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terça-feira, abril 22, 2014

Vergonha, Medo da Crítica e Julgar os Demais


Ao passo que o sentimento de culpa implica um sentimento de transgressão (física, emocional, moral,

A vulnerabilidade acentuada à vergonha e o medo persistente da exposição ou da denúncia pública são vivências emocionais sintomáticas. Estes sentimentos são muitas vezes indicadores de falhas ou de insuficiências, na história individual, de relações empáticas, ricas em profundidade emocional, genuínas, nas quais a própria pessoa se tenha sentido com frequência  verdadeiramente compreendida na sua natural complexidade e contradição emocional, moral e comportamental. Esta experiência relacional com uma figuras preocupadas, envolvidas e compreensivas, permite, por via da confiança e da identificação, a aquisição interna gradual da capacidade e da propensão para a autocompreensão em profundidade, bem como a capacidade de compreensão em profundidade dos outros. Em acréscimo, estas capacidades internas adquiridas por via das boas relações, são a via privilegiada para a serenidade e maturidade psicológica.

A falta da experiência de uma relação que nos devolve compreensão em profundidade relaciona-se com frequência à internalização de cuidadores severos, críticos, que humilham e/ou instigam sentimentos de medo da rejeição por parte do grupo social (amigos, vizinhos, colegas, etc.). Gradualmente isto pode conduzir a um esvaziamento interno e/ou desorganização psicológica, já que a indisponibilidade de uma relação de compreensão em profundidade no início das nossas vidas potencia a intolerância interna a todo um leque de vivências e partes da personalidade que vão então sendo expulsas da consciência por ação de mecanismos de defesa destinados a "evacuar" a angústia/ansiedade ligadas a essas vivências e partes da personalidade. Forma-se um conflito entre, por um lado, uma parte intolerante (crítica, rejeitante, não aceitante e/ou cruel) da personalidade, e, por outro lado, a experiência emocional interna e outras partes da personalidade, que, sendo então sentidas como indignas do amor ou apreço dos demais, são expulsas da consciência, dissociadas e muitas vezes projetadas sobre os demais, sobre a visão do mundo e das relações.

Estes mecanismos de defesa de "evacuação" dos conteúdos mentais tendem a criar problemas adicionais nas nossas vidas pois a sua natureza é frequentemente projetiva. As nossas partes intoleradas são expulsas para o exterior, expulsão algumas vezes acompanhada por ações e atitudes que visam reforçar a ilusão de que o interior intolerável pertence realmente ao exterior (desprezado). A projeção faz-se acompanhar comummente da necessidade adicional da certeza de que há de facto um exterior repudiável (projetado nos demais, ou no mundo), mas que não é, ou faz parte do próprio sujeito e/ou das suas associações. Não sou eu, mas sim tu, quem tem agora as partes de mim que eu não suporto nem consigo enfrentar.”

O resultado são distorções da perceção dos outros e da realidade, lado a lado com um esvaziamento progressivo do Eu, consoante a frequência e intensidade da expulsão de partes do Eu para o exterior. A atitude crítica ou julgamental, e sobretudo a atitude de desprezo denuncia todo este enredo interno. A crítica ou julgamento surge neste contexto como expressão da tentativa de lidar com um conflito interno ligado a vivências internas dificilmente toleráveis.

Num segundo ponto, não são apenas as partes não compreendidas e intoleradas da personalidade que são projetadas sobre os demais, mas também a própria instância interna crítica, severa, cruel e intolerante o pode ser. Desta forma, quando na história pessoal faltam outros significativos capazes de preocupação e sintonia-empática, envolvimento e interesse genuínos, não só surge aqui o terreno fértil para o desenvolvimento da atitude critica, despreziva e intolerante perante o outro (perante partes da própria pessoa projetadas subsequentemente sobre o outro), como se instala o pavor da critica e do julgamento dos demais – a vergonha patológica, intensa e muitas vezes negada e inconsciente. A vergonha consciente já denota um certo grau de tolerância a aspetos menos aceites (ou percebidos como menos aceitáveis) da personalidade, ou seja, denota um grau menos severo e até mesmo normativo de uma apreciação interna de nós mesmos face à diversidade da nossa experiência emocional e  das diferentes partes da nossa personalidade.

Quando nos livrarmos de emoções e partes da personalidade em conflito (com a parte severa e intolerante, tiranizante) tudo isso permanece dissociado e/ou inconsciente. Isto por sua vez faz com que parte da nossa história e quem nós somos permaneça fora da nossa consciência e compreensão. Quanto menor a compreensão em profundidade de nós mesmos e da nossa vida, menos autonomia e liberdade teremos na própria vida, relativamente às escolhas que fazemos.

A projeção de uma instância interna severa, crítica, intolerante e não compreensiva, aliada à pouca tolerância e compreensão de partes importantes da nossa experiência, personalidade e emoções, encontra-se muitas vezes ligada à atitude de mentir, por exemplo nas relações íntimas. Isto porque a outra pessoa é sentida como alguém incapaz de nos poder compreender verdadeiramente, pois sentimos que esses aspetos estão para além da possibilidade de serem aceites e compreendidos (amados).

Ainda que o outro seja sentido como alguém intolerante em relação a algo, que nós sejamos intolerantes com o outro em relação a esse algo, muitas vezes acabamos mesmos por ser indulgentes connosco mesmos na relação com esse algo que fortemente criticamos no outro e que receamos suscitar a crítica do outro. Isto apenas revela a nossa parte intolerante, que nestes momentos é colocada em "standby" face à força desse algo que na maior parte do tempo é repudiável e jamais reconhecido como tendo qualquer associação connosco e com as nossas vidas. Fica claro aqui que "algo" necessita efetivamente poder ser melhor compreendido em nós e sobre nós, para que possa passar a ser tolerado e aceite, em vez de expulso e criticado nos demais.

É uma boa forma de nos conhecermos um pouco melhor, precisamente procurando aqueles aspetos do(s) outro(s) que mais desgostamos e mais facilmente nos metem os cabelos em pé. Fica o desafio.
etc.) em relação a alguém, a vergonha representa o medo de rejeição pelo grupo social. A tolerância, compreensão e capacidade de cuidarmos das nossas partes que porventura (consciente ou inconscientemente) sentimos menos dignas de serem amadas/apreciadas pelos demais está associada à saúde mental. Este é também todo um trabalho que se agrupa no conjunto dos objetivos centrais de uma psicoterapia psicodinâmica.

domingo, março 30, 2014

Estimulação Bilateral e Psicoterapia Psicanalítica

Na minha prática clínica cruzo a Psicoterapia Psicanalítica com a Estimulação Bilateral. Para mim, a estimulação bilateral é uma espécie de enzima que auxilia a digestão mental das experiências emocionais.

Conduzo a sessão como conduziria uma sessão de psicoterapia psicanalítica corriqueira, apenas introduzo pequenas pausas que vão até minuto e meio de estimulação bilateral (auditiva, táctil ou visual) quando sinto que se tornou activa uma situação emocional que não está suficientemente digerida. Este método permite também aumentar a produtividade da sessão, estimulando a associação livre e a intensificação do insigth.


Ana Almeida
Directora Clínica da Psicronos

quarta-feira, fevereiro 12, 2014

Saiba Se o Seu Inconsciente Conspira Contra a Sua Vida Amorosa



A ocorrência isolada ou pontual de certos comportamentos, atitudes, necessidades emocionais ou dinâmicas relacionais nas relações amorosas, e que são habitualmente consideradas sinalizadoras de problemáticas psicológicas subjacentes, justificam-se em períodos de stress. Contudo, quando estamos perante padrões habituais de funcionamento, estamos muito provavelmente, face a fortes manifestações inconscientes. Descrevemos aqui alguns dos mais importantes padrões ou tendências manifestas por si ou pelo seu parceiro que habitualmente remetem para questões mais profundas, com possível origem num período muito precoce da vida:

I* Ao procurar descrever o seu parceiro tende a referir exclusivamente aspetos que revertem direta ou indiretamente a seu favor. Ex.: carinhoso(a); bom ouvinte; entende-me bem; empático(a); compreensivo(a); faz tudo por mim;

II* Queixa-se insistentemente da falta dos aspetos acima mencionados no seu parceiro.

III* O seu parceiro queixa-se de uma solicitação excessiva de proximidade e afeto de sua parte (deste que este não apresente perturbações concretas ao nível da capacidade de dar e receber afeto).

IV* Sente frequentemente o seu parceiro como indisponível, rejeitante ou abandónico.

V* Procura parceiros sobretudo porque a associação com eles lhe traz vantagens económicas ou outras regalias sociais, prestígio ou admiração social (de familiares, amigos, colegas, ou desconhecidos), ou outras vantagens pessoais.

VI* Tende a necessitar ser admirado pelo parte do seu parceiro.

VII* Costuma sentir vergonha em relação ao seu parceiro, às suas atitudes ou comportamentos do seu parceiro, respetiva situação social ou económica, aspeto físico, ser demasiado alto ou baixo, demasiado gordo ou magro, etc.

VIII* Sente orgulho em exibir o seu parceiro perante os outros, podendo inclusivé procurar situações favoráveis a essa exibição.

IX* No curso das suas relações amorosas, sente que determinadas situações se repetem, percebendo você comportamentos ou atitudes muito familiares nos diferentes companheiros.

X* Tende a ir permanecendo em relações amorosas insatisfatórias na esperança que a relação melhore por si mesma.

XI* Depara-se sistematicamente com uma atitude de atribuição mútua de culpas nas suas relações quando surgem problemas entre si e o seu parceiro, sem que surja habitualmente um diálogo relativamente tranquilo e um entendimento mútuo.

XII* Sente que está condenada(o) a um certo “karma” no que respeita às suas relações amorosas.

XIII* Tem a percepção de que os homens ou as mulheres são todos ou todas iguais.

XIV* As suas relações tornam-se conflituais assim que se iniciam, ou pouco tempo depois.

XV* Tende a iniciar um novo relacionamento amoroso quase ao mesmo tempo que termina um anterior.

XVI* Troca frequentemente de parceiro.

XVII* Apaixona-se frequentemente.

XVIII* Agarra-se desesperadamente a um novo parceiro, ainda que ambos se conheçam relativamente mal ou o relacionamento seja muito recente.

XIX* Os períodos da sua vida em que não tem um parceiro são vividos com angustia, ocupação do pensamento com temas de arranjar parceiro e/ou procura efetiva de um parceiro.

XX* Tem dificuldade em estar sem parceiro ou longe do seu parceiro, mas ao tempo é-lhe difícil a proximidade física e afetiva.

XXI* Sente que não precisa de um parceiro pois tudo o que necessita são os seus filhos.

XXII* Sente um temor acentuado e infundamentado de que algo em concreto possa vir acontecer numa nova relação.

Estes são alguns dos indicadores mais importantes da presença de uma força interna que dirige as nossas escolhas de parceiros amorosos, bem como o curso das nossas relações (e não só). Esta força é habitualmente inconsciente, bem para além do nosso controlo, e está em  direta oposição aos nossos objetivos deliberados e conscientes de estabelecer relações plenas e gratificantes, bem como de conseguir um estilo de vida satisfatório.

Estas problemáticas remetem muitas vezes para insuficiências vividas nas relações com as principais figuras cuidadoras durante a infância, bem como para a interiorização de padrões e dinâmicas relacionais conflituais durante esse período de vida. No entanto, alguns dos itens acima apontados são frequentes durante época da adolescência, período de exploração, auto e hetero descoberta.

A exploração do inconsciente, identificação de insuficiências e conflitos internos oriundos de um período precoce do desenvolvimento, entendimento dos estados mentais adultos à luz destas vivências e a resolução destas insuficiências e conflitos na relação psicoterapêutica são meios privilegiados através dos quais a psicoterapia psicanalítica opera.

“Se carregar consigo os tijolos das suas relações passadas, acabará por ir construindo as mesmas casas.”

Diogo Gonçalves
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta