quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Relações de Vinculação


Divulgo um e-mail que recebi hoje, para quem esteja interessado, que a Sociedade Portuguesa de Psicoterapias Construtivistas (SPPC) vai realizar nos dias 9 e 10 Março de 2007, um seminário sobre Relação de Vinculação – Investigação e Intervenção, na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Lisboa/Alameda da Universidade.
A oradora, Isabel Soares, é psicoterapeuta, professora catedrática no Departamento de Psicologia da Universidade do Minho, investigadora com diversas publicações no domínio da psicopatologia desenvolvimentista e das relações de vinculação.
O horário é no dia 9: 17h30-21h (Contributos da Investigação) e dia 10 das 9h30-13h (Vinculação e Intervenção Clínica).
Os valores são: Associados até 23 de Fevereiro (já amanhã!) 35€, após a data 45€; Não associados até 23 de Fevereiro 45€, após a data 55€; Estudantes até dia 23 de Fevereiro 25€, após a data 35€ (a juntar comprovativo da propina).
A inscrição pode ser feita online via website: http://www.sppc.org.pt/.

A Apologia de Sócrates


Para quem ainda não assistiu, aqui fica uma sugestão de lazer patente na Sala Experimental do Teatro Municipal de Almada até 25 de Fevereiro: A Apologia de Sócrates. Fiquei espantado com a forma como se cruza a simplicidade do “entorno” com o rigor na interpretação de um texto filosófico difícil. Inegável, em meu entender, é também a actualidade com que alguns temas são tratados e que, a somar à dimensão filosófica, abordam a esfera jurídica e política com uma firmeza irrepreensível. Mesmo a não perder!

quarta-feira, fevereiro 21, 2007

Ser Português

Como sabem, o European Social Survey é um órgão que procede a inquéritos sociais junto dos cidadãos da Europa. Saíram agora os resultados do segundo inquérito. 38,9% dos portugueses dizem “não ter nenhum interesse pela política”, contra uma média europeia de 17,9%.
Há tempos falámos aqui no blog sobre o que era isto de ser português. Pelo visto, é também este desinvestimento naquilo que devia a todos nós dizer respeito. A palavra política tem a ver com a polis, a cidade grega, onde pela primeira vez os homens experimentaram a democracia. Muito diferente da nossa, é bem verdade (era directa, as mulheres, os escravos e os estrangeiros não votavam, etc). Mas implicava uma noção de bem comum que parece que desapareceu praticamente do nosso paradigma cultural.
Não precisávamos do resultado do relatório para sabermos que, em Portugal, as pessoas se estão nas tintas para a política, como se fosse uma coisa que não lhes dissesse respeito. Às vezes até se lhe referem com desprezo como “a porca” e outros mimos (como já referia o Rafael Bordalo Pinheiro) que são bem significativos da pouca importância que damos a tudo o que diga respeito à vida pública e às questões de cidadania.
De onde vem esta apatia, esta aversão? Curta experiência democrática? Séculos de governos centralizados? Forte influência do Catolicismo?
Fraca autonomia dos indivíduos perante o Estado? Fraca autonomia em geral?

domingo, fevereiro 18, 2007

Curso: A Relação Terapêutica - Narrativas e Personagens

Nos dias 23 e 24 de Fevereiro vai-se realizar na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa um curso ministrado por Antonino Ferro sobre A Relação Terapêutica - Narrativas e Personagens.


A Conferencia proferida por Antonino Ferro na sexta-feira às 21h, intitulada IMPLICAÇÔES TEÓRICAS DO PENSAMENTO DE BION foi já alvo de atenção no post da Ana Eduardo Ribeiro e é de Entrada Livre

Para além da conferência, no sábado Antonino Ferro irá comentar duas apresentações clínicas. A inscrição no Sábado implica o pagamento de 75€ (Até 15 de Fevereiro eram 65€).

Sobre Antonino Ferro, no folheto de divulgação lemos:
A originalidade do seu pensamento torna-o um dos mais destacados psicanalistas contemporâneos, encontrando-se a sua obra traduzida em várias línguas.
Elabora uma concepção singular das transformações que se dão no gabinete de análise e considera o campo analítico como o lugar onde todas as histórias são possíveis de serem narradas: histórias que têm o seu inicio quando os factos "não digeridos" do paciente se encontram com a capacidade transformadora do analista.

Considera a psicanálise a partir de um duplo vértice: como forma de literatura (relatos feitos pelo paciente ao analista) e de terapia (cura de sofrimentos psíquicos através da possibilidade de narrar e partilhar o que, até então, só podia ser expresso através do mal-estar e sintomas).

Tem investigado e desenvolvido as ideias de Wilfred Bion e a sua aplicabilidade na prática clínica.

Wilfred Bion (1897-1979) foi um pensador inovador e rigoroso nas suas reflexões sobre a prática analítica e a estrutura do psiquismo humano. Utilizou a sua vasta experiencia de análise de doentes psicóticos para notavelmente desenvolver uma teoria do pensamento e das modalidades do papel do "negativo" no funcionamento mental (normal e patológico).


Eu estarei lá. E vocês?

Antonino Ferro

No próximo dia 23 de Fevereiro, pelas 21 horas, na Aula Magna da Faculdade de Medicina de Lisboa/Hospital Sta Maria, Antonino Ferro irá proferir uma conferência intitulada "Implicações Teóricas do Pensamento de Bion".
Este autor tem vindo a desenvolver um trabalho de pesquisa na continuação das ideias de Wilfred Bion (1897-1979) e na aplicação destas à prática clínica.
É possível encontrar alguns livros do autor que já se encontram traduzidos para português/brasileiro (editora Imago), entre os quais, "A Técnica da Psicanálise Infantil", "A Psicanálise como Literatura" e Terapia" e "Na Sala de Análise".
A ver...

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

Dia dos Namorados!


"Amor é fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói e não se sente,
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer".




Bonitas palavras para o dia dos Namorados do nosso poeta Camões.
Servirão elas para descrever uma declaração de amor, ou serão palavras da solidão de quem espera encontrar o amor da sua vida. Ou será apenas falta de sexo?

Não sei! Mas Freud, sem dúvida explicaria isso melhor do que eu!
O que sei, é que nestas datas em que se comemora algo, quem não tem nada para comemorar, ou neste caso com quem comemorar, se pode sentir na maior das tristezas. Afinal de contas, é suposto estar com alguém, é isso que a sociedade valoriza, e os que estão desemparelhados?

Será que no futuro existirá o dia dos solteiros?
Será que os solitários conseguem ser felizes?

Mais uma vez o modo como encaramos os acontecimentos é fundamental, afinal dizer que “ estou sem relacionamentos!” ou dizer “ estou entre relacionamentos!” revela uma atitude que pode salvar algumas pessoas da depressão.

Outra vantagem de estar só, é fazer aquilo que nos dá na real gana! Sem pensar que tem que se estar em casa a determinadas horas para fazer determinada coisa.
Isto serve de fraco consolo para aqueles que desejam uma relação de co-dependência. Afinal entrar numa casa vazia em que apenas esperam as tarefas domésticas pode ser um “murro na barriga”!

Não me vou alargar nesta argumentação de prós e contras, para isso existem programas de televisão.
Vou apenas deixar uma reflexão:
“Estaremos bem com outra pessoa, quando conseguir-mos estar bem na solidão?”

O Casamento tal como é e tal como poderia ser


Gulotta, psicólogo e advogado de direito penal e criminologia classifica os vários tipos de casamento, tarefa nada fácil pois existem tantas categorias como casais.

O autor inicia a classificação tendo em conta a história do casal, que consiste em assinalar o casamento com as letras A,H,O,S,V,X,Y e I.
O casamento A é o que se iniciou com alguma distância entre os cônjuges porque, por exemplo, foi motivado pelo interesse ou imposto pelas famílias. Pouco a pouco levou a uma aproximação entre marido e mulher pela formação de um vínculo comum, como um filho, trabalharem juntos, fazerem um desporto a dois, etc. No casamento H, a situação inicial é como a do casamento A, mas o vínculo comum não resultou numa aproximação, as suas vidas permanecem paralelas, mesmo com o nascimento dos filhos.
No casamento O marido e a mulher “correm” atrás um do outro, girando num vazio, sem nunca se encontrarem. No casamento S, o casal procura uma boa adaptação mas raramente conseguem melhorar a sua situação inicial. O casamento V é aquele que se inicia feliz mas vai sempre piorando. No casamento Y o início satisfatório dura mais tempo do que o V mas a união termina da mesma forma. Estas últimas duas categorias de casamento testemunham que o amor só é eterno enquanto dura. O casamento X corresponde ao A mas, depois de um período de acordo, cada um dos elementos do casal segue o seu caminho.
No casamento I tudo vai bem do princípio ao fim.

Um outro tipo de classificação, considera a estabilidade da relação e o facto de os cônjuges a considerarem como mais ou menos satisfatórias.
A pior das combinações é a do casamento estável-insatisfatório: estando insatisfeitos, mantêm estável esse nível de insatisfação, que o autor classifica como “prisão matrimonial”, em que podem trocar declarações de amor dissimulando uma profunda hostilidade. Na prática, não podem nem permanecer juntos, nem separarem-se. Raramente discutem e sentem-se fechados numa gaiola, utilizando-se reciprocamente para se manterem à distância. As mensagens entre eles são geralmente mal transmitidas e mal recebidas, não existindo esforço de esclarecimento recíproco. Só excepcionalmente recorrem ao psicoterapeuta uma vez que, “aos seus olhos”, os seus problemas permanecem sem gravidade.
O casamento instável-insatisfatório agrupa a maior parte dos clientes dos advogados ligados a divórcios e dos psicólogos. A história destes casais termina, regra geral, em separação e divórcio. Reconhecem o insucesso da sua relação mas não fazem nada para a mudar, acusam-se de forma contínua, desencadeando hostilidade recíproca, que serve para deslocar o conflito. Neste tipo de união, o conflito não aparece à primeira vista, por vezes encontra-se mascarado, e as expressões de agressividade subjacente manifestam-se no sarcasmo, na frigidez, na impotência, no alcoolismo… Neste casos, o elemento do casal que é objecto da hostilidade, apesar de compreender que os sintomas são manifestação de insatisfação, envia o “doente” em questão para o médico, psiquiatra ou psicólogo. O que, frequentemente, concede unidade a estes casais é o desejo infantil de resgatar num futuro próximo as frustrações do passado, que ao longo do tempo, conduz apenas a um aumento de insatisfação.
A união instável-satisfatória é a que se encontra, frequentemente, em casais unidos há mais de dez anos, e que, de acordo com o autor, é pouco conhecida visto que estes casais, pela natureza da sua relação, dificilmente recorrem a especialistas para resolver os seus problemas. A instabilidade revela-se em disputas frequentes a propósito tanto de questões insignificantes como de maior importância. A satisfação manifesta-se no facto de, para além da agressividade nas disputas, cada cônjuge não ser adversário do outro, mas sim um aliado, um companheiro de experiências, aceitando os altos e baixos do casamento. A instabilidade pode surgir da necessidade de apaziguar a incerteza afectiva, de um ou de ambos os cônjuges, ao sentimento de segurança que a relação cria para um ou para os dois.
A última classificação, a mais perfeita e, por isso, raramente atingida, é a união estável-satisfatória. Encontra-se em casamentos de longa data, e raramente em casais em que ainda partilhem a responsabilidade da educação dos seus filhos. Estes casais alcançam uma relação que exclui a mínima competitividade, as mensagens são claras, congruentes e compreendidas conduzindo a uma colaboração recíproca. Quando discordam, aceitam a diferença como um dado humano inevitável, do qual se pode extrair um ensinamento, e não como uma prova de hostilidade, o que lhes permite tomarem decisões comuns, reservando parte de autonomia pessoal. Discutem e mostram-se agressivos mas nunca ultrapassam o limiar da vulnerabilidade do outro. Nesta união a sua relação é vivida como puramente voluntária: estão juntos porque assim o desejam.

Penso que estas classificações, como quase todas, nos limitam e nos levam a grandes discussões, mas também promovem ensinamentos e reflexões pois a possibilidade de não estarmos de acordo é elevada. Deixo aqui o desafio aos leitores que poderão descobrir em que categoria se encontram os vossos casamentos de acordo com o autor, a reflectirem e a darem a vossa opinião sobre esta classificação.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

Referendo

Finalmente os resultados do referendo que tanto exaltou a opinião publica.
Sem prejuizo da importância de se debater este assunto, digo finalmente porque me pareceu excessiva a campanha, sobretudo a campanha do Não, de tão intrusiva e violenta. A mim pareceu-me em certos momentos que se perdeu a noção do bom senso, e a capacidade de argumentação.
Por outro lado, finalmente, porque esta questão parece começar a resolver-se. Talvez daqui a 10 anos tenhamos um sistema de saúde capaz de acolher estas alterações, mas se em 1998 já se tivessem começado a introduzir estas alterações, hoje alguma coisa já teria mudado.

Agora, quanto aos resultados, o que mais me espantou foi a abstenção!!!
O que explica que mais de 50 % dos eleitores não tenha manifestado a sua opinião num assunto como este??
Ontem pensei que, campanhas tão morais (no sentido em que se apoiaram fortemente nos valores do bem e do mal), culpabilizantes e intrusivas, tenham levado as pessoas a optar pela abstenção(se calhar é uma teoria tendenciosa).
Maior parte das explicações assentam nas condições climatéricas, mas eu prefiro continuar a pensar que não pode ter sido esse o motivo pelo qual metade dos portugueses não foi votar.

domingo, fevereiro 04, 2007

Mulheres que valem mais mortas do que vivas

Tenho andado com problemas na net e dificuldades de aceder ao nosso blog. Mas hoje fiquei contente por ver que, a propósito do microcrédito, se levantaram questões muito importante para nós, como indivíduos, como seja a da identidade nacional (ver os comentários que lá estão, muito interessantes).
Mas para já queria falar de uma outra coisa, que por acaso também se liga à identidade (até pensava que já tinha postado este texto, mas pelo visto não. Vejam como anda o meu computador (ou será a minha cabeça?). É o seguinte:
Li há dias no jornal Times que tinha sido descoberto pela polícia chinesa um gang que assassinava raparigas com o objectivo de vender os seus corpos para “casamentos no além”. Parece que existe na China uma superstição de que se um homem morre solteiro será infeliz na outra vida. Para acautelar essa fatalidade, os pais compram cadáveres de mulheres para enterrar juntamente com os filhos. Preço de cadáver morto para o efeito e em bom estado: £1,050, o que dá mais ou menos 1500 euros.
Sabendo nós que há mais homens que mulheres na China, como resultado da usual preferência dos pais por filhos do sexo masculino, aqui está uma forma de a mulher numa sociedade patriarcal como a China aumentar o seu “valor”.
O Dr. Freud fartou-se de escrever sobre a necessidade que a humanidade tem de alimentar superstições e ilusões, como consolo perante a morte e outros males. Continua tudo na mesma, no século XXI, e neste caso no país que se prepara para ser a maior potência económica dentro de vinte anos!

terça-feira, janeiro 30, 2007

ABORTO SIM OU NÃO...SERÁ SÓ ESTA A QUESTÃO?

Ontem assistiu-se a mais um longo debate de ideias e ideais sobre a polémica e pertinente questão do aborto (programa Prós e Contras, RTP1).
Para além da questão central do referendo, "Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?", outras questões surgem. Uma delas de amplo interesse para este Blog, a questão das repercussões psicológicas que eventualmente poderão estar associadas a uma situação de interrupção da gravidez (neste caso voluntária).
Sem apontar caminhos e lançar respostas, ou hipóteses de resposta, deixo em aberto este espaço para que, profissionais de saúde mental, e todos aqueles que pretendam reflectir sobre esta matéria, possam aqui fazê-lo voluntariamente.

Pânico e Fobia


Definições e Reflexões!

Ao consultar um antigo dicionário de psicologia encontrei a seguinte definição de Pânico: ”Medo terrível, quase sempre acompanhado de comportamento irreflectido ou desatinado.” Não aprofunda muito pois não?

Mas vamos ver no mesmo dicionário a definição de Fobia: “Medo forte, persistente e irracional provocado por um estimulo ou situação especifica.” Começa-me a parecer que a raiz destes conceitos é o medo… vamos investigar:

“Medo, Uma reacção emocional forte envolvendo sensações subjectivas de desagrado, agitação e desejo de fugir ou de se esconder, acompanhado por um aumento de actividade do sistema simpático. O medo é uma reacção a um perigo específico presente; a ansiedade a um perigo antecipado; a fobia é um medo irracional persistente.”

As definições presentes são mais abrangentes e focam mais as questões das limitações à nossa vida quotidiana. Ou seja, ter fobia a ratos, pode não levar um sujeito a procurar ajuda, visto que não se vê confrontado com a situação muitas vezes, no entanto, um sujeito que sente um forte desconforto em locais fechados e sem ventilação mais rapidamente irá procurar ajuda.

Mas no fundo, o medo não é da situação em si, o medo é de perder o controlo, de enlouquecer, de desmaiar ou de morrer na situação. Posso dizer que a preocupação com a morte é desnecessária visto que, pode acontecer a qualquer momento sem qualquer aviso e vai acontecer de certeza. Também posso dizer, se vivermos o tempo suficiente também corremos o risco de entrar num processo de demência, portanto a loucura apesar de não ser uma certeza é uma forte possibilidade.

Resta saber se perdemos o controlo assim com tanta facilidade… numa situação fóbica não perdemos o nosso controlo… o que acontece é na maioria das vezes saímos da situação antes que de ter as boas notícias de a ter superado sem morrer, enlouquecer ou perder o controlo. É por este motivo que as técnicas comportamentalistas de imersão acabavam por funcionar, mas o sofrimento causado aos pacientes era demasiado e colocava questões éticas sérias. E como tal, já não se usa!

Em jeito de resumo segue o meu conselho a quem começa a desenvolver uma fobia: “fique para ver o que acontece, e racionalize, vai ver que sobrevive!”

Se não conseguir ficar, procure ajuda.
Se por acaso morreu… não se envergonhe, todos nós iremos passar por isso!

sábado, janeiro 27, 2007

Ora ajudem-me lá a pensar

Tenho andado aqui a pensar porque é que um tema como a felicidade motiva tantos comentários e uma questão como a do microcrédito, não. Lembram-se desse meu post? Tinha a ver com a criatividade, a capacidade de iniciativa, a construção da autonomia, até a construção da identidade. O facto dá tanto mais que pensar quanto depois de ter ido à tal conferência falei com algumas pessoas amigas e conhecidas, que estão em situação de inactividade ou mesmo de desemprego, e reparei que a reacção era de aparente desinteresse ou mesmo de fuga à questão. Ou seja, nem queriam ouvir falar do assunto. Chego à conclusão de que a possibilidade de construirmos algo de raiz, com o esforço que isso obriga, é um assunto desagradável e que nos obriga a confrontar com uma série de questões penosas. E fico a interrogar-me sobre o aparente “conforto” de se ser desgraçadinho… Bem, o Freud já tinha falado disso. Até lhe chamou benefício secundário.
Será que isto é, por outro lado, uma questão muito portuguesa? Sociedades latinas, falta de iniciativa individual, etc. Será? Deixo aqui a pergunta.

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Solidários com a solidão

“Ninguém cometeu maior erro do que aquele que não fez nada só porque podia fazer muito pouco.” Edmund Burke.

É com esta notável citação que começa o livro “Solidão” editado pela Associação Coração Amarelo.A associação Coração Amarelo é uma Instituição Particular de Solidariedade Social, foi criada no ano de 2000 e assenta a sua actividade no trabalho de Voluntários com o objectivo principal de apoiar pessoas em situação de solidão e/ou dependência, preferencialmente as mais idosas.
O objectivo do lançamento do livro é angariar receitas para levar a cabo as várias actividades de ajuda aos mais solitários.
Consulte-se www.coracaoamarelo.org

Não será a citação de Edmund Burke extensível a muitas e variadas áreas da nossa vida, até mesmo a nós, psiólogos, no âmbito do exercício da nossa profissão (psicologia/psicoterapia) no dia a dia nos nossos consultórios?

Deixo o mote para reflexão…

segunda-feira, janeiro 22, 2007

“As Pontes da Vida – Do Sofrimento Nasce Poesia”


Nas palavras de Vítor:

O Magnífico Computador

“À medida que a doença me foi aprisionando o corpo, a lucidez tornou-se, simultaneamente, a minha maior alegria e o meu maior sofrimento. Para quem como eu, sempre amou as palavras e o laborioso uso que delas se pode fazer, não poder escrever era abrir caminho à demência. Mais do que uma forma de comunicação, a escrita é sobretudo, uma terapia mental onde tento criar uma qualquer lógica apaziguadora. Poder juntar letras, criar palavras, construir frases, dar-lhes um sentido, desenvolver um raciocínio claro sobre o que me rodeia e mais profundamente me toca, desenvolveu ao meu ego um bem-estar roubado pela doença. É por tudo isto (e muito mais) que resolvi escrever este texto: uma humilde forma de agradecimento por me sentir vivo”.

Nas palavras de Alfredina:

Os Meus Poemas

“Os poemas que escrevi
foram só recordações
Palavras que
muita gente esconde nos corações
São sinceras e leais
com verdades escondidas
São poemas liberais
de alegrias vividas
Esperança que ainda
existe nos restos de uma ilusão
Pedaços amargurados
de uma vida com paixão
Os meus poemas o que são?
São tanta coisa guardada
entre lágrimas e sorrisos
De tristeza desprezada
a sentimentos escondidos”.

“As Pontes da Vida” é o título de um livro de Vítor Gomes e Alfredina Ribeiro (editado pela Bertrand), ambos aprisionados num corpo que, no entanto, não lhes levou a alma e onde encontraram o equilíbrio escrevendo poemas, viajando pelas palavras e lugares (des)conhecidos.
Vale a pena ler! Obrigado Vítor e Alfredina, por partilharem connosco os vossos poemas!

sábado, janeiro 20, 2007

ACERCA DA FELICIDADE

Acompanhei há duas ou três semanas atrás no programa "Câmara Clara" (a propósito, num panorama televisivo lamentável, este programa é dos poucos que se consegue ver com interesse) um debate sobre a felicidade.
Ora aqui está um tema intrigante e há que agradecer à Paula Moura Pinheiro tê-lo chamado à colação. Não vou aqui resumir o que se disse no programa, não há espaço para isso. Mas seria bom que o tema fosse mais vezes discutido porque poucos conceitos haverá que possam ser mais enganadores.
Para começar, e só para provocar a discussão, alguém me sabe dizer o que é a felicidade? É subjectivo, dir-me-ão. Isto da subjectividade é como o caramelo, agarra-se aos dentes, neste caso à língua das pessoas, e aparece a propósito de tudo e de nada. Ou seja, ficamos na mesma.
Durante o tal debate a Paula Moura Pinheiro leu o notável documento fundador dos Estados Unidos da América, a Declaração de Independência, onde, em 1776 ficou consagrado o direito à BUSCA da felicidade. Ao contrário do que muita gente diz, parece que no espírito dos pais fundadores, estava mais a busca do que a felicidade propriamente dita, que provavelmente lhes soava a utopia. O que lá está escrito é: (…) unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness.
Ora isto da felicidade a mim também me soa a utopia. E a vocês?
Nas últimas décadas tem sido óbvia a ênfase, propalada em livros, revistas, jornais e media em geral, na quase obrigação de se ser feliz.
Tem de se ser bonito, jovem, inteligente, atraente, com sucesso.
Se não, é-se infeliz. Está-se condenado à infelicidade.
Que mentes pós-modernas terão decretado isto? Como é que chegámos aqui? Não admira que tanta gente se sinta infeliz sob o diktat da "felicidade ao alcance de todos". E nós, psis, sabemos isto melhor do que ninguém. É-nos tão familiar esta queixa.
Está aberta a discussão.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

II Fórum Internacional de Psicologia Clínica


Nos próximos dias 9 e 10 de Fevereiro de 2007 a Sociedade Portuguesa de Psicologia Clínica vai realizar, no Anfiteatro da Biblioteca Nacional de Lisboa, o II Fórum Internacional de Psicologia Clínica subordinado ao tema Psicologia Clínica e Psicoterapia Dinâmica: Desafios Actuais. Os interessados poderão inscrever-se no site da sociedade.
www.sppc-pt.com

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Sonho - essa ferramenta

"Por que deixar uma ferramenta como os sonhos enferrujada?
Por que deixar a caixa fechada, quando é um presente que nos foi dado?
Um presente com poderes que podem alterar nossas vidas."

Richard Bach

Desde a Antiguidade vemos o interesse pelos sonhos, na Sociedade Egípcia, na Grécia Antiga, de Platão, a Aristóteles até Artemidoro que colocou um carácter interpretativo e relacional nos sonhos, remetendo para uma concepção algo inovadora, apesar de os relacionar muito com o mítico e o profano.
Mas é com o pai da Psicanálise que os sonhos ganham uma relavância extrema. Freud, em seu livro, A Interpretação dos Sonhos esquematiza os sonhos por temas, relaciona-os com a vigília e o conteúdo do sonho, e atribui-lhes a possibilidade dum método científico.
A teoria dos sonhos, como Freud a postulou foi sofrendo alterações, quer pelo próprio, quer por diversos autores, mas o seu contributo foi tão valiosos que é sempre tomado como ponto de partida.
Todo o sonho tem o seu conteúdo, manifesto e latente (aquilo que é relatado, e o seu significado oculto) os mecanismos de trabalho do sonho (deslocamento, condensação...) e mecanismos de defesa.
Os sonhos relacionam-se com a vida do sonhador enredando situações com fortes cargas emocionais, e quando analisados, quando compreendidos, podem enriquecer muito a vida do sonhador, pois oferecem-nos a possibilidade de conhecer as problemáticas actuais de cada indivíduo.
Como nos diz Coimbra de Matos, o sonho assume capacidade diagnóstica e prognóstica, sendo que, por vezes, um sinal de melhoria aparece num sonho, em indivíduos em terapia.

De facto as caminhadas oníricas são sombrias, obscurecidas por diversos elementos, mas, quando rumo à luz, à claridade, põem em acção saberes, recalques de uma vida outrora esquecida, ou tentada a esquecer, aquecendo a nossa alma, fazendo-nos viver e reviver.

domingo, janeiro 14, 2007

Há muito que não sonha..? parte II

Esta parte II surge duma questão pertinente duma nossa leitora.
Quando terminei o post anterior, referi que o facto de sonharmos muito numa noite e nada sonharmos noutra, tinha que ver com o ciclo do sono e a fase em que acordávamos.
Ora, ao longo de uma noite de sono passamos pelos diferentes estádios do sono, e se atendermos que por volta dos 100 minutos de sono entramos no último estádio do sono, o REM, verificamos que este ciclo se repete entre 4 a 5 vezes por noite. Portanto, temos acesso à fase REM várias vezes numa noite.
Como pode acontecer que ao acordar não nos lembremos dessa noite de sonhos?
Não sonhei de facto?
Ou apenas não me recordo dos sonhos?

O que acontece é que não nos recordamos dos nossos sonhos. Quando um indivíduo não sonha, ou seja, não atinge a plenitude do seu ciclo de sono, é porque sofre de distúrbios do sono. Este é interrompido várias vezes e não se completa, daí uma redução da fase REM. Este sim, é um factor que faz influênciar a redução da quantidade de sonhos dos indivíduos e produzir dificuldades de concentração, de atenção...

Numa noite de sono regular existe uma produção onírica "razoável", mas a sua recordação depende do momento do despertar. Se acordarmos logo após a fase REM temos uma plena recordação do nosso sonho, mas se acordarmos numa fase posterior já temos mais dificuldades em recordar. Isto acontece porque as imagens a que temos acesso no sonho remetem para a memória a curto prazo, dissipando-se facilmente.

Post de Ricardo Miguel Pina

Ricardo Miguel Pina escreveu sobre o Diagnóstico Psicológico aqui. Aconselho vivamente a leitura deste post a todos os interessados neste assunto.

O colega chama a atenção dos leitores para um ponto que também me parece fundamental e que raramente é falado abertamente. De acordo com RMP o diagnóstico pode ser útil para o paciente, referindo “Existem muitas pessoas que sofrem acrescidamente pela ignorância daquilo que os afecta. Sentem necessidade de saber. Esse saber confere-lhes, em alguns casos, uma sensação de domínio sobre si mesmos e o que os afecta, o que é de inolvidável valor terapêutico. Assim sendo, se o clínico julgar a priori benéfico para o paciente dar-lhe conhecimento do nome daquilo que o afecta, ele deve fazê-lo.”. Concordo com esta posição. Penso que existe da parte dos clínicos alguma tendência para verem os seus clientes/pacientes como pessoas que têm que ser protegidas do conhecimento do seu diagnóstico. Considero que na maioria das vezes esta atitude promove a infantilização do paciente e é sustentada pelo desejo inconsciente do psicólogo/psicoterapeuta se superiorizar face ao paciente.

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Há muito que não sonha...?


É frequente dizermos que há muito que não sonhamos, ou que durante uma altura sonhamos muito, mas que depois existe outra em que nada sonhamos.
Mas será mesmo que sonhamos muito nuns dias e muito pouco nos outros?
Mediante estudo polissonográfico podemos definir o padrão do sono e perceber que este oscila entre ondas lentas, rápidas, alfa e teta, oscilando entre várias fases que vão desde o estado de vigília até ao sono profundo. Estas fases dividem-se em quatro que correspondem à fase NREM (no rapid eyes movements) que vai desde o estado de vigilia ( fase 1 e 2) até ao sono profundo (fase 3 e 4) mais o sono paradoxal que corresponde à fase REM (rapid eyes movements), onde sonhamos por excelência.
Nesta fase são activados uma série de circuitos, assim como uma torrente de emoções, todos ao serviço dos sonhos. Existe ainda uma "limpeza" da informação que deixou de ser importante, bem como a passagem da memória a curto prazo, para a memória a longo prazo. Aqui o limiar do despertar é extremamente alto.
Existe uma diminuição do tónus muscular assim como a presença de movimentos oculares rápidos (REM), correspondendo à fase em que o corpo está paralizado, mas a mente activa.
Poder-se-á dizer que no estádio 3 e 4 do sono o indivíduo encontra-se numa fase de reparação física, cabendo ao sono paradoxal a recuperação mental e psicológica.
Todos estes estádios estão presentes ao longo do sono, repetindo-se num ciclo que dura entre 90 a 120 minutos. O sono paradoxal ocorre cerca de 100 minutos após o adormecimento, tendo uma ocorrência total, no ciclo do sono, de 29%.
O facto de sonharmos muito numa noite e nada sonharmos em noites seguintes, tem que ver com este ciclo do sono e com a fase em que acordamos.