O Pai Natal é provavelmente a
personagem culturalmente mais difundida, sendo difícil contrariar a crença
espontânea da criança nesta figura.
É frequente os pais
questionarem-se sobre se devem ou não promover esta crença e até quando. É
igualmente habitual a discussão sobre o certo ou errado de mentir à criança.
Alguns especialistas referem que
promover esta crença é uma mentira que pode pôr em causa a confiança da criança
nos pais e que, por outro lado, abre precedentes uma vez que os pais são o
modelo e, se os pais mentem, a criança também pode mentir. Por outro lado, é
referida a possibilidade de vivências traumáticas face à desilusão da descoberta
da verdade.
Entre os 3 e os 7 anos, as
crianças utilizam o pensamento mágico, sobretudo quando as suas expetativas são
comprometidas. Há quem defenda que o Pai Natal não faz parte do imaginário
espontâneo da criança, uma vez que é imposto pela cultura e pelos adultos, pelo
que a “mentira” seria indesculpável. Deste modo seria mais aceitável “brincar
ao Pai Natal” em vez de acreditar no Pai Natal.
Como em quase tudo na infância,
penso que o importante é seguir a criança. As crianças criam as suas próprias
fantasias independentemente das criações do adulto e até aos 7 anos será
difícil desviá-la da atração simbólica do velhote de barbas brancas. Da mesma
forma que depois desta idade será difícil distraí-la das inconsistências que
vai detetando à medida que o seu raciocínio lógico se instala. Para além do
questionamento individual que vai fazendo, vai também sempre existir uma
criança cuja fantasia natalícia foi contrariada e que fará a revelação: “o Pai
Natal não existe”.
Eu defendo que as crianças devem
acreditar no Pai Natal (e na Fada dos Dentes!) e que devem descobrir a
realidade por si próprias. Há formas de conduzir esta fantasia, sem uma mentira
explícita, respondendo às questões da criança com outra questão “O que é que tu
pensas sobre o Pai Natal?”, mais do que com explicações complexas e elaboradas
sobre a sua existência ou não.
É verdade que as crianças podem
ficar verdadeiramente desiludidas quando descobrem a realidade, mas também é verdade
que a verdade, os valores, a confiança, a segurança são transmitidos e
solidificados ao longo de 365 dias por ano. E se estas bases forem sólidas, não
será uma fantasia que dura no máximo um mês que vai pôr em causa a integridade
emocional da criança.
É claro que há alguns fatores a
ter em conta. A ideia de que alguém pode entrar em casa pela chaminé pode ser
assustadora, pelo que é importante assegurar que tal só acontece com a
autorização dos pais e que mais ninguém, em mais nenhum dia, pode lá entrar.
Parece-me que mais aterradora é a
tentativa muitas vezes forçada de obter uma fotografia com a criança sentada ao
colo do Pai Natal. Uma coisa é aquela figura simpática dos livros e dos filmes,
outra coisa é a confrontação com um “gigante” de barbas. Se a criança revela
sinais de desconforto, força-la a este encontro é que pode ser traumático. A
propósito deste aspeto, quando vejo crianças aterrorizadas ao colo do Pai
Natal, penso muitas vezes numa possível resposta a uma ameaça habitual que os
pais fazem: “se te portas mal, vem aí o homem do saco (ou o velho)”.
Parece-me que as práticas diárias
terão muito mais influência na forma como a criança lida com esta fantasia e
com a descoberta da realidade, do que propriamente a construção da fantasia em
si.
Alexandra Barros
Psicóloga Clínica/Psicoterapeuta
Diretora do Departamento de Infância
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