sábado, abril 21, 2007

Os tempos que correm

Aconteceu-me hoje uma coisa curiosa e que me deu que pensar. Recebi um mail duma leitora deste blog, assinalando que eu no meu último post tinha escrito arrasador com z, e não com s. Tem toda a razão e aqui fica a correcção, acompanhada de um mea culpa. Registo também que ela teve a delicadeza de me dirigir um mail pessoal, e delicadeza é algo que vai escasseando.
E fiquei a reflectir sobre este fenómeno, o dos erros de ortografia. É claro que eu podia arranjar aqui várias explicações, provavelmente todas elas verdadeiras: confusão com arroazado (esse sim, com z), uma redução da obsessividade no meu carácter, fruto de anos de análise didáctica (o que, paradoxalmente, não deixa de ser um bom sinal – noutras áreas da minha vida, claro, não na ortografia; obrigada ao meu analista!), leituras quase sempre, de há uns anos para cá, noutras línguas (por causa do doutoramento), pressa, alguma negligência, quiçá (o que é mau).
E isto da pressa, da correria, fez-me lembrar um livro que tenho andado a ler nos intervalos das leituras académicas e que aconselho vivamente: “A corrosão do carácter”, de Richard Sennett (está traduzido em Português na Terramar). É um ensaio sobre o significado do trabalho hoje em dia, a efemeridade dos empregos, a falta de ética, a superficialidade das relações que se vão criando, a dificuldade de construção de uma identidade, a ansiedade em relação ao tempo, a confusão e a sensação de frustração decorrentes da maior parte das situações profissionais.
O autor, que é sociólogo e é professor universitário em Inglaterra, levanta uma série de questões interessantíssimas sobre as quais vale a pena pensar a sério. Tanto mais que muitas das queixas que ouvimos dos nossos pacientes (pelo menos é o que se passa comigo) estão ligadas a estas questões e só ganhamos em perceber o que é que está a acontecer nesta matéria.
É claro que em relação à escrita, a net também não tem ajudado nada. Escrevem-se mails e posts a correr, fora de horas, tem de se escrever o que se quer dizer em meia dúzia de linhas para que as outras pessoas tenham tempo de ler, os assuntos nascem e morrem em dois ou três dias (a tal efemeridade). É um bocadinho angustiante, não é? Gostava de conhecer a vossa opinião.

7 comentários:

Cisco disse...

Olá Clara! Sua chamada de atenção em boa hora! O Povo precisa! Sem querer estender-me demasiado só queria lembrar que funcionamos um pouco como "o Povo com governo ou sem governo", querendo dizer que quando não existe governo, só pode existir a anarquia com alguma organização, ou desorganização total como podemos ver em certos Países, e também nos ditos civilizados nas alturas das catástrofes, em que muito boa gente aproveita para pilhar, etc. Quanto a nós pessoas individuais, seria tão bom que elegêssemos um governo para as nossas próprias consciências, para que este possa conduzir a miríade de vozes que se levantam todos os dias cá dentro, consoante as diversas situações, e que cada um denós possa ser quem é, acabando com a vida de faz de conta, aceitando todos como são, sendo aceite como é, aprendendo a viver com o que tem, confiando que de nada mais precisa do que o elementar, e respeitando a sua própria integridade psico física, dando exemplo e podendo respeitar os demais. É muito simples, usar a técnica de aplicar o Amor universal, a Verdade em tudo o que se faz, e a Justiça de mãos dadas todas as vezes que fôr requerido para dar "postas de pescada" a alguém. Um grande abraço a todos, e que possamos cada vez mais olhar para o espelho e ver aquela pessoa linda, a que é, o ser inteligente com tanto poder para vencer tudo na vida, bastando QUERER, sob as regras atrás descritas preferencialmente!

Clara Pracana disse...

Verifico agora que escrevi, neste meu post, "arroazado" e não "arrazoado". Parece que não acerto uma! Mas espero que os leitores tenham percebido o principal do meu arrazoado.

A sv fala de um governo para as nossas próprias consciências. Desde que a gente as tenha...E respeito pelos demais, também concordo. E para isso não precisamos de estar todos de acordo em tudo.

maria inês disse...

óptima sugestão, adaptadissima aos dias de hj. Fiquei bastante curiosa, o pior é que com a falta de tempo, vai ser mais um livro a ter que tirar senha e ir para a fila da pilha de livros e artigos a ler... E mais tempo não se arranja?

Custom disse...

Confesso que também sou adepto da utilização correcta da das regras de ortografia e gramática, mas também observo os comportamentos e como se têm vindo a alterar em função dos ritmos impostos pela sociedade, no emprego, nas relações, até nas horas vagas que deveriam servir para desacelerar um pouco o ritmo. A educação, o civismo, as regras e o conhecer e viver bem com os outros não é sinónimo de falta de produtividade. Tanto quanto sei, e não sei mais porque não pesquisei por falta de tempo :), existe um movimento "slow food" que se expande para uma forma de vida "slow" e tem bastante êxito.http://www.portaldafamilia.org/artigos/texto071.shtml

Boas escritas

Ana Paula Sena disse...

Gostei imenso do seu texto. Chama a atenção para questões das mais importantes, hoje. E foca essa angústia que eu sinto de ser tudo muito a correr. De às tantas ficar tudo muito superficial por não termos tempo para abarcar tudo. De na pressa de e-mails e comentários, deixarmos de escrever com certo rigor. Mas perdoo-lhe o tal erro. :) Quem não os dá, volta e meia? Do que li, escrito por si, testemunho o seu excelente uso da nossa língua materna.
Foi um grande prazer passar aqui pelo blog. Continuem com o óptimo trabalho!
Ana Paula

Cleopatra disse...

claro que em relação à escrita, a net também não tem ajudado nada. Escrevem-se mails e posts a correr, fora de horas, tem de se escrever o que se quer dizer em meia dúzia de linhas para que as outras pessoas tenham tempo de ler, os assuntos nascem e morrem em dois ou três dias (a tal efemeridade). É um bocadinho angustiante, não é? Gostava de conhecer a vossa opinião.
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Não se preocupe Clara..todos damos erros.
Eu gostava era de perceber porque é que ultimamente com 48 anos dou erros.
Eu que era aluna de 16 a Português e 19 a História...POis..
A matemática é que eram elas...Mas os erros não são matemáticos.
Não encontro explicação para isto uma vez que depois, passados alguns meses,...apenas alguns meses... dou com eles!!

E que vergonha!!!

inbetween disse...

Clara Pracana??? Este fim-de-semana o meu filho deu-me um livro teu sobre a culpa, pois tinha ido ao lançamento do mesmo...e eu...olhando para o teu nome, pergunto: és tu a Clara Pracana, Liceu Dona Filipa de Lencastre, anos 60, Av Manuel da Maia???? Confirma-me, se faz favor, pois tinha muita piada....
Desde já um abraço!