Mostrar mensagens com a etiqueta Dissociação. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Dissociação. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, novembro 20, 2014

Descubra aquilo que uma outra parte de sí não lhe quer revelar


O caminho para a verdade interior é um caminho longo, que leva toda uma vida a ser trilhado. É um caminho repleto de auto-ilusões e auto-boicotes, onde as verdades profundas interiores se desvendam, umas vezes subitamente, outras vezes a custo de muitos anos de trabalho.
  
Tanto para o peregrino (o paciente) da psicoterapia psicanalítica ou da psicanálise, como para o seu guia (o psicoterapeuta), cada sessão é um passo em direção a uma nova e mais profunda verdade interior, onde cada verdade desvela novos caminhos e sinuosidades. 

Que verdades interiores serão essas que dentro de si, leitor(a), esperam ser desvendadas?

Será esse um caminho que se atreverá a trilhar?

E como imagina que poderia ser o seu guia? 

Talvez lhe surja subitamente a imagem de alguém verdadeiramente interessado em conseguir ajuda-lo(a), que respeitaria pacientemente a sua necessidade de caminhar ao seu ritmo, procurando ao mesmo tempo encorajá-lo(a) a dar o próximo passo e demonstrando estar lá para si enquanto luz orientadora para quando se sentisse perdido(a) ou ajudando-o(a) a levantar-se depois uma queda…?

Talvez lhe surja a imagem de alguém que o(a) achará pouco interessante, que sentirá pena de si, ou que o(a) fará sentir-se envergonhado(a) ou culpado(a) pelas suas angústias, aproveitando cada oportunidade para acentuar a sua culpa e vergonha…? Ou talvez alguém que de um modo ou de outro acabará por desiludi-lo(a)…?

Será que perceber que tipo de guia surge na sua fantasia pode ser por si só um importante início ou um mergulho em profundidade sobre si mesmo(a)… 

Auto-ilusões e auto-boicotes, juntamente com um mundo interior inconsciente ou dissociado, misturado ainda com aquilo que não pode ainda ser pensado – o que depende do amadurecimento do aparelho de pensar - configuram muitas vezes angústias, medos e ansiedades, sintomas e psicopatologia. São sinais de um mundo interior que não está ou não pode ainda tornar-se cogniscível.

Ficam aqui mais algumas “perguntas-guia”:

1. Imagine que alguém escreve uma notícia sobre si.

a) Quais as 3 coisas que jamais iria querer que fossem ditas sobre si?

b) Serão essas coisas verdadeiras?

c) Se não o são, será que ao longo da vida e através das pessoas de quem se rodeou, dos seus familiares e dos seus amigos, foi aprendendo que essas eram o tipo de coisas que as pessoas não deveriam ser, e logo rejeita-as hoje em si?

2. O que é que o(a) irrita mais nas pessoas (atitudes, comportamentos, aspetos de personalidade, etc)?

3. Sente ansiedade quando está no meio de pessoas, seja na rua, na escola, no trabalho, etc., e/ou procura mesmo evitar em maior ou menor grau contactos sociais? Imagine que se coloca nos “sapatos” dessas outras pessoas ao olhar para si, o que estariam essas pessoas a ver sobre si ? Como surge você perante o olhar e a apreciação dos outros e o que sentem esses outros em relação a si? E aqueles que lhe são mais próximos, os seus amigos, companheiros e sobretudo os seus familiares?

Nem todas estas perguntas garantem revelações, como nem todas estas perguntas podem ser de fácil ou rápida resposta. Quiça possam agitar algo dentro de si...

sexta-feira, maio 23, 2014

Águas de Um Lago Interior


Dentro de cada um de nós existe um lago...

Esse pode ser um lago de águas calmas e cristalinas, de águas turvas e agitadas, ou até de águas poluídas. Pode ser um lago mais vazio ou em vias de extinção, ou mesmo a reminiscência de que outrora um lago ali existiu. Esse lugar pode ainda ser o lugar de uma paisagem assombrada, inóspita e acidentada, que jamais acolheu qualquer tipo de águas ou formou noção do que acolher algo semelhante poderia ser.

O lago interior toma forma a partir do que dentro de nós existe, e em que circunstâncias isso existe - de que forma e em que estado. Retrata quer a dança harmoniosa e a parceria cooperante, quer a luta afincada e a irremediável reconciliação entre os mais variados aspetos que habitam dentro de nós, ou entre os vários lados de um mesmo aspeto. O lago interior é também o que lá foi depositado pelo outro e o que se fez com isso. È o próprio observador que observa e a condicionante que o condiciona, na forma como ele é, como se sente e como se percebe perante si mesmo, perante o outro, no mundo e na relação. È a harmonia e/ou desarmonia entre tudo isso.

O lago de águas calmas e cristalinas cativa o olhar contemplativo e curioso, o olhar que varre a superfície das águas espelhantes e transporta para o íntimo de quem observa o sentimento do sereno e do sublime.

À luz do sol, o lago cristalino convida o mesmo olhar ao mergulho quase que irresistível na intimidade das suas águas. Elas aliciam pelo privilégio de poderem ser atravessadas e reconhecidas na sua translucidez resplandecente e nas formas, feitios, cores e movimentos que se revelam nas suas profundidades. Assim, o lago de águas cristalinas desvela a sua identidade.
As águas calmas ilustram harmonia, formam a unidade espelhante em que se converte a superfície de um lago, que retrata então fielmente o “lá fora” envolvente, e sem distorção devolve-lhe a sua beleza. Ou a sua fragilidade, pois águas calmas não distorcem, não mentem, apenas refletem.
O lago de águas turbulentas não forma o reflexo do circundante à sua superfície. Águas agitadas não criam condições para mais que formas abstratas, distorções daquilo que é. O que nestas águas habita fica ofuscado pelos choques de correntes e contra correntes internas. Outras vezes águas turbulentas significam mudança, e trazem consigo a promessa de algo novo, de diferente, de necessário.
O lago de águas turvas, poluídas (muitas vezes agitadas)... Pouco capaz de se olhar e se reconhecer como de facto é, tampouco consegue purgar o agente corruptor das suas águas. O agente oculto e que se oculta, deixado pelos rios que noutros tempos ali desaguavam (e que algumas vezes também deixavam coisas boas), perpetua atrocidades sobre as águas do lago, sobre tudo o que elas acolhem e sobre tudo o que as rodeia - a própria paisagem e natureza em que se enquadram. Incapazes de se auto-filtrarem, as águas vêem-se transmutadas para o inóspito. Para a ele sobreviver, dividem-se (toscamente), convencem-se que não sao elas mas sim os outros lagos e rios que detêm tudo aquilo que de mais deplorável existe nelas. E assim, convencidas da sua limpidez, julgam e desprezam na crença mais que convicta (não fosse por ventura surgir a dúvida aterradora!) de que é o alheio que alberba todos esses aaspetos e agentes repudiáveis e vergonhosos que, na ilusão, não lhes são próprios, nem jamais lhes puderam alguma vez ter pertencido ou podem vir a pertencer. Agitado e sob ameaça incogniscivél, o lago ergue massivas comportas internas e corta ligações com as suas fontes.  E assim o lago irá secar, até não sobrar senão um solo marcado por poças disformes de água estagnada.
Na fuga a ele próprio e na procura de um lugar para existir, alguns lagos cosneguem ainda  juntar-se a outros lagos, mutias vezes por afinidades ou complementaridades quase que intuitivas, não entre águas, mas entre agentes de poluição e corrupção interior.

Aqueles mais turvos e poluídos são por vezes os que se convencem e se passam como os mais límpidos e cristalinos. Ponderar que pudessem alguma vez precisar de rio algum ou do que estes lhes pudessem oferecer é pura heresia - e ai do rio que se julge maior que eles! Muitos são já poças de água tão pequenas, tão secas e tão ameaçadas de estinção que se mascaram de grandes e ilustres rios (e até oceanos), para não perceberem a dor da necessidade ligada à falta da fonte ou do rio disponível e provedor. Mascaram-se porque receiam abrir as suas comportas a qualquer tipo de correntes externas - o derradeiro perigo.

Diogo Gonçalves
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta