segunda-feira, abril 14, 2014

Emoções - grandes e pequenas (parte I)

  Este artigo que abaixo partilho remete, de forma clara e simples, para o complexo processo da maternidade e turbilhão de emoções. Em consultório tenho lidado de perto com estas emoções, que ora evocam o que de mais doce e terno existe numa mulher, ora remetem para o seu lado mais "malvado" e "maléfico", desabafou uma mãe.

Mas efetivamente existe uma barreira muito téneu entre o bem e o mal e rapidamente se resvala (quase sem saber porquê...) para o outro lado, e se por vezes algumas mães aprendem a lidar com as suas emoções, outras escondem e reprimem um pequeno fantasma que se torna um monstro imenso.


"Há mamãs loucas. Literalmente tan-tans da cabeça. Calha a quase todas este estado temporário de insanidade e que se lê nos olhos dos maridos, amigos e família. Quando? Logo ali, nos meses após terem dado à luz. Quando dar vida à vida é uma loucura.
Há quem tenha recebido a visita dos Reis Magos para celebrar o nascimento do seu filho. Mas a maioria das mamãs é visitada pelos parentes mais antigos e estimados: os seus fantasmas. De branquinho como manda a tradição, os fantasmas aparecem todos juntos para conhecer o novo bebé. E alucinar a mamã. Começam por apoderar-se do seu corpo que fica aterrador no pós-parto. Depois espicaçam-lhe as hormonas, deixando-a bolsar sentimentos ridículos. Como quando uma pobre mosca entra em casa, feliz da vida, à procura de alimento para as suas mosquinhas; e a mãe, louca e tísica, pum! Mosca esborrachada. Depois, chora como se tivesse assassinado um elefante voador. “Mas quem é que deixou o Dumbo entrar?!”
É um estado de nervoso miudinho intervalado com risadas histéricas. O divertido é que a recém-mamã tanto pode estar a amamentar o bebé com todo o seu amor a transbordar, na mais terna das felicidades; como horas mais tarde, no trabalho, pode estar prestes a pegar na caçadeira para disparar uns tirinhos aos colegas. Ou estar a preparar uma papinha na mais santa das paciências até não sobrar um grumo para o bebé não se engasgar e, de seguida, ir a correr riscar o carro do vizinho, estacionado em cima do passeio, porque “Não me deixou passar com o carrinho do bebé! Seu labrego!”
E só de olhar para estas tresloucadas mães mudamos de passeio, fingimos não ter ouvido a campainha, damos passagem imediata na fila do supermercado. Receamos aquela figura de carrapito descaído e roupas largas, maquilhada com olheiras até ao queixo, e que tanto pode apertar-nos as bochechas e espetar-nos um beijo como aterrar um estalo que nos faz lembrar a louca da nossa mãe, claro.
A loucura não é mais do que uma violenta emoção. E a vida, quando explode, é a maior das emoções. Por isso, é tão fácil entender a loucura maternal: porque a mamã continua a parir todos os dias após o parto. A parir a sua identidade, a parir leite, a parir uma frase a seguir à outra, a parir um sorrisinho, a parir medos e coragens, a parir uma imagem a projectar. Vira alienada. Vira desmemoriada. E uma mamã em construção, enquanto não está pronta, não é bonito de ser ver e o contacto pode até ser perigoso.
Muitas recém-mamãs saem à rua de calças de pijama, verificam a cada cinco minutos se a criança respira, guardam as chaves do carro no congelador e garantem que com um mês a criança já diz "Mamã". E não, não são vozes na sua cabeça. O mundo, e em especial os maridos, é que não as entendem. Apesar de a loucura ser uma palavra feminina.
Mas eis que tudo o que é bom dura pouco. A loucura maternal é, infelizmente, temporária. Acaba por passar pois os fantasmas têm mais visitas a fazer e talvez, lá para o Natal, possam vir de novo dizer "olá". Ou "buuu"!
Eu podia ter-me ido abaixo, cantado o baby blues, dormido uma noite no Júlio de Matos. Mas isso não aconteceu comigo, apenas me visitaram um par de fantasmas tenrinhos. Mas sei que há muitas recém-mamãs assombradas que choram ao verem-se neste imenso palco de loucos sozinhas com os seus bebés. Calma, mamãs. Não se assustem, pois a loucura é um privilégio e uma felicidade imensa. E só quem tem fantasmas é que foi gente."

 http://lifestyle.publico.pt/maeshamuitas/332649_de-mae-e-de-louca-todas-temos-um-pouco

Tânia Paias
Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta
Departamento da Infância (Faro)


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