domingo, abril 25, 2010

DEPRESSÃO E MELANCOLIA

Já me têm perguntado qual a diferença entre depressão e melancolia, e como se pode distinguir uma da outra.
Não é fácil.
A melancolia pode ser vista como uma depressão agravada, em que o sujeito se retrai de tal modo para dentro de si próprio que se desinteressa completamente do mundo e das pessoas à sua volta. A auto-recriminação constante também é um sinal importante, e que muitas vezes não existe na depressão, pelo menos na mais moderada.
Os psiquiatras usam determinados critérios para distinuguir uma da outra, que constam do DSM. Também é importante ter em atenção se há ciclotimia, ou seja, oscilações de humor muito marcadas, com picos de euforia e baixos com carácter mais melancólico.
Julgo que mais importante que distinguir uma da outra é perceber-se que estes estados mais ou menos depressivos podem estar ligados a uma causa determinada (uma morte, uma perda amorosa, uma situação de desemprego, por exemplo) ou se são endógenos, isto é, parecem nascer de dentro da própria pessoa. Se for o caso, o psicoterapeuta ou psicanalista terá de trabalhar com a pessoa  as perdas na infância mais precoce, às vezes "apenas" uma grande desilusão com uma pessoa muito próxima, que deixou uma marca psíquica de perda de afecto, ou do perigo dela, que pode ser reavivada na actualidade. Acontece que  aquilo que pode ter sido apenas uma contrariedade para uma pessoa, pode ter constituído um enorme desgosto para outra. Cada caso é um caso e a mente humana é de facto um abismo.

4 comentários:

marialascas disse...

Muito esclarecedora a sua descrição. E a neurose em que difere?

Anónimo disse...

Parece-me que existem certas coisas dentro das pessoas que as fazem querer fazer coisas. Que tornam o mundo mais como o conhecemos e menos melancólico. Parece-me contudo que essas coisas variam muito de pessoa para pessoa, e que são muito mais frágeis do que gostaríamos de pensar. Dependem de um extremamente frágil equilíbrio psíquico que pode ser colocado em causa com as mais pequenas coisas. Assim com a homeostase do nosso organismo, que depende de muitos pormenores. Gostamos de hiper valorizar a nossa inteligência, o propósito e a vontade humana, o engenho da humanidade, mas parece-me que se formos olhar de perto somos muito mais frágeis do que gostaríamos de pensar e que por muito que gostemos de derivar das coisas que fazemos e da aparente normalidade em que vivemos uma certa sensação de segurança e permanência, essa tendência tem muito de ilusório e mais a ver connosco do que com as coisas propriamente ditas. Simplesmente temos limites no que fazemos, somos frágeis, dependemos de milhões de micro coisas que não controlamos, e de um momento para o outro tudo pode correr muito mal por coisas que nos são totalmente exógenas.
Logo, na expressão “acontece que aquilo que pode ter sido apenas uma contrariedade para uma pessoa, pode ter constituído um enorme desgosto para outra”, parece-me que a grande lição consiste não em tentar que “tudo se tornem contrariedades para um mundo de gente muito forte e eliminar o desgosto”, mas sim em entender que as coisas frágeis que preservam aquilo a que chamamos "saúde mental" são nos outros totalmente desconhecidas e um grande mistério, mas certamente frágeis, e que nunca sabemos quais as pedras de toque que permitem ao outro viver.
Em algumas pessoas pode ser a coisa mais pequena. Em outras uma coisa enorme. Outras ainda aguentam as piores coisas mais terríveis, mas depois sucumbem a algo simples e que não afectaria os menos resilientes.
Filmes sobre o tópico "pessoas cujas vidas mudam radicalmente".
"O Gosto dos Outros" http://www.imdb.com/title/tt0216787/
"O Sétimo Continente" http://www.imdb.com/title/tt0098327/

Clara Pracana disse...

Marialascas,
Só agora respondo pq infelizmente não me tinha apercebido de que os comentarios não estavam a ser publicados (veja a propósito o meu post de hoje, 1 de Março de 2011).
A depressão aparece normalmente num quadro mais neurótico. Já a melancolia acentuada pode implicar aspectos psicóticos. Tem de se ver caso a caso, porque as generalizações nestas coisa da mente são perigosas, e pôr rótulos nas pessoas ainda mais. Mas já agora lhe digo que de neuróticos todos temos um pouco, em maior ou menor grau. Por exemplo, todos nós nos negamos a ver a realidade, quando nos convém, mesmo que seja por pouco tempo. Todos nós somos ambivalentes, isto é, capazes de odiar e de amar ao mesmo tempo. E mais exemplos poderia dar. Já a psicose é diferente, e mais complicada. E ainda há os estados intermédios, os chamados "borderline".

Clara Pracana disse...

Caro anónimo,
a saúde mental de cada um de nós, é de facto algo de mto frágil, delicado e misterioso. Tb penso assim.
Todos os cuidados são poucos com este delicado equilíbrio. É por isso que temos de estar atentos às coisas da mente com atenção redobrada. Tudo é efémero, é verdade. Mas a intensidade com que se vive uma determinada experiência pode conferir-lhe um peso de anos. É como escreveu o poeta (D. Mourão-Ferreira):
"E por vezes/encontramos de nós em poucos meses/o que a noite nos fez em muitos anos".