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quarta-feira, fevereiro 12, 2014

Saiba Se o Seu Inconsciente Conspira Contra a Sua Vida Amorosa



A ocorrência isolada ou pontual de certos comportamentos, atitudes, necessidades emocionais ou dinâmicas relacionais nas relações amorosas, e que são habitualmente consideradas sinalizadoras de problemáticas psicológicas subjacentes, justificam-se em períodos de stress. Contudo, quando estamos perante padrões habituais de funcionamento, estamos muito provavelmente, face a fortes manifestações inconscientes. Descrevemos aqui alguns dos mais importantes padrões ou tendências manifestas por si ou pelo seu parceiro que habitualmente remetem para questões mais profundas, com possível origem num período muito precoce da vida:

I* Ao procurar descrever o seu parceiro tende a referir exclusivamente aspetos que revertem direta ou indiretamente a seu favor. Ex.: carinhoso(a); bom ouvinte; entende-me bem; empático(a); compreensivo(a); faz tudo por mim;

II* Queixa-se insistentemente da falta dos aspetos acima mencionados no seu parceiro.

III* O seu parceiro queixa-se de uma solicitação excessiva de proximidade e afeto de sua parte (deste que este não apresente perturbações concretas ao nível da capacidade de dar e receber afeto).

IV* Sente frequentemente o seu parceiro como indisponível, rejeitante ou abandónico.

V* Procura parceiros sobretudo porque a associação com eles lhe traz vantagens económicas ou outras regalias sociais, prestígio ou admiração social (de familiares, amigos, colegas, ou desconhecidos), ou outras vantagens pessoais.

VI* Tende a necessitar ser admirado pelo parte do seu parceiro.

VII* Costuma sentir vergonha em relação ao seu parceiro, às suas atitudes ou comportamentos do seu parceiro, respetiva situação social ou económica, aspeto físico, ser demasiado alto ou baixo, demasiado gordo ou magro, etc.

VIII* Sente orgulho em exibir o seu parceiro perante os outros, podendo inclusivé procurar situações favoráveis a essa exibição.

IX* No curso das suas relações amorosas, sente que determinadas situações se repetem, percebendo você comportamentos ou atitudes muito familiares nos diferentes companheiros.

X* Tende a ir permanecendo em relações amorosas insatisfatórias na esperança que a relação melhore por si mesma.

XI* Depara-se sistematicamente com uma atitude de atribuição mútua de culpas nas suas relações quando surgem problemas entre si e o seu parceiro, sem que surja habitualmente um diálogo relativamente tranquilo e um entendimento mútuo.

XII* Sente que está condenada(o) a um certo “karma” no que respeita às suas relações amorosas.

XIII* Tem a percepção de que os homens ou as mulheres são todos ou todas iguais.

XIV* As suas relações tornam-se conflituais assim que se iniciam, ou pouco tempo depois.

XV* Tende a iniciar um novo relacionamento amoroso quase ao mesmo tempo que termina um anterior.

XVI* Troca frequentemente de parceiro.

XVII* Apaixona-se frequentemente.

XVIII* Agarra-se desesperadamente a um novo parceiro, ainda que ambos se conheçam relativamente mal ou o relacionamento seja muito recente.

XIX* Os períodos da sua vida em que não tem um parceiro são vividos com angustia, ocupação do pensamento com temas de arranjar parceiro e/ou procura efetiva de um parceiro.

XX* Tem dificuldade em estar sem parceiro ou longe do seu parceiro, mas ao tempo é-lhe difícil a proximidade física e afetiva.

XXI* Sente que não precisa de um parceiro pois tudo o que necessita são os seus filhos.

XXII* Sente um temor acentuado e infundamentado de que algo em concreto possa vir acontecer numa nova relação.

Estes são alguns dos indicadores mais importantes da presença de uma força interna que dirige as nossas escolhas de parceiros amorosos, bem como o curso das nossas relações (e não só). Esta força é habitualmente inconsciente, bem para além do nosso controlo, e está em  direta oposição aos nossos objetivos deliberados e conscientes de estabelecer relações plenas e gratificantes, bem como de conseguir um estilo de vida satisfatório.

Estas problemáticas remetem muitas vezes para insuficiências vividas nas relações com as principais figuras cuidadoras durante a infância, bem como para a interiorização de padrões e dinâmicas relacionais conflituais durante esse período de vida. No entanto, alguns dos itens acima apontados são frequentes durante época da adolescência, período de exploração, auto e hetero descoberta.

A exploração do inconsciente, identificação de insuficiências e conflitos internos oriundos de um período precoce do desenvolvimento, entendimento dos estados mentais adultos à luz destas vivências e a resolução destas insuficiências e conflitos na relação psicoterapêutica são meios privilegiados através dos quais a psicoterapia psicanalítica opera.

“Se carregar consigo os tijolos das suas relações passadas, acabará por ir construindo as mesmas casas.”

Diogo Gonçalves
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta


quinta-feira, janeiro 02, 2014

Dinâmicas Patológicas na Relação Amorosa: Conflito e Instabilidade


Para quem almeja uma relação amorosa profunda e duradoura, a compreensão em profundidade sobre a complexidade de si próprio(a) e do outro é vital.

Uma dificuldade, incapacidade ou resistência acentuada na compreensão em profundidade e empática de nós mesmos e dos demais significa, entre outras coisas, que existem aspetos intolerados na nossa personalidade que rejeitamos e expulsamos da nossa consciência. Estes aspetos são tendencialmente evacuados para os outros por mecanismos psicológico tanto mais ativo quanto os níveis de ansiedade de uma pessoa e/ou a sua intolerância a determinados conteúdos psíquicos, ou dificuldade de pensar sobre eles.

A psicanálise mostra-nos como podem existir em nós fortes tendências psicológicas para expulsar para os outros, induzir e consequentemente recear e/ou controlar neles, desejos, impulsos, ideias ou aspetos pessoais rejeitados em nós mesmos. Por outras palavras, algo intolerável, aversivo ou muito ansiogénico em nós próprios pode ser facilmente transformado em “É o outro (e não eu) quem é, sente, pensa ou se comporta desta ou daquela maneira.” Seguem-se respostas de medo ou indignação face a esse outro, podendo surgir mesmo o ataque a esse outro, ou tentativas de o manter debaixo de controle.

Aquando deste funcionamento psicológico (identificação projetiva) perde-se a exatidão da percepção real do outro, substituída agora por uma percepção distorcida, colorida por aquilo que é atribuído ao outro (projetado sobre este). Um companheiro ou uma companheira infiéis ou com um forte desejo ou impulso para a infidelidade podem facilmente começar a acusar o parceiro de infidelidade, procurar controla-lo e ás suas atividades, etc.. O que é procurado no fundo não é a tranquilização de que não existe traição mas a sim a legitimação da desconfiança persistente, a confirmação de que esses aspetos infiéis pertencem ao outro e não ao próprio. Lamentavelmente muitas vezes essas acusações e esse controlo acabam por levar o outro ao desgaste e a tornar-se aberto a outras relações, o que acaba por concretizar a fantasia de infidelidade.

A intolerância ao reconhecimento de aspetos mais desagradáveis ou vulneráveis da nossa psicologia pode criar problemas significativos para a estabilidade e para a maturação do casal. Esses aspetos podem ser responsáveis por problemas importantes na relação amorosa, contudo a confrontação direta pode igualmente ser de tal forma problemática e intolerável que resulta em crises de atribuição ou projeção de culpa. Por outras palavras, a situação e os papéis invertem-se subitamente e naquele momento – emerge um sentimento de se estar a ser vítima de um outro sentido agora como fundamentalmente cruel, insensível, intolerante, culpabilizante, e logo, merecedor de ser agredido.

A confrontação abrupta com partes intoleradas da personalidade tendencialmente não promove insight ou ganhos de compreensão, mas um reforço das tendências projetivas,  entre outras, que neste caso acabam por atribuir ao outro a própria parte cruel, insensível e intolerante da personalidade.

A perda da aliança na relação amorosa

Sob o efeito dos mecanismos projetivos, e consoante uma maior atividade dos mesmos e também de um maior grau de fragilidade constitucional de uma dada personalidade, perde-se momentaneamente e parcialmente o contacto com a lógica racional. Dissipa-se, em maior ou menor grau, o contacto com as partes boas do outro, com as boas recordações que guardamos sobre ele ou ela, com as boas intenções e o desejo de amor dele ou dela por nós. Tudo isto desaparece, de uma forma aparentemente mais subtil ou mais radical, mais momentânea ou mais duradoura (ou mesmo irreversível, nos casos que resultam em rotura permanente da relação). 

A perda de contacto com as partes boas do outro impossibilita formar ou manter o contacto com um sentimento de aliança com esse outro – uma aliança securizante, que procura acolher e trabalhar questões individuais e conjuntas que atormentam a relação. Ao fim ao cabo a maioria de nós consegue aliar-se ao que e a quem gosta e com quem se consegue identificar. Esta aliança é a base para a possibilidade de transformação dos conflitos do casal e do acesso a novas vivências e novos equilíbrios na relação amorosa.

As fragilidades constitucionais da personalidade podem de facto ser tais que não há tolerância ao reconhecimento de vulnerabilidades pessoais. Fica então comprometida a capacidade de responsabilização pessoal aquando dos problemas na relação de casal, bem como a capacidade de ser formada essa aliança com o outro, com as partes boas do outro – as partes generosas, pacientes, compreensivas, gratificantes, tolerantes, apoiantes.

O conflito ou a instabilidade prevalecentes conduzem à insatisfação crónica, à estagnação e ao fim da relação amorosa. Ou então a um prolongar e a um suportar masoquistas da mesma, alicerçados muitas vezes na eterna esperança de uma mudança.

A relação psicoterapêutica na psicoterapia psicanalítica estimula na pessoa as suas vivências e padrões relacionais habituais, oferecendo uma oportunidade única para que, num contexto e numa aliança seguros e securizantes, possam ser trabalhadas e resolvidas questões em torno de, por exemplo, conflitos específicos e instabilidade nas relações afetivas da vida da pessoa.

Por Diogo Gonçalves
Psicólogo Clínico e Psicoterapeuta