O filicídio é o homicídio de uma ou mais crianças por
parte de um ou ambos os pais. Não é tão raro como gostaríamos de pensar e os
meios de comunicação têm ajudado a demonstrar a elevada frequência deste crime
chocante. As notícias invadem-nos a sala, a qualquer hora do dia, sem aviso e
sem tempo para impedir que as crianças, que devem acreditar que os pais lutam
pela sua vida, ouçam o que aconteceu.
Na maioria das espécies, incluindo na humana, existe uma
predisposição para o cuidado e proteção da cria, pelo que se gera de imediato
um sentimento de incredibilidade, choque e revolta naqueles que assistem ao
relato destes acontecimentos. O que falha, então, quando uma mãe ou um pai mata
o próprio filho?
O psiquiatra Phillip Resnick
identificou cinco circunstâncias em que ocorre o filicídio:
- Altruísta: é a circunstância mais frequente em que a
mãe, gravemente deprimida, planeia suicidar-se e acredita que os seus
filhos ficarão mais protegidos “com” ela.
- Psicótico: situação em que o pai ou a mãe, em estado
delirante e paranoide, acredita que algo persegue os filhos e mata para
proteger. Outra situação, enquadrada nesta circunstância, é o delírio paranoide
de que a criança agride e ataca o progenitor, pelo que este matará em
auto-defesa.
- Espancamento Fatal: casos em que a punição física é de
extrema violência e descontrolo, conduzindo à morte do filho.
- Filho indesejado: situações em que, por vários motivos,
o filho é indesejado ou sentido como um obstáculo.
- Vingança conjugal: casos em que um dos pais mata o filho
para magoar o parceiro, habitualmente depois de uma situação de infidelidade.
Acontece também no âmbito da disputa das responsabilidades parentais, em
que um dos pais, não aceitando a guarda atribuída ao outro progenitor,
tira a vida ao filho para que o outro não ganhe a batalha.
Obviamente, qualquer uma das
circunstâncias envolve um elevado grau de psicopatologia. A investigação sugere que são principalmente as mulheres a cometer filicídio, sendo as situações de homicídio por raiva ou vingança mais frequentes nos homens.
Quando surge este
tema e abordo estas questões do ponto de vista da compreensão psicopatológica,
a reação habitual é a ideia de que procuramos desculpabilizar o crime,
obviamente porque o filicídio, mais do que qualquer outro crime, comporta uma
inevitável carga emocional pela dificuldade em compreender o inexplicável.
Mesmo nós, profissionais da saúde mental que conhecemos os processos que estão
por trás de tamanha atrocidade, ficamos perturbados e temos dificuldade em
desculpar um pai ou uma mãe que mata os seus filhos.
O nosso papel será, talvez, alertar
para o que pode ser feito pelos vizinhos, amigos e familiares e o que devia ser
feito pelos serviços de saúde para procurar evitar que episódios destes se
repitam.
Sabia que, na maior parte dos casos,
o filicida dá alguns sinais antes de cometer o crime?
Continuaremos a desenvolver este tema
nas próximas semanas.
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