sábado, junho 24, 2006

A duração da psicoterapia psicanalítica

Muitos dos meus pacientes sentem-se desiludidos no início das suas psicoterapias e, por vezes, até aborrecidos pela longa duração do tratamento. A maioria das psicoterapias implica um trabalho continuado, com uma ou duas sessões por semana, durante vários anos (habitualmente entre 3 a 5 anos). As psicoterapias psicanalíticas são “tratamentos” que visam a modificação da personalidade em profundidade e isso não se consegue em meia dúzia de sessões nem existem palavras mágicas que possamos ensinar aos nossos pacientes, para que eles rapidamente fiquem bem. Fazer uma psicoterapia psicanalítica em profundidade é um trabalho duro que implica um compromisso sério durante muito tempo.

A velocidade da vida actual torna muito difícil compreender a necessidade de uma relação tão longa e intensa. Muitos dos meus pacientes dizem-me que sou a pessoa que melhor os conhece. Por vezes a psicoterapia dura mais do que o casamento deles e, muito frequentemente, observo o início e o fim de várias relações amorosas.
Estar em psicoterapia é sabermos que temos alguém que nos escuta e que, num certo sentido, vive connosco a nossa vida. É sentirmos que aquilo que somos constitui uma descoberta permanente e que as transformações que sofremos são subtis e que em cada mudança nos aproximamos mais daquilo que verdadeiramente somos. O psicoterapeuta não pretende “moldar” o paciente ou fazê-lo ficar desta ou daquela maneira. Simplesmente está lá, para ouvir, apoiar, estimular o questionamento e ajudar a pessoa a perceber aquilo que ela própria não consegue entender sozinha.

A personalidade muda e a psicopatologia fica atenuada ou desaparece porque esta “nova relação” funciona como um outro olhar que a pessoa tem sobre si própria, um olhar desprovido de censuras, desejos e preconceitos. Lentamente a pessoa abre-se e restaura-se, sarando as suas feridas e procurando novos pontos de apoio para edificar uma “nova” personalidade.

O grau de confiança e, num certo sentido, de intimidade que se gera entre um psicoterapeuta e o seu paciente só pode ser conquistado com tempo e paciência. Para sermos capazes de comunicar o que há de mais privado e profundo em nós temos que confiar muitíssimo no outro, o que demora muito e muito tempo. Precisamos de ter a garantia de que o psicoterapeuta não vai “mesmo” censurar-nos, diminuir-nos, explorar-nos, humilharmo-nos, etc. Só depois de um bom tempo em psicoterapia é que nos “instalamos” verdadeiramente nela.

3 comentários:

Ana Almeida disse...

Visitei e gostei. Recomendo

moimeme disse...

Boa noite...

Sei que este "salpico" já tem uns anos mas, foi precisamente com a dúvida em relação à duração de uma psicoterapia que cá vim parar.

Faço psicoterapia com um psiquiatra (que adoro) há quase 2 anos e tem sido uma viagem cheia de altos e baixos, com alguma dor mas, acima de tudo, com muitos resultados positivos.

Durante o caminho várias questões e/ou dúvidas vão percorrendo o meu pensamento.

Uma delas é precisamente a duração... ou melhor, quando se conclui que devem terminar as sessões? E quem o determina? o "cliente" ou o terapeuta?

Uma coisa que me assusta é saber que quando terminar a psicoterapia numa mais vou ver o meu terapeuta :(

Eu sei que a relação é meramente profissional mas constroi-se uma relação. Apesar de pouco ou nada saber da vida do terapeuta, sinto uma grande empatia. Gosto da voz que me acalma, da simpatia, da satisfação e alegria com que reage aos meus progressos. Na verdade e como bem disse no seu texto, é ele que melhor me conhece.

Tenho visto vários relatos pela internet fora de pessoas que se apaixonam pelos terapeutas. Nunca senti paixão mas sinto uma forte amizade o que, por si só, é também confuso para mim. Conseguirei gerir a saudade da perda de um "amigo" depois de terminada a psicoterapia?
E o psicoterapeuta também sentirá falta da minha "vida".

Eu sei que devia falar abertamente sobre estas minhas dúvidas com o terapeuta... mas tenho receio que me sugira procurar outro profissional e eu não me vejo a recomeçar tudo do zero.

Peço desculpa pelo excessivo comentário mas, mesmo que não obtenha resposta, precisa de "desabafar" :S

Obrigada
Tânia Reis

Unknown disse...

Bom dia Tânia Reis
Em primeiro lugar apresento-lhe as minhas desculpas pela demora em responder ao seu comentário. Infelizmente sem nos apercebermos mtos comentários ficaram retidos sem serem publicados.
Habitualmente o fim de uma psicoterapia é algo que emerge da própria relação terapêutica. Não existe um tempo fixo, depende de mtos factores e esses factores só podem ser analisados e ponderados por ambos os intervenientes no processo. Tem razão quando diz que deveria de falar com o seu psicoterapeuta sobre estas suas ideias e receios até para poder constatar que ele não lhe irá sugerir que mude de terapeuta, pelo contrario, provavelmente irá acolher as suas duvidas e enquadrar os seus sentimentos afectuosos por ele.