta em uma série de “partes”, com as cores características de cada uma delas. Um lema que parece apropriado para o objectivo de “cura” analítica seria: “onde estiver uma parte, o todo deve estar e, a partir do todo, reconhecer as partes”.

In Zimerman, D. (2005) Psicanálise em perguntas e respostas – verdades, mitos e tabus. pp. 130. Porto Alegre: Artmed

Concordo em absoluta com a enorme importância para a psicanalise actual dos conceitos de “partes do psiquismo” e com a necessidade de as revelar ao paciente, que passará a ter uma percepção de si próprio enriquecida e, portanto, terá a possibilidade de se aceitar em múltiplos registos e com múltiplas partes que são activadas em determinadas circunstâncias ou que co-existem em aparente paradoxo.

Contudo não me parece que estes conceitos derivem, como diz Zimerman, da dissociação do ego. Acho que o conceito de dissociação do ego foi de facto importante e abriu o caminho para que os conceitos de posição e de partes da personalidade pudessem emergir, mas eles assentam, na minha opinião, numa outra lógica que não a estrutural: assentam na noção da vida mental como um mundo de relações objectais inconscientes. São conceitos emergentes da Teoria das Relações Objectais Internas.

Explore:

Intersubjectividade: conceito e experiencia em psicanalise
Winnicott: Uma psicanálise não-edipiana
A experiência psicanalítica
Object relations theory - Wikipedia
The Object Relations
Object Relations Theory
Object Relations Theory - Key Concepts
Melanie Klein
D. W. Winnicott
Object Relations Theory
What is British Object Relations Anyway?

Imagem de:
Fernando Diniz - 33,9 x 47,5 cm - óleo sobre papel - 1968

3 comentários:

Cleopatra disse...

"Do mesmo modo, cada pessoa pode ser decomposta em uma série de “partes”, com as cores características de cada uma delas. "

Absolutamente real e humano.
Sentimos sempre que não somos apenas um pessoa ou um perfil, ou ... então somos um, que se compõe de vários.
Tantas facetas...Basta dar-lhes largas.
No entanto há uma que é a estrutura das outras...
Ou não será assim?

Ana Almeida disse...

Em psicanálise pensasse que a questão não está na dissociação do self, mas nas forma como nós nos alienamos de partes de nós próprios, não querendo saber delas, ignorando-as e por vezes até recusando-as.
O processo psicoterapêutico muitas vezes visa tornar a pessoa mais consciente dessas suas partes negadas e rejeitadas. Com a aceitação dessas nossas "facetas" ficamos mais ricos e mais em contacto connosco próprio. Não há propriamente uma parte que estrutura as outras, aquilo que existe, pensasse, é uma ocupação variável de cada uma no "espaço personalidade". Haverá com certeza uma ou duas que ocupam um espaço maior, dominador, dentro da personalidade.

Cleopatra disse...

Também concordo que há uma faceta dominante, que se destaca das outras... e também penso que, as facetas se revelam conforme as solicitações exteriores, as circunstâncias....
Ora somos protectores.... raramente gostamos de ser protegidos... mas por vezes sabe tão bem!

Falo por mim claro.

Sempre a decidir tudo, até em casa também cansa.
mas qdo dizemos, decidam voc~es, pronto, lá vem asneira ( nesta parte estou a brincar , claro!0

Olho para mim e vejo-me no global como uma pessoa equilibrada... mas se algo não fica no meu limite ou sob a minha compreensão, .... chego a "entrar em parafuso" ...perco o perfil como digo a rir.

É!... muito controladora..., pouco controlável...senhora do meu nariz, mas sensível "à brava"!

Choro com tanta facilidade como rio...
Bem isto já parece psicoterapia.
BNoite. E desculpe o perfil desenhado. ;)