Uma relação longa é uma relação em transformação. E é natural que o nível de satisfação também varie com o decorrer dos anos de convívio. A vida sexual não é imune a isto. Num mundo em constante aceleração, por vezes torna-se difícil o casal conseguir dedicar espaço e tempo da sua vida ao erotismo. Mas é importante lutar por isso. A bem do desejo e da relação.
Fernando Mesquita é psicólogo clínico e sexólogo e explica-nos que "é esperado que existam variações de desejo sexual ao longo do ciclo de vida de um casal". É frequente no início da relação, os casais sentirem uma vontade enorme de fazer amor em qualquer oportunidade. No entanto, diz-nos, "com o passar dos anos verifica-se, em muitos casais, um maior desinvestimento na componente sexual. Corre-se assim o risco de o desejo sexual ficar submerso pelas questões do dia-a-dia, como as contas para pagar ou a educação dos filhos".
O psicólogo explica-nos que os problemas no desejo sexual podem ter três origens diferentes: fisiológicas, psicológicas ou diádicas (ou seja, dizem respeito aos dois elementos do casal).
Entre os fatores psicológicos encontram-se questões tão distintas como uma baixa autoestima, o cansaço, a ansiedade, o stress do dia-a-dia, a depressão e tabus ou crenças que possam condicionar a relação de um com a sua sexualidade.
Em entrevista ao MSN Saúde, Ana Carvalheira, psicóloga e antiga presidente da Sociedade Portuguesa de Sexologia Clínica, adiantava-nos as conclusões de um estudo que envolveu 4 mil portugueses, a propósito da sua vida sexual. Quando se questionou sobre os principais condicionantes ao desejo sexual entre os homens portugueses, o stress profissional e cansaço surgiam nos dois primeiros lugares, com as questões relacionais a serem referidas em terceiro lugar.
Estas questões relacionais fazem parte daquilo a que Fernando Mesquita designa como fatores diádicos. E neste caso podem encontrar-se questões como o desgaste da relação, a ausência de partilha de afetos, dificuldades comunicacionais ou conflitos não resolvidos na relação, a monotonia, a perda da atratividade pelo/a parceiro/a, que pode decorrer de mudanças físicas, entre outros.
Como vimos, o tempo de relação e a idade são fatores que devem ser tidos em conta. Mas convém evitar assumir generalizações. Como nos explica Fernando Mesquita, mesmo após a menopausa «algumas mulheres chegam mesmo a experienciar uma melhoria na vida sexual, pois não receiam uma gravidez indesejada e, geralmente, os filhos já saíram de casa, o que lhes permite estar mais "à vontade"».
Fernando Mesquita esclarece que não há diferenças significativas, entre homens e mulheres, quanto ao apetite sexual no período de paixão. No entanto, nas relações a longo prazo verifica-se por vezes uma diminuição da iniciativa sexual, nas mulheres, após o aparecimento dos filhos. Atualmente, ainda são a mulheres quem apresenta uma maior incidência de queixas devido à diminuição do desejo sexual. Ainda assim, tem-se verificado um aumento no número de homens que procura ajuda por este problema.
A satisfação de um casal (uma relação feliz, se preferirem) é, sem dúvida, um conceito subjetivo. Implica a forma como os nossos desejos e necessidades são recebidos pelo outro. Mas também o que somos capazes de dar ("Dar e Receber / Devia ser a nossa forma de viver" já cantava António Variações).
O desejo sexual é uma questão complexa. Pode até ser mais flutuante nas mulheres do que nos homens, mas o desafio existe para os dois membros do casal. Erroneamente, alerta Fernando Mesquita, "muitas pessoas pensam que a diminuição de desejo sexual é sinónimo de falta de paixão ou amor".
Não existem receitas absolutas. Mas existem conselhos imprescindíveis. A comunicação deve ser prioritária. É com ela que vamos conhecendo o outro. E no que ao desejo sexual diz respeito, é importante uma espécie de back to basics: como nos diz o psicólogo, deve-se "encarar o sexo como uma forma de ter e dar prazer". E a partir daqui temos muito que podemos fazer.
O desejo e o erotismo apreciam sempre alguma novidade. Daí que seja importante variar a vida sexual. "O casal deve partilhar fantasias e conversas que estimulem o desejo sexual", aconselha o psicólogo. "É importante que se recordem que podem haver interesses sexuais diferentes e que a razão não pertence exclusivamente a um dos elementos do casal".
A este propósito, Fernando Mesquita adianta ainda que "diversos estudos têm mostrado que a capacidade orgástica das mulheres está relacionada positivamente com um relacionamento mais afetivo com o companheiro e com a prática da masturbação".
A não obrigatoriedade do coito pode também por isso ser útil em certos momentos. A sexualidade não é apenas o momento da penetração. Não é uma questão de mecânica a precisar de afinação. Numa relação longa, a sexualidade depende de toda a envolvente. E pode começar numa simples carícia pela manhã, continuar com a conversa à hora de jantar, antes de chegar aos lençóis da cama.
Fernando Mesquita sugere mesmo que os casais "estipulem que pelo menos um em cada cinco encontros sexuais não há penetração para que tenham prazer doutras formas". É uma forma de variar a vida sexual, sem ter receio de "brincar" com a própria intimidade do casal.
A prática de exercício físico também não deve ser descurada. O exercício físico, além dos efeitos físicos que facilmente sentimos, aumenta também os níveis de energia e, consequentemente, a autoestima e o desejo sexual. O mesmo se aplica a uma alimentação equilibrada, que fortaleça a líbido.
E caso o problema seja mesmo a diminuição da atracão pelo/a parceiro/a, Fernando Mesquita aconselha os membros do casal a procurar identificar o que levou a essa diminuição, para que o problema possa ser trabalhado em conjunto. O que também nos recorda do ponto fulcral que um casal tem de desenvolver, para defender a própria relação: a comunicação.
É certo que já existem fármacos que podem ajudar. Mas na química do amor há mais a ter em conta do que a simples resposta física. Daí que o psicólogo faça questão de recordar a utilidade da terapia conjugal/sexual.
E o maior erro que se pode cometer é deixar adiar o problema, esperando que o tempo o resolva. É um passo em falso porque no que ao desejo diz respeito, o tempo nem sempre é bom conselheiro. "Os casais cujos conflitos conjugais são mais recentes são aqueles que tendem a apresentar melhores resultados na terapia conjugal", recorda o psicólogo.
Acima de tudo, é importante ir quebrando os receios e pequenas vergonhas que muitas vezes nos limitam. E isto diz respeito não só ao desejo sexual, mas também à disponibilidade para procurar ajuda. Porque se é de amor que se trata, se é o que se deseja, vai valer a pena.