Esta semana saio do formato habitual da Infância e partilho alguns dados e reflexões desenvolvidos num trabalho que realizei há tempos, no âmbito da minha formação em Neuropsicologia: "«Este país não é para velhos»- Reflexão sobre os cuidados de saúde prestados aos idosos. Propostas para um envelhecimento saudável".
Segundo um estudo do Instituto
Nacional de Estatística, em Portugal a proporção de pessoas com 65 ou mais anos
duplicou entre 1960 e 2005, passando de 8 para 17% do total da população,
prevendo-se que volte a duplicar e a atingir os 32% em 2050, numa tendência
contrária à dos nascimentos e da população jovem. O estudo indica ainda que daqui
a 40 anos o Índice de Envelhecimento ascenderá a 243 idosos por cada 100
jovens.
Os progressos conseguidos pelo
desenvolvimento, em geral, e pelas ciências da saúde, em particular,
contribuíram significativamente para o aumento da esperança média de vida. Este
aspeto e as mudanças culturais, económicas, sociais e profissionais associadas
ao casamento e à constituição de família têm contribuído para o envelhecimento
da população. Este aumento da longevidade causa um grande impacto na saúde
pública, obrigando a uma reflexão sobre os cuidados prestados aos idosos. O
envelhecimento saudável, autónomo e independente, pelo maior tempo possível, será
um desafio individual e coletivo, com grande responsabilidade social.
A realidade mostra-nos que,
apesar dos enormes progressos da medicina, os últimos anos de vida são
acompanhados pelo aumento de situações de doença e incapacidade, frequentemente
suscetíveis de prevenção.
No processo de envelhecimento
existe uma lentificação da condução nervosa, sendo a perda de memória um dos
aspetos mais consistentemente associados ao envelhecimento normal. É uma das
principais queixas nos idosos e pode afetar seriamente a qualidade de vida.
Contudo, sendo uma perda “normal” do envelhecimento, este tipo de queixas é
muitas vezes desvalorizado pelos profissionais de saúde. Havendo alguma
alteração cognitiva, deve o profissional de saúde ter a sensibilidade de
suspeitar de um quadro demencial, mesmo em fase inicial, para que se possa
proceder a condutas mais adequadas, ao nível da avaliação e da intervenção, no
sentido de preservar a capacidade funcional e a autonomia por mais tempo.
A prevalência da demência aumenta
de 1% aos 65 anos para 30% aos 85. A prevalência de acidente vascular cerebral
aumenta de 3% para 30%, respetivamente, sendo uma importante causa de morte e
de séria deficiência na União Europeia.
Quanto mais o médico se antecipar
à demência maior será a oportunidade de melhorar consideravelmente a vida do
paciente e das pessoas que o cuidam. Considerar as perdas cognitivas e de
autonomia como algo normal e expectável do envelhecimento, acarreta custos
significativos para o indivíduo, para a família e para a sociedade.
A depressão do idoso é também uma
condição a ter em conta. A perceção da perda de funcionalidade, a morte do
cônjuge ou de outras pessoas próximas, o sentimento de proximidade da própria
morte, a solidão, o sentimento de incompreensão por parte dos outros ou de
desadequação ao meio, são aspetos que comportam uma grande carga emocional que
podem conduzir a quadros depressivos que reduzem a autonomia. Estes quadros,
por vezes, assumem características semelhantes às da demência, podendo levar a
diagnósticos errados e intervenções médicas desadequadas.
A neuropsicologia desempenhará um
papel crucial nos cuidados primários do envelhecimento, tanto ao nível do
envelhecimento normal, como do patológico. A reabilitação cognitiva é uma
abordagem que ajuda as pessoas com limitações cognitivas a trabalharem
conjuntamente com os profissionais de saúde na identificação dos objetivos mais
relevantes e na planificação das estratégias para os atingir. As investigações
indicam que os participantes que iniciaram o treino mais cedo manifestaram
benefícios mais consistentes e mais duradouros do que o grupo que usufruiu do
programa de reabilitação mais tarde, ou seja, numa fase mais avançada das
alterações cognitivas.
Alguns estudos permitiram
constatar que pessoas que participam em atividades de lazer cognitivamente
estimulantes (leitura, jogos de tabuleiro, tocar instrumentos) têm um menor
risco de desenvolver demência. Deste modo, abordagens baseadas na cognição
poderão prevenir ou atrasar a progressão do processo demencial.
O envelhecimento é uma questão de saúde pública, tendo os programas de reabilitação de pessoas idosas uma forte componente psicossocial.O reconhecimento precoce das
alterações na funcionalidade do idoso poderá evitar ou retardar a sua
dependência de familiares, a institucionalização em lares, ou a necessidade de
acompanhantes permanentes.
Alexandra Barros
Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta
Pós-Graduada em Neuropsicologia
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