“O que é uma relação psicoterapêutica?”, “Como
saberei se a tenho ou já a tive na minha vida?”, “Porque preciso dela?”. São
estas as questões que organizam a nossa presente comunicação.
Relações há muitas. Relações mais íntimas
ou mais superficiais, mais gratificantes ou mais frustrantes, mais sanígenas ou
mais patogénicas, mais livres ou mais inescapáveis.
Aquela que verdadeiramente nos interessa
aqui é a relação sanígena, que alberga em si verdadeiro potencial
psicoterapêutico. É a relação com capacidade reparadora, desbloqueadora e
promotora do desenvolvimento (inter-)pessoal e da criatividade. Relação suficientemente boa, vivida plena e atempadamente
para alguns, mas não para outros. Para alguns a realidade é a de falha desta relação,
a de uma relação desajustada, insuficientemente vivida e precocemente perdida.
Ou mesmo, o desconhecimento total desta relação.
Muitos de nós enquanto adolescentes e
adultos continuamos (consciente ou inconscientemente) em busca desta relação,
de forma mais intermitente ou mais incessante, na fantasia e na prática, de
forma mais concreta ou mais abstrata. É frequente confundi-la, mistura-la com,
ou procura-la em, outros tipos de relações, as quais com alguma frequência se transformam
sistematicamente em relações insatisfatórias, conflituais e inscritas num ciclo
repetitivo de más relações que mais parecem ilustrar a crueldade do destino ou
o tormento de um mau karma.
Compreensão e apoio emocional. Estes são
dois dos mais vitais “nutrientes emocionais” que enquanto seres humanos
procuramos nas nossas relações – dado que em certos casos psicopatológicos
tanto a procura daquilo que o outro nos pode dar como a vivencia da dependência
na relação com o outro são aspetos fortemente repudiados, de tal forma
aterradores que fortíssimas resistências psicológicas (presentes por vezes
durante toda uma vida) se colocam ao mero reconhecimento desta necessidade de
depender do outro, de se poder ser e desejar ser cuidado.
A compreensão e apoio emocional, inscritos
numa relação de verdadeira receptividade, envolvimento e preocupação empática,
isenta de critica ou juízos de valor – que pouco ou nada contribuem para o desenvolvimento
da personalidade – permite a experiência profundamente sanígena de nos
sentirmos compreendidos no nosso sofrimento e em todos os subsequentes desenvolvimentos.
Por sua vez, a experiência da compreensão em profundidade da nossa complexidade
e contradição moral, comportamental e emocional permite-nos o acesso à serenidade e à maturidade psicológica, bem como à capacidade de compreensão em
profundidade do outro, e logo, à capacidade de estabelecermos relações mais profundas, genuínas e plenas.
Em condições ótimas a relação aqui
descrita é apanágio das interações entre uma criança e os seus cuidadores
principais durante a infância. Ela ajuda a organizar toda a experiência
emocional do bebé e da criança, o que irá mais tarde influenciar a atitude do
adolescente ou do adulto para consigo mesmo, para com o mundo e para com as
relações, bem como o seu comportamento e a sua capacidade de pensar.
O apoio nesta organização emocional é
bastante importante aquando das etapas maturativas da infância e dos conflitos
emocionais que lhes subjazem. Consoante a maior ou menor elaboração destes
problemas maturacionais em cada um de nós enquanto adultos, o significado
inconsciente das ansiedades e dos problemas emocionais que nos afligem varia
bastante de pessoa para pessoa, o que significa que a experiência desses stressores é diferente de pessoa para
pessoa.
É também por este motivo
que muitas vezes o conselho de um amigo ou amiga, ou mesmo de um cônjuge, não
surtem esse efeito psicoterapêutico pois frequentemente, ainda que bem
intencionados, esses conselhos não estão verdadeiramente dirigidos nem
consideram a forma peculiar da outra pessoa sentir e organizar a sua
experiência emocional. Ainda que os nossos amigos sejam sagrados, por vezes é
preciso ir e procurar mais além.
É ao fim ao cabo esta a relação e a
transformação oferecida pela psicoterapia psicanalítica. Mais que a cura pela
palavra, a psicoterapia psicanalítica é também a cura pela relação.
Diogo Gonçalves
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta
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