sábado, março 10, 2007

Impulso de ligar














Talvez já tenha acontecido a todos nós, no desenrolar da prática clínica, mas porque será que acontece?
Refiro-me aos casos em que somos contactados por um potencial cliente para marcar uma consulta, e até com uma certa urgência, tomando nós, todas as diligências necessárias; Vemos na agenda a data mais próxima, e no dia, estamos, à hora combinada, à espera do cliente. Mas, passam 5, 10, 15 minutos e a hora agendada para a consulta termina sem que o nosso cliente apareça, ou diga algo.

Será num movimento de desespero, num impulso desenfreado para consertar a sua vida, que é impelido a ligar, a procurar uma ajuda, a dar um continente para aquela situação? Mas depois da consulta marcada, do momento extinguido, a pessoa "cai de novo em si" e será que é nesta altura que começa a perceber as implicações que esta decisão poderá ter na sua vida, será que começa a ter a consciência que irá enveredar por caminhos para os quais não se sente preparado?

E então, num movimento de renúncia a si próprio, às suas dificuldades, rompe com a decisão tomada há poucos dias atrás e decide não aparecer, não dizer nada e simplesmente fechar-se nas suas angústias, preocupações, anseios....

O que acham?

35 comentários:

ShugO disse...

Um texto repleto de contradições... Não é o facto da pessoa "cair em si" que a impede de iniciar uma terapia. Pelo contrário: no desejo de um continente para as próprias angústias está o querer sair da fervura lenta no próprio caldo depressivo. Do mesmo modo, não há "um movimento de renúncia a si próprio" no "fechar-se" nas suas preocupações, anseios...
P.S. Não têm que agradecer por não ter respondido à questão.

Tania Paias disse...

Olá Hugo.
No me parece que hajam muitas contradições naquilo que cada um de nós escreveu.
Refere "no desejo de um continente para as próprias angústias está o querer sair da fervura lenta no próprio caldo depressivo", o que condiz perfeitamente com o que escrevo no meu post, que a procura de uma psicoterapia, que o que leva a pessoa a ligar e a marcar uma consulta, é o facto de querer dar um continente para aquela situação, situação essa que o levou a ligar. Portanto deste ponto convergimos, apesar de ter notado contradições ao longo do texto.
Agora quando me refiro ao facto da pessoa "cair em si" é metaforicamente, em sentido figurado, em que o tempo que medeia a marcação e a consulta, a pessoa é assolada pelas suas incertezas, por movimentos internos que parecem entrar em acção, fazendo com que o próprio se considere capaz de resolver a situação.
Também entram as dificuldades que o próprio tem em lidar com a ansiedade advinda das suas incertezas; a sua resistência à mudança, porque o ser humano prefere aquilo que lhe é conhecido, estável, mesmo que, por vezes, não se sinta satisfeito com a sua vida.
Uma psicoterapia parte do princípio que o indivíduo, o cliente terá que mudar o modo de se entender com os seus objectos internos, tendo sido nesse sentido que me referi ao impulso refreado, ao movimento de renúncia a si próprio e às suas dificuldades.
Quer dizer, existe um movimento ambíguo entre o ligar e marcar a consulta e o comparecer à mesma, sendo este movimento incerto, duvidoso que faz com que o indivíduo tente primeiro resolver as coisas só por si (precavendo-se das suas incertezas, ansiedades, ou seja, limitando-as)
Também poderá ter que ver com a origem da marcação, por vezes esta não é efectuada pelo próprio, mas sim por aqueles que estão mais próximo...
A minha questão prendia-se mais com uma reflexão dos estados emocionais do pré-cliente, dos movimentos internos, porque sem uma primeira consulta não existe o início de uma psicoterapia.
Cumprimentos

ShugO disse...

Considero ter compreendido perfeitamente as "questões" levantadas no respectivo post... Questões essas que em si contêm as próprias respostas aqui referidas pela Tânia. Inscreve-se aqui o meu post-scriptum (tal como dizia João dos Santos, "Se não sabe porque é que pergunta?")... Mas considero também que o post poderia estar melhor explicitado (com efeito, não me parece coerente uma pessoa renunciar às suas dificuldades e fechar-se nas suas angústias), tal como agora ficou com a sua resposta ao meu comentário...
Abraço

Tania Paias disse...

Hugo, possa não lhe parecer lógico a minha referência à renúncia e ao fechar-se na angústia,como diz, mas o que pretendia referir é o desistir do desejo de, é o limitar o espaço, é o pensar nas implicações, sendo que, nesse primeiro momento pode haver uma desistência do ter que falar nas suas dificuldades, do ter que colocá-las ao nível do consciente, não estando o indivíduo ainda preparado para isso (não querendo dizer que não possa está-lo numa outra altura).

Igor Lobão disse...
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Clara Pracana disse...

Achei a questão leventada pela Tania muito corajosa, tanto mais que se pretende com um tipo de frustração muito familiar ao psicoterapeuta e que pode até provocar a sensação de que estou a ser rejeitada (a Tania não o disse, mas digo eu e assumo). As motivações por detrás desse não comparecimento do paciente de que estamos à espera podem ser muitas, a começar por uma que de tão frequente acho que não levanta dúvidas a ninguém: a ambivalência. Que aliás marcou esta troca de posts. Não é curioso?

ShugO disse...

Sim, mais do que "paradoxos e contradições" podemos usar a palavra «ambivalência», à qual nos acostumámos pelo peso que ocupa na teoria kleiniana... Quanto à questão de nos sentirmos rejeitados (leia-se excluídos) pelo paciente... Sem querer advogar a neutralidade freudiana, acho que isso é já um assunto que deverá ser elaborado na análise pessoal (até porque o "pré-cliente", no caso hipotético de ter telefonado a marcar uma consulta, ainda não teve oportunidade de formar opinião sobre o terapeuta).

Jo Lindim disse...
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J. Conde Rodrigues disse...

Olá Tania, a tua pergunta na minha opinião é realmente pertinente e levanta muitas questões (ou não…), principalmente para quem vê a sua "rotina" profissional desrespeitada sem o mínimo de consideração, entre outros.
É verdade que tal facto deve ser muito comum nos consultórios de psis contudo também acho que devemos estar preparados para aceitar tais ocorrências visto o trabalho de psi ser com, e para seres humanos que por vezes, ou muitas vezes têm muito pouco de humanos.

Não vou discutir questões técnicas nem fazer análise primeiro porque acho difícil falar das motivações de qualquer comportamento sem existir a "tão desejada" 1ª consulta, e depois porque é notório o desinteresse do publico em geral, e este também se pretende chamar à discussão, penso eu e não vou pedir desculpa.

Dito isto resta apenas ao psi mais azarado ou não (isto deixa-me curioso) com os seus clientes resolver/elaborar/mentalizar como queiras... as desistências ou "drop out" com naturalidade e não com excessivas justificações (principalmente as auto-punitivas ou sentimentos de insegurança etc...), que ficarão sempre como meras hipóteses e suspensas no tempo devido às suas incertezas visto não termos certezas de nada (com tudo o que isto implica em termos de dificuldades de separação desta dinâmica tão sobrevalorizada). Acho que devemos limitar a valorização de tal facto.

Conde

Miguel Fabiana disse...

Boa Tarde!

Pretendendo esclarecer-me um pouco mais, declaro desde já a minha incompetência (ie, não adquiri formação nem a procuro ter) em Psicologia.

A mecânica quântica (também) incluiu um alto grau de subjetividade em suas observações. O "Princípio da Incerteza" postulado por Werner Eisenberg fala da variação
de fenômenos, dependendo da interferência do observador no campo da experiência. A
observação puramente objetiva deixa de existir nessas circunstâncias. Os fenômenos
sincronísticos também ocorrem na justaposição do campo da psicologia com o campo objetivo da física, isto é, Jung trabalhou desenvolvendo algumas idéias com as quais os físicos quânticos já se preocupavam, como Pauli, Bohr e Eisenberg.

Quando o Cliente marca a consulta e não está presente, foi um cliente que se perdeu, por incapacidade do vendedor/psicologo em concretizar esse prospect, foi resultado da interferência do "observador"/psicologo no campo da experiência(cliente) ou...o que foi?...não percebi!

Agradecendo desde já a Vossa paciência, na resposta a esta minha pergunta, peço-vos que sejam ambivalentes e persistentes na exposição das vossas ideias, por muito ridiculas que Vos possam parecer (uns aos outros). Um Cliente de psicoterapia não é um átomo ou uma molécula - digo eu...

Miguel Fabiana disse...

...desculpem a insistência: e se um cliente desiste a meio da psicoterapia, digamos durante 3 ou 4 meses e volta, argumentando que familiares ou amigos insistiram que ele deveria reiniciar a psicoterapia?

J. Conde Rodrigues disse...

Boas,

Confesso que física quântica é uma matéria que a mim particularmente me deixa muitas reservas. Contudo é com bons olhos que vejo as ciências poderem-se valorizar em conjunto mais que a soma das suas partes, aceitando a sua natureza subjectiva e objectiva (respeitando sempre os limites epistemológicos... íamos agora por caminho muito longo).

Também é verdade que, apesar das dúvidas, existe uma distinção/ruptura entre um Ser Humano (Cognitivo-Afectivo-Social-Cultural-Biológico...) e todas as suas infinitas partes (átomo, moléculas...) individualizadas ou separadas é hoje um dado adquirido e foi notório isso mesmo recentemente também, curiosamente, com o movimento social entre o sim e o não no referendo.


Na minha opinião as desistências (como já disse) são claramente diferentes de uma situação de saída e consequente desejo de (re)entrada em processo psicoterapêutico, aqui já se poderá fazer muitas e concretas observações incluindo a aceitação ou a recusa do caso entre outros, sendo contudo uma decisão que apenas poderá ser tomada em função do caso particular, da relação terapêutica e do psi.

Vivam os blogs!! Acho interessante a multidisciplinaridade e (multi)percepções que o Ser Humano pode revestir.

Conde

Igor Lobão disse...
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Agua disse...

Boa Noite,
Não tenho formação em psicologia, no entanto talvez posa dar uma proposta de resposta à questão formulada, sob o ponto de vista do utilizador dos vossos serviços.
Aconteceu numa fase da minha vida em que me sentia muito deprimida sentir necessidade de marcar uma consulta de psicologia. Nunca consegui arranjar coragem suficiente, pensei sempre que os meus problemas eram ridículos e não tinham consistencia. Por vezes,em alturas de maior desespero tentei marcar consulta por via telefónica, mas nunca consegui a consulta para o próprio dia em que me sentia com coragem para ela. Acabava desistindo da consulta não tanto por "renuncia", mas por incapacidade de manter a determinação inicial.

ShugO disse...

Senhor Igor, concordo consigo quando refere que as razões do drop-out resultam também do meio social que não deverá ser descurado. "Também"... (Será que naquilo que água escreveu se infere algo de social?). Há, no entanto, algo no seu texto que me deixa perplexo: será do nosso interesse "cultivar" as boas maneiras à mesa dos clientes/pacientes?!

Tania Paias disse...

Olá a todos.
Após uma ausência provocada, muito me apraz verificar a proliferação de comentários e o "debate" gerado. De facto parece que esta é uma situação que ecoa não só aos profissionais do ramo, mas que faz igualmente ressoar profissionais de outras áreas, clientes e potenciais clientes, ou não.
Se não estou em erro, apenas o post da clara sobre felicidade motivou tantos comentários, curioso não é?

Cumpre-se assim o meu intento ao escrever este post, o de criar uma dinâmica, uma reflexão conjunta que possa responder às questões lançadas, que não são mais que conjecturas acerca de uma subjectividade que é comum ao sujeito.

De muito se falou aqui, mas quero, em primeiro lugar fazer referencia ao comentário vivido da água, agradecendo-lhe desde já. De facto a sua experiência faz-me muito sentido para responder à pergunta/reflexão que eu própria teci, pois enquadro-a aí mesmo. Em primeiro lugar na dificuldade em elaborar um problema, em pensar no que irá dizer na primeira consulta, se é realmente um problema, o que dizer, como começar, por onde começar... Este é um fenómeno emergente, o fenómeno da indefinição, como muito bem refere Igor no seu comentário enquadrando-o na sociedade actual, que de facto tem feito com que haja uma mudança de atitude, de comportamento, pois não houve uma mutação genética nos últimos tempos que fez com que orientássemos os nossos comportamentos para outros caminhos.

Por outro lado, e também com e em relação à sociedade, está a incapacidade para esperar, o imediatismo da situação em que não se pode esperar, muda-se de canal como refere Igor.
De facto era a isto que me referia quando escrevi e questionei acerca do tempo que medeia o pedido de marcação e a consulta em si. É a falta de coragem, o não se sentir preparado para além do dia em que marcou, como refere a água.
Ainda outro dia, antes de colocar o post falava com a Ana sobre esta situação, ao que surgiu a questão de que seria pelo facto da pessoa querer marcar no imediatismo, fazendo com que ligasse para vários terapeutas e aquele que marcasse consulta mais cedo, seria o "premiado"...

Muitas hipóteses poderiam ser colocadas, pois sujeitos como somos, estamos acoplados a uma subjectividade, nada sendo objectivo. Mas porque não falar acerca deste aspecto? Porque não questionar a emergência desta situação. Conde diz-nos "é verdade que tal facto deve ser comum nos consultórios de psis", a verdade é que este facto é mesmo comum e é uma questão de quem faz clínica e pertinente como afirma Igor, podendo qualquer um a ele estar sujeito, e uma questão corajosa de se abordar como refere a Clara, e corajosa porquê? Porque todos falam entre si, porque falam, mas ninguém quer assumir perante outros que acontece?

Igor saliente muito bem os aspectos da emergência deste fenómeno e porque nos devemos deter na sua compreensão. Agora o que é facto é que este aspecto produz uma frustração comum ao terapeuta como afirma Clara, mais que não seja pelo facto de se ter ficado o tempo inteiro à espera de alguém que não vem, sem que isto produza fortes inseguranças e motivos para serem trabalhados em análise como sugere Hugo.
(O Igor refere um aspecto a ser levado em conta, o respeito pela profissão e não um curso de boas maneiras...)

Este é um aspecto arreigado à clínica e como tal produz uma questão, como tantos outros aspectos da clínica, e porque não questioná-lo. É da formulação de questões, quer internas, quer extenas que vamos resolvendo as soluções,e tera sido este questionamento, este movimento reflexivo de um aspecto em emergencia e que se relaciona com os aspectos da sociedade em que os nossos clientes estão inseridos, e dela fazendo parte e interagindo em função que motivou o Hugo a citar o título da obra de João dos Santos " Se não sabe porque é que pergunta?"?? ao qual acrescento outro título da mesma colecção, mas desta feita de Amaral Dial que diz "Eu já posso imaginar que faço"

Contradições, paradoxos, ambivalência, questões, questões e mais questões, todos estes conceitos fazem parte da própria clínica, com os quais nos devemos deter, imaginar, criar e debater, discursando metaforicamente também, pois é mediante metáforas que muitas das vezes chegamos até aos nossos clientes e ecoamos situações

Igor Lobão disse...
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Miguel Fabiana disse...

Caro Igor,

A clínica é um "laboratório" que não faz parte do campo das minhas experiências, como aliás o disse: não tenho nem procuro ter competências em Psicologia. No entanto, sou um cliente assíduo e empenhado dos serviços de uma Vossa colega, em Psicoterapia Dinâmica. A minha formação e prática em Engenharia não me impede de ter interesses e pelas ciências ditas sociais - Sociologia, Psicologia, Economia,...

Eu gosto de rentabilizar o tempo investido no gabinete de psicoterapia e nestas questões mais pragmáticas, tenho muito prazer de visitar, entre outros, este blog.

Há uma dúvida que me continua a surgir mesmo depois de uma atenta leitura e meditação sobre todas as palavras, do post e respectivos comentários.

Será que o/a Psicólogo/a não tem nenhuma responsabilidade num drop-out's (o jargão não foi introduzido por mim)? a "hiper-sociedade", o cliente e todas as outras entidades e razões externas ao psicologo, existem e têm qualidades e características que também existem "a priori" da primeira consulta e das primeiras consultas.

Um/a Psicólogo/a está completa e totalmente arredado de qualquer responsabilidade de drop-out's ? se não está, quais são as suas responsabilidades em drop-out's ?

A mim pareceu-me que as senhoras e os senhores psicologos, não se sentem confortáveis a pensar sobre as suas próprias responsabilidades num drop out - afinal é paciente ou é cliente? se é cliente eu arriscaria que a responsabilidade é do/a psicologo/a; então e o "make it happen"? até os médicos que só têm pacientes, fazem anúncios e tentam não perder os seus...pacientes ! digo eu !

Igor Lobão disse...
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Clara Pracana disse...

A Água pôs uma questão que acho que merece ser tomada em conta pela sua importância emocional. Não irei agora deter-me em considerandos sobre a intolerãncia à frustração e outros quejandos. O que é importante é que uma pessoa pede ajuda. A mim é-me indiferente, num primeiro momento, se a decisão é pensada ou não é pensada, ou por quanto tempo, se é impulso ou não, etc etc. Isso são coisas para serem discutidas eventualmente mais tarde. Há uma pessoa que pede de ajuda. Na minha modesta opinião, seria bom que pudéssemos corresponder a essa urgência, que alguma razão (psíquica) há-de ter.
É óbvio que ao tomar esta posição também me arrisco mais a "ficar pendurada" à espera de um paciente que não tenha mantido a decisão de comparecer e/ou que não respeite a o outro que está à espera dele. Mas, que diacho, isso são ossos do ofício. Ou não?

Miguel Fabiana disse...

Boa Tarde Clara,

Segundo percebi, na sua opinião, a parte da responsabilidade que cabe ao psicólogo, num drop out, é a parte dos "ossos do ofício"?

Obrigado,
MF

Igor Lobão disse...
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Ana Almeida disse...

Olá a todos.

Tenho estado super-ocupada e por isso não tenho conseguido arranjar tempo para ir colocando posts, mas não resisto a meter a colherada neste assunto.

Considero o tema e as suas variantes muito interessantes e acho que foram dados contributos muito importantes por diversos comentadores.

Acho que devemos diferenciar os drop-outs das situações em que a pessoa não aparece à marcação da primeira consulta. Nos drop-outs em princípio houve um envolvimento psicoterapêutico, isto é, independentemente do número de sessões que existiram foi elaborado um contrato terapêutico (mais ou menos claro, mais ou menos flexível ou rígido) e estabelecida uma relação terapêutica. Acho que na análise dos drop-outs é necessário ter em conta as dinâmicas organizadas pelo par psicoterapeuta-paciente, para além da história pessoal e clínica. Os motivos subjacentes aos drop-outs podem ser tão variados, na minha opinião, que dificilmente são enumeráveis ou resumidos em meia dúzia de conceitos; contudo e correndo o risco de ser incorrecta, acho que existem três grandes eixos que organizam a maioria dos drop-outs. (1) o par não é suficientemente criativo nem produtivo, (2) existem grandes diferenças nas expectativas que o psicólogo e o paciente têm em relação ao processo psicoterapêutico e (3) a relação psicoterapêutica, por qualquer motivo, reproduziu um padrão patológico e o par (com maior peso na responsabilidade do técnico) não foi capaz de “resolver” o problema.

Sobre o não comparecimento à primeira consulta, acho que é muito difícil fazer qualquer outra coisa que não seja especular, dado que não existem informações fornecidas pelo próprio, (seria contudo interessante organizarmos um trabalho de investigação nesta área; talvez a psicronos possa iniciar uma investigação deste tipo). Especulando, dizia eu, acho que devemos também ter em atenção questões concretas da ordem da realidade, nomeadamente a dificuldades financeiras e o facto de muitas pessoas pensarem varias vezes antes de se predisporem a gastar 50€ numa consulta de psicologia. Para além da importância das questões financeiras (que, por vezes, são minimizadas pelos psicólogos), acho que a pessoa antes de conhecer o psicólogo que a vai receber e entrevistar se relaciona ao nível da sua fantasia com a imagem de um psicólogo que é banhada por todo o tipo de estereótipos. Acho que às vezes as pessoas não aparecem porque não conseguem vencer a vergonha, a inibição e o receio de serem julgadas pelo psicólogo.

Clara Pracana disse...

Miguel,

Só agora cheguei ao blog e vi a sua pergunta. Constato que a Ana almeida já explicou entretanto a diferença entre um drop out e a não comparência à primeira marcação. Acho que não tenho muito a acrescentar porque a explicação está claríssima, embora seja eu que me chame Clara e não ela....

Igor Lobão disse...
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Miguel Fabiana disse...

Caras Ana e Clara,
Agradeço as vossas exposições reconheçendo também, a vossa disponibilidade.

Caro Igor,
Já consto nos visitantes do seu outro blog.


Cordialmente,
Miguel

PS: “A beleza das coisas existe no espírito de quem as contempla”

Ana Almeida disse...

Olá Igor.
Finalmente a minha resposta. Não por falta de apreço ao seu comentário, mas pela "infelicidade" de andar numa altura de muito trabalho.
Eu, e penso que todos os leitores assíduos do Salpicos, saberão que o Igor é um defensor acérrimo da Psicanálise Lacaniana. Os meus conhecimentos sobre a Psicanálise Lacaniana são relativamente superficiais pelo que não pretendo encetar consigo um debate nesse campo.
Espero contudo que o Igor reconheça a existência de outras Psicanálises e de que essas outras psicanalises assentam em premissas e linhas de estruturação interna que divergem em alguns pontos das apresentadas pela escola Lacaniana.
Não chamaria "reparos" às suas observações, mas "complementos".
Beijos e até breve

Igor Lobão disse...
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Ana Almeida disse...

Olá Igor. Bom dia!
Lamento se a minha resposta o deixou com o sentimento de que eu estaria a censurar a sua leitura (Lacaniana, Freudiana ou outra). Queria apenas expressar uma menor competência da minha parte para colocar o debate em torno de conceitos que me parecem ser centrais na escola Lacaniana, como seja, por exemplo, o lugar da fala.
Queria aliás ressaltar a importância do seu comentário ser “um complemento ao meu” e não necessariamente “uma precisão do meu”, complemento esse organizado por um olhar diferente, estruturado num enquadramento que poderá ter linhas mestras e conceitos fundamentais diferentes.
O Igor questiona a legitimidade de se falar em termos de par psi/paciente porque, de acordo com a sua posição (que me parece semelhante à de Lacan), os lugares são 3: o psi, o paciente e o lugar da fala. Considera que aquilo que é relevante é “aquilo que o sujeito faz com o lugar da fala em transferência” e depois explana de forma bastante clara qual deve ser a posição do psicólogo ou do psicanalista para “estimular” o vínculo transferencial. Não concordo totalmente com esta posição, mas não me parece que este seja o local ideal para debatermos questões tão complexas como estas.
Um pouco mais à frente, o Igor diz “O "tempo da produtividade ou da criatividade" é o próprio tempo do sujeito, e quanto a isso o "psi" apenas pode esperar e, como mais ou menos habilidade, ajudar o sujeito a desbloquear as suas resistências.”. Na verdade também não concordo plenamente com esta observação, compreendo e concordo que uma parte importante do trabalho do psicanalista (mas não necessariamente do psicólogo) pode ser o de ajudar a pessoa a desbloquear as suas resistências, contudo, parece-me que devemos também fazer muitas outras coisas...
Sobre a repetição do padrão e a constituição da neurose de transferência, parece-me que, por vezes, efectivamente correspondem a um mesmo fenómeno, mas nem sempre. Acho que a repetição de padrões pode-se manifestar fora da “neurose de transferência” e não me parece que a “neurose de transferência” seja sempre um elemento central do nosso trabalho, principalmente quando falamos em psicoterapias psicanalíticas, isto é, quando nos colocamos fora de um setting psicanalítico mais “clássico”.
Sobre a questão do preço por sessão, concordo consigo, acho que o valor fixo por sessão é uma norma que favorece mais o psicoterapeuta do que o paciente. Não sei se podemos dar um preço ao sintoma; mas penso que é legitimo afirmar que não existe uma relação linear entre o valor de uma psicoterapia e o preço que se paga por ela. Na minha clínica tenho sempre uma percentagem de pacientes que me pagam muito abaixo da minha tabela e muitos outros em que faço acordos sobre o meu valor de tabela com o intuito de que eles possam usufruir do trabalho psicoterapêutico. Até agora nunca me dei mal com este sistema. Estou convencida que muitos dos nossos colegas fazem o mesmo.

Igor Lobão disse...
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Igor Lobão disse...
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Jacques Madean disse...

É muito sábia a explanação que fazes dos reais motivos que levam ou não o paciente à terapia agendada. Mas na verdade, temos que avaliar em quais CIRCUNSTÂNCIAS o paciente está no momento da chamada, qual a DEMANDA... etc. O importante é: AS VARIÁVEIS DE ONTEM PODEM NÃO SER AS DE HOJE. Ou seja, sempre é muito útil ser sistemático nesse sentido. Não basta especular, isso requer que nós tenhamos/desenvolvamos HABILIDADES terapêuticas para elaborar estas diferenças.

Jacques Madean disse...

É muito sábia a explanação que fazes dos reais motivos que levam ou não o paciente à terapia agendada. Mas na verdade, temos que avaliar em quais CIRCUNSTÂNCIAS o paciente está no momento da chamada, qual a DEMANDA... etc. O importante é: AS VARIÁVEIS DE ONTEM PODEM NÃO SER AS DE HOJE. Ou seja, sempre é muito útil ser sistemático nesse sentido. Não basta especular, isso requer que nós tenhamos/desenvolvamos HABILIDADES terapêuticas para elaborar estas diferenças.

Miguel Fabiana disse...

Caro ou Cara jacqueslira,

Confesso que neste seu post, observo que se apropria, por quem faz clinica, das eventuais responsabilidades do psicoterapeuta de uma falha pelo cliente à primeira consulta. Eu procurava o debate sobre se as havia e quais eram. Agradeço-lhe a retoma à discussão "original", sem contudo negar muito interesse pelas outras linhas de debate que resultaram em paralelo, deste post da Tania(obrigado Tania).

Cumprimentos,
Miguel

Tania Paias disse...

Olá Miguel, muito obrigada.
Em especial a si e aos que aqui foram deixando o seu comentário vivido.
Cumprimentos