Mostrar mensagens com a etiqueta Integração. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Integração. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, agosto 05, 2015

Como Apaziguar uma Zanga de Casal (II)


Contenção da ansiedade, transformação e devolução sob forma de cuidados e afeto
Estados emocionais/mentais de propensão ao conflito destrutivo em casal

- Perda interna do contacto com o bem-querer e com o amor da outra pessoa em relação a nós
- Perda interna do contacto com as boas coisas que recebemos e vivemos com a outra pessoa
- Perda interna do contacto com o nosso bem-querer e amor pela outra pessoa
- Precipitação ao encontro confrontativo com a outra pessoa (no real ou na fantasia)
- Estado de grande excitabilidade e/ou zanga interior
- Propensão forte para culpar, criticar ou "sentenciar"
- Perda interna do contacto com a própria quota parte de responsabilidade
- Impermeabilidade aos argumentos da outra pessoa, por vezes sentidos como fuga à responsabilidade ("saltitar" de tema em tema sem serem aceitas argumentos ou resoluções válidas, trazer outros assuntos ao de cima não relacionados diretamente com o assunto atual)
- Ausência de culpabilidade ou remorso pelos ataques inflingidos

O que nunca fazer durante uma zanga de casal

Culpabilizar ou criticar

Todo o cerne da discussão que se transforma em zanga acesa está alicerçado num estado emocional em que a ansiedade não pode ser tolerada naquele momento, por uma ou ambas as partes. Culpabilizar, responsabilizar ou sentenciar é o equivalente a atirar gasolina para a fogueira.

Antes, cada um dos parceiros deve expor os seus sentimentos, de modo a deixar que a outra parte possa perceber por si mesma o efeito das suas atitudes e comportamentos sobre a relação ou sobre o outro, sem que isso seja atirado violentamente. Caso contrário tal irá resultar numa rejeição imediata e num atirar as culpas de volta, mesmo que os argumentos sejam totalmente válidos. O que está em causa não é a veracidade de argumentos, mas a própria capacidade da mente de tolerar, processar e integrar essas responsabilidades, que por vezes fica comprometida e necessita ser recuperada antes que se possa chegar a um qualquer entendimento entre duas pessoas.

Procurar resolver por SMS

Toda a dinâmica da contenção assenta na necessidade de existir alguém que possa permanecer relativamente tranquilo (mas não necessariamente indiferente) face à ansiedade e conteúdos de outra pessoa, que naquele momento não consegue conter ou transformar internamente essas ansiedades. O tom de voz tranquilo que veicula a paciência compreensiva é a base desta contenção. O SMS é o seu antípoda. Ou seja, a pessoa zangada pode projetar facilmente a ansiedade e zanga no SMS (que representa a outra pessoa, mas não é a pessoa). Assim, salvo exceções, o SMS tenderá a ser percebido e recebido de acordo com os mesmos tons emocionais negativos em que a pessoa ansiosa e zangada se encontra. Novamente, gasolina para a fogueira.

Descurar a responsabilidade pessoal sobre o assunto ou assuntos entre mãos

Um casal é uma união entre duas pessoas. Um problema de casal é um problema de duas partes e se há conflitos então há responsabilidades partilhadas e/ou assuntos que necessitam ser melhor esclarecidos.

Sair abruptamente da presença da outra pessoa

Algumas pessoas evitam o confronto sistematicamente enquanto forma padrão de resolver problemas, pelo que na verdade nada se resolve, antes pelo contrário, os problemas acumulam e levam inevitavelmente a novas situações de confronto.

Adiar o conflito é por vezes uma importante atitude de auto-preservação quando somos apanhados de surpresa, quando a outra pessoa se mostra inflexível, demasiado agressiva, ou não está de modo nenhum recetiva à resolução do problema. É também importante procurar transmitir à outra pessoa quando percebemos que não estamos em condições de abordar determinados assuntos em determinados momentos,  o que se prende com o conhecimento e respeito pelos nossos limites e está em linha com o nosso intuito de abordarmos assuntos mais sensíveis num momento mais propício a que se possam resolver da melhor forma possível. 

Acontece também algumas vezes que a primeira pessoa tenha mais dificuldade em adiar o confronto para um momento mais propício, pela zanga e pela dificuldade na contenção naquele momento. Ainda assim, assuntos sensíveis devem sempre ser abordados de forma assertiva e sempre no momento em que ambas os companheiros se sintam mais capazes para lidar com eles. Caso contrário o potencial para a destrutividade é muito elevado.

Em suma, quando duas pessoas numa relação íntima iniciam uma discussão que aumenta gradualmente de intensidade, então das duas, uma: ou há um "time-out", fundamental para que ambos se tranquilizem e consigam regressar a um estado de maior integração, ou então pelo menos uma das pessoas deve conseguir manter alguma calma, recetividade e paciência compreensiva, de modo a conter a ansiedade e os conteúdos da outra pessoa e ajuda-la a acalmar-se, sem responsabilizar, culpar, retaliar ou abandonar.

No caso do time-out, os amigos e familiares são fundamentais para nos ajudarem a desintoxicar estados pesados de ansiedade, quando não conseguimos faze-lo sozinhos, ou quando por algum motivo a comunicação imediata com o companheiro não é possível ou não é prudente.

Quando as relações são marcadas pelas discussões persistentes, pela incapacidade de um ou ambos os companheiros se acalmarem mutuamente e sobretudo a si próprios, então a psicoterapia (individual ou de casal) deve ser considerada.

segunda-feira, agosto 03, 2015

Como Apaziguar uma Zanga de Casal (I)



Projeção mútua de ansiedade e falha da contenção
Todos nós já vivemos ou presenciámos em algum momento das nossas vidas episódios em que a dado momento duas pessoas numa relação de casal não só deixam de se entender como parecem enveredar num "jogo" de acusações lesivas de parte a parte. Estes momentos são muitas vezes intensos, difíceis de quebrar, pouco propensos a serem encontradas soluções e resoluções satisfatórias, e tendem muitas vezes a caracterizar-se por um gradual escalar de intensidade.

Em termos "psicoanatómicos" (funcionamento psíquico subjacente aos conteúdos verbalizados durante a discussão) há um estado intenso de ansiedade que a própria pessoa não está a ser capaz de conter dentro dela e de transformar sozinha. Ou seja, o aparelho psíquico naquele momento (ou em relação a determinado assunto) está fragilizado e não está a ser capaz de tolerar a ansiedade, de pensar ponderadamente e de criar um discurso assertivo. O resultado é a expulsão (dissociação interna e projeção) da ansiedade para cima da outra pessoa, sob forma de acusações, responsabilizações críticas, culpabilizações ou outro tipo de ataques. Quando o outro lado se encontra no mesmo mental, ou este estado mental é induzido via das projeções/ataques contínuos, instala-se então a discussão zangada, em que muito dificilmente se conseguem fazer reparações genuínas e se atingirem resoluções satisfatórias.

Uma das correntes teóricas da psicanálise procura reconstruir o mundo interno do bebé, nomeadamente ao nível da fantasia. Este trabalho foi conseguido com base no trabalho clínico com pacientes muito perturbados (que se diziam e dizem ter um funcionamento mental equiparado ao do bebé de poucos meses) e com crianças muito pequenas. Nesta corrente psicanalítica o bebé concebe inicialmente duas mães (tanto quanto é possível a um bebé perceber a mãe, ou partes da mãe), a mãe boa, que gratifica, onde é projetado tudo de bom que o bebé tem, e a mãe má, que privava cruelmente de cuidados, na qual é projetada sobretudo a agressividade do bebé. Uma é amada e procurada, a outra é temida e odiada. Mais tarde o bebé amadurece psicofisiologicamente e percebe que ambas são uma e a mesma pessoa. Passa a recear ter destruído a mãe boa mediante ataques (na fantasia) outrora contra a parte má. Surge uma culpabilidade aflitiva, um medo de ter destruído a mãe de que tanto precisa e uma tendência à reparação. Nos primeiros meses o bebé oscila entre movimentos de clivagem e de integração da representação interna da mãe. Diríamos, entre por um lado, um sentimento de vitimização e ataque ao agressor, e, por outro lado, uma culpa por ter danificado a figura principal de vinculação, que se faz acompanhar por esforços de reparação (reais ou na fantasia).
Enquanto nota, tudo o que projetamos (dissociamos de nós mesmos e expulsamos para o exterior) adquire um efeito persecutório contra nós - as angústias persecutórias. Como se o movimento de expulsão psicológica (da ilusão da expulsão, pois o aparelho psíquico cria apenas a ilusão da expulsão, e por vezes uma ilusão realmente poderosa) imbuísse os conteúdos expulsos de uma espécie de intencionalidade de retorno vingativo sobre nós mesmos pelo facto de os termos tentado atirar para fora de nós. Aquilo que alguns de nós sentimos por vezes quando de noite, ao tentar adormecer, sentimos "presenças" persecutórias perto de nós ou na nossa casa. Tratam-se de conteúdos e ansiedades muito difíceis que não conseguimos integrar ou pensar, que procuramos expulsar para fora de nós.

De qualquer dos modos, no trabalho com os nossos pacientes e nas relações de casal, nomeadamente nos momentos mais intensos dos conflitos e discussões, vamos observando estas mesmas oscilações. Ainda que enquanto adultos o ideal se prenda com sentirmo-nos culpados quando cometemos alguma transgressão contra aqueles que amamos e procuremos fazer reparações, por vezes acabamos por estar debaixo de tal carga de stress que resvalamos temporariamente para um estado mental em que acabamos por perceber aqueles mais próximos de nós enquanto perpetradores cruéis (coloridos muitas vezes pela própria projeção da nossa agressividade) que são posteriormente alvos dos nossos ataques mais cruéis (a nossa agressividade), isentos de remorso.

Eis alguns quadros psicológicos ligados com a propensão à perda de contacto com a benevolência da outra pessoa, com a realidade de quem ela é (e também com o nosso sentido de responsabilidade adulta perante as nossas atitudes e ações):

- Fragilidade da estrutura de personalidade, forte vulnerabilidade à frustração e às separações; Relações de amor/ódio (próprio da patologia borderline)
- Relações passadas traumáticas transferidas inconscientemente para o companheiro em certas situações ou quando debaixo de stress (por ex. figuras rejeitantes e desconsiderativas)
- Atribuição ao companheiro de aspetos intolerados da própria personalidade (por ex. impulso à infidelidade; a agressividade)
- Situações pontuais de grande stress que provocam clivagens temporárias na nossa representação interna da outra pessoa

Existem outras situações também importantes, mas que se afastam do âmbito desta exposição, nomeadamente quando um companheiro tem uma personalidade expulsiva (sem muita capacidade para a tolerância à ansiedade e para a responsabilização) e o outro apresenta uma personalidade que tende a receber essas ansiedades projetadas e a interioriza-las (culpabiliza-se), desculpando a primeira. Não existe uma verdadeira comunicação de casal, mas antes uma dinâmica de imposição-submissão (ou autoanulação), ou sadomasoquista, onde os conflitos são persistentes e o amor, o entendimento e a cumplicidade não têm espaço para desabrochar.

Na segunda parte deste artigo abordaremos alguns sinais internos de entrada em estados emocionais/mentais de propensão ao conflito destrutivo e o que nunca fazer durante uma zanga de casal.

quinta-feira, novembro 20, 2014

Descubra aquilo que uma outra parte de sí não lhe quer revelar


O caminho para a verdade interior é um caminho longo, que leva toda uma vida a ser trilhado. É um caminho repleto de auto-ilusões e auto-boicotes, onde as verdades profundas interiores se desvendam, umas vezes subitamente, outras vezes a custo de muitos anos de trabalho.
  
Tanto para o peregrino (o paciente) da psicoterapia psicanalítica ou da psicanálise, como para o seu guia (o psicoterapeuta), cada sessão é um passo em direção a uma nova e mais profunda verdade interior, onde cada verdade desvela novos caminhos e sinuosidades. 

Que verdades interiores serão essas que dentro de si, leitor(a), esperam ser desvendadas?

Será esse um caminho que se atreverá a trilhar?

E como imagina que poderia ser o seu guia? 

Talvez lhe surja subitamente a imagem de alguém verdadeiramente interessado em conseguir ajuda-lo(a), que respeitaria pacientemente a sua necessidade de caminhar ao seu ritmo, procurando ao mesmo tempo encorajá-lo(a) a dar o próximo passo e demonstrando estar lá para si enquanto luz orientadora para quando se sentisse perdido(a) ou ajudando-o(a) a levantar-se depois uma queda…?

Talvez lhe surja a imagem de alguém que o(a) achará pouco interessante, que sentirá pena de si, ou que o(a) fará sentir-se envergonhado(a) ou culpado(a) pelas suas angústias, aproveitando cada oportunidade para acentuar a sua culpa e vergonha…? Ou talvez alguém que de um modo ou de outro acabará por desiludi-lo(a)…?

Será que perceber que tipo de guia surge na sua fantasia pode ser por si só um importante início ou um mergulho em profundidade sobre si mesmo(a)… 

Auto-ilusões e auto-boicotes, juntamente com um mundo interior inconsciente ou dissociado, misturado ainda com aquilo que não pode ainda ser pensado – o que depende do amadurecimento do aparelho de pensar - configuram muitas vezes angústias, medos e ansiedades, sintomas e psicopatologia. São sinais de um mundo interior que não está ou não pode ainda tornar-se cogniscível.

Ficam aqui mais algumas “perguntas-guia”:

1. Imagine que alguém escreve uma notícia sobre si.

a) Quais as 3 coisas que jamais iria querer que fossem ditas sobre si?

b) Serão essas coisas verdadeiras?

c) Se não o são, será que ao longo da vida e através das pessoas de quem se rodeou, dos seus familiares e dos seus amigos, foi aprendendo que essas eram o tipo de coisas que as pessoas não deveriam ser, e logo rejeita-as hoje em si?

2. O que é que o(a) irrita mais nas pessoas (atitudes, comportamentos, aspetos de personalidade, etc)?

3. Sente ansiedade quando está no meio de pessoas, seja na rua, na escola, no trabalho, etc., e/ou procura mesmo evitar em maior ou menor grau contactos sociais? Imagine que se coloca nos “sapatos” dessas outras pessoas ao olhar para si, o que estariam essas pessoas a ver sobre si ? Como surge você perante o olhar e a apreciação dos outros e o que sentem esses outros em relação a si? E aqueles que lhe são mais próximos, os seus amigos, companheiros e sobretudo os seus familiares?

Nem todas estas perguntas garantem revelações, como nem todas estas perguntas podem ser de fácil ou rápida resposta. Quiça possam agitar algo dentro de si...