Este fim-de-semana estive a ver um filme perturbador – Tideland, o mundo ao contrário. O filme tem algumas cenas repugnantes. Começa com a história de uma rapariga de 7 ou 8 anos de idade, Jeliza-rose que vive com os pais, ambos toxicodependentes. A relação que os pais mantêm com a criança retrata, na minha opinião, o drama de muitas crianças que são criadas em famílias toxicodependentes. Há, como o nome do filme indica, uma reversão de papéis, é a criança que tem de cuidar das necessidades elementares da família. É ela que diligentemente prepara as doses de heroína que o pai consome e que o assiste enquanto ele se injecta. A criança nasceu ela própria dependente da heroína, a mãe a certa altura descreve com algum desdém a forma como ela, ainda bebé, recém-nascida, teve que lidar com a síndrome de abstinência.
Os pais, profundamente centrados sobre eles próprios, são ora abandónicos e negligentes ora pseudo-protectores com manifestações de amor que ilustram na perfeição o conceito de vínculo L menos de Wilfred Bion. Jeliza-rose lê para o pai histórias infantis enquanto este está inconsciente, “pedrado”. A mãe morre na sequência de uma overdose e a reacção do pai, atesta a sua incapacidade para lidar com a realidade. Mais tarde, o pai também morre e Jeliza-rose fica ainda mais sozinha.
Sozinha, num mundo de adultos perturbados, Jeliza-rose procura conforto e coragem nas suas fantasias, povoada por 4 bonecas (apenas as cabeças que coloca nos dedos, simulando personagens com as quais interage). Jeliza-rose representa na minha opinião o drama de muitas crianças que não podem contar com os seus pais para as ajudarem e que ficam profundamente sozinhas e à mercê de si próprias e das circunstâncias. Neste filme é possível compreender a força enorme de uma criança muito pequena, que luta pela sua sanidade mental num mundo enlouquecedor.
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5 comentários:
Credo, e logo agora que estou adoentado, mas o filme é ficção, não documentário, certo doutora? O autor Bion me interessa de verdade, se quiser escrever sobre ele de novo, muito grato. Ou sobre qualquer outro, claro.
Passei por aqui e estou a gostar imenso. Obrigada por esta sugestão de filme que vou procurar.
Ana Paula
Tenho que ver este filme!
Às vezes, o que parece ficção não é tão ficção como parece!
Existem crianças que sofrem como esta menina porque as mães não querem saber delas. é o caso de meninas filhas de mães com doenças bipolares e outras doenças mentais!
Infelizmente!
Muito bom o filme. Cenário, figurino, iluminação, elementos vivos da um toque especial as cenas. Os atores excelentes, aliás a atriz Jodelle Ferland (que faz o papel da criança: Jeliza-Rose) esbanja interpretação, que dom!
Para quem gosta de drama e um pouco de ficção (digo um pouco sim, porque hoje em dia infelizmente é a pura verdade incoveniente). Eu como semi-radialista, recomendo!
Vi o filme duas vezes, é realmente perturbador, mas na verdade retrata a realidade de muitas crianças que, criam realidades paralelas de forma a sobreviverem à sua realidade. Não é fácil encontrar o seu verdadeiro eu após esta constante fuga à realidade...
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