No trabalho com crianças e
adolescentes surgem, com alguma frequência, problemas relacionados
com a ansiedade despertada pela necessidade de perfeição; o “filho
perfeito” produto da projecção dos desejos e angústias do
adulto; perfeito na escola, nas actividades, nas relações, etc.
Estas ocorrências parecem cada vez mais agravadas pela aceleração
continua do ritmo de vida, quer do adulto quer, consequentemente, da
criança. Com muita regularidade as crianças apresentam-me
(queixando-se da falta de tempo para brincar) horários semanais das
actividades escolares e extra-escolares, com dias a iniciar às 8
horas e a terminar às 21 horas, com actividades obrigatórias ao
sábado e com tempo livre apenas ao domingo que é, como me dizem
algumas crianças e pais, obviamente para estudar. Note-se que nas
treze horas diárias de actividades escolares e extra-escolares,
muitas vezes, os intervalos são para refeições e para deslocações.
Precisamente com a finalidade de
alterar hábitos e sensibilizar os adultos para as consequências e
para as necessidades das crianças têm surgido movimentos e
programas de desaceleração, num estilo bem americano: o “slow
parenting”. Muitos dos preceitos destes movimentos apoiam-se
num conhecimento há muito sustentado pela psicologia.
É essencial para o desenvolvimento da
criança o espaço para o jogo, para brincar, para o ócio, para o
silêncio, para a frustração. O jogo ou a brincadeira são assim
mediadores de desejo, não apenas para a criança mas também para o
adulto (o jogo no adulto assume diferentes formatos, por exemplo, a
politica), e como expressão de desejo traz consigo satisfação. A
brincadeira está, na criança, relacionada com a inteligência de si
mesmo, do mundo que a rodeia e dos outros, ou seja, é através do
brincar que a função simbólica desperta, atribui-se sentido às
diferentes expressões emocionais e ganha-se experiências de domínio
e frustração. A necessidade que a criança tem de brincar ou de
jogar parece ser, para os pais, mais fácil compreender do que a
importância de momentos de prazer na experiência mais passiva da
criança, a angústia que os pais têm do dolce far-niente.
Frequentemente oiço pais a censurarem o tempo de desocupação dos
filhos, desejam que os filhos não percam tempo e não estejam
“prostrados no sofá ou á frente da televisão sem fazer nada”.
No livro “As etapas decisivas da
infância” Françoise Dolto alerta-nos para a importância de
muitos destes momentos, para a autora alguns adultos parecem temer o
que pensam ser o vazio mental do filho, talvez porque, nos seus
próprios momentos de ociosidade não encontrem bem-estar. É
importante no desenvolvimento que exista espaço para o prazer de
ouvir, de olhar, de sentir, de observar, prazeres inteligentes e por
vezes meditativos que estimulam a criança para o conhecimento dela e
do que a rodeia.
Hoje, o excesso de actividades das
crianças associado à falta de períodos de ócio são muitas vezes
responsáveis pela ansiedade, pela frustração e pelo entediamento
que algumas das crianças sentem.
Se tiverem interesse em conhecer mais
sobre o movimento americano slow parenting deixo aqui alguns
links.
Madalena Motta Veiga
Psicoterapeuta da Psicronos em Cascais
e Lisboa